Uma infralogística pobre e com gestão despreparada para o risco*

Publicado em
22 de Outubro de 2012
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O acidente ocorrido no aeroporto de Viracopos na semana retrasada com o avião MD 11, da empresa Centurion Cargo, foi emblemático. Escancararam-se as portas da imprevidência do Estado com a infralogística do país, não só em relação à inexistência desta, mas também em relação à falta de capacidade de gestão.

Um desleixo construído lenta e tenazmente pela incompetência de gestão dos vários governos, hoje mostra à população brasileira as consequências.

Como pode um acidente de pequenas proporções com o trem de pouso de uma aeronave cancelar mais de 500 voos?

Quem é o responsável por não prever este tipo de ocorrência e os respectivos planos contingenciais?

Como fica o tempo perdido das pessoas afetadas pelos cancelamentos dos voos? Quem pagará pelo desleixo das sucessivas gestões?

As respostas para essas questões jamais serão respondidas, pois não interessa “rebobinar a fita” e responsabilizar empresas e executivos, sejam públicos ou privados, pelo dano aos usuários do transporte aéreo de passageiros afetados pelo problema.

Aliás, a única resposta ao problema foi uma multa de R$ 2,8 milhões que a ANAC infligiu à Centurion Cargo. Certamente os usuários merecem respeito e isto implica em respostas muito mais consistentes do que esta multa.

Como sempre, as autoridades responsáveis afirmam se tratar de um problema pontual e imponderável, cuja ocorrência foge aos limites de sua competência.

Ocorre que problemas parecidos, não na causa mas no seu efeito, ocorrem com a infralogística do país e igualmente faltam respostas consistentes.

Um acidente com um caminhão na marginal Tietê, o tombamento de um caminhão no Tapetão em Campinas, uma ponte que cede por falta de manutenção, um navio que encalha no canal de acesso a um porto, são probabilidades passíveis.

Qualquer ocorrência “imponderável” tem o potencial de causar um estrago maior do que o normal. A parca infralogística do país expõe ao estresse os usuários, onde qualquer ocorrência que leva à interrupção do fluxo gera caos no sistema pela inexistência de algum tipo de “válvula de escape”.

Decisões acerca de gerenciamento de risco inclui o imponderável. Mas não bastasse a nossa parca infralogística, escancara-se a falta de capacidade de gestão.

Um bom exemplo para a falta de capacidade de gestão foi a recente norma que restringe o horário de jornada dos condutores de veículos, sejam autônomos ou não. Segundo informações colhidas pela CNT, embora não conclusivas, um caminhoneiro autônomo realiza jornadas que estão em um intervalo de 12 a 16 horas por dia.

Se houvesse capacidade de estacionamento para repouso dos caminhoneiros nas estradas e se a fiscalização fosse efetiva, um caminhoneiro autônomo poderia perder algo entre 30% a 50% da sua receita.

Por óbvio o caminhoneiro não perderia, uma vez que esta perda seria repassada às transportadoras sob a forma de aumento do “frete carreteiro” e por consequência da tarifa cobrada dos usuários. O resultado seria o aumento do preço dos produtos de consumo.

Isto levaria a um descompasso de preços entre produtos nacionais e estrangeiros, podendo elevar a desindustrialização.

Como decorrência, isto poderia levar o governo a criar barreiras comerciais, dentre alternativas econômicas mais heterodoxas. Alguns poderiam tergiversar mais, outros menos ou então afirmar que isto jamais acontecerá.

Concordo com a última alternativa, mas qual é o preço que os usuários das estradas continuarão a pagar? Mais vidas?

Ao rebobinar a fita, percebe-se que a elaboração da regulamentação de jornada de trabalho dos motoristas foi realizada por uma ANTT desconectada do sistema e sem capacidade de simulação dos impactos das novas normas em relação ao sistema.

Quem pode nos proteger do risco da falta de capacidade de gestão?

Por:
Mauro Roberto Schlüter
Professor de Logística da Mackenzie Campinas
Diretor do IPELOG

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