É impraticável privilegiar uma classe com um aumento que foi calculado sem bases técnicas e que prejudica todas as outras
Agosto é um mês decisivo para o agronegócio. Há dois grandes problemas que, se não forem solucionados até o próximo dia 31, podem causar mais do que enormes prejuízos ao setor e, indo mais além - mas sem exagero -, podem arrasar a próxima safra. São eles: a indefinição jurídica sobre a tabela de fretes e a suspensão do uso de produtos à base de glifosato, o que já foi noticiado por este jornal.
Vou me ater à primeira questão, embora as duas tenham semelhanças em suas origens: são decisões sem embasamento técnico, de caráter populista e tomadas por agentes públicos no âmbito federal que, ao final, podem prejudicar o setor que hoje é o responsável por 23,5% do PIB nacional, além de ser o fiel da balança de exportações.
O ministro Luiz Fux comanda, na próxima segunda-feira (27), a segunda audiência para tentar um acordo entre caminhoneiros e empresários sobre os valores que estão em vigência e que tornam impraticáveis os custos com transporte para o agronegócio. Importante destacar que, dentro do próprio governo, não existe consenso sobre a tabela. Ou melhor: existe um consenso de que a AGU (Advocacia Geral da União) tomou a decisão errada ao defender a política de preços mínimos para o transporte de carga no Brasil.
O Ministério da Fazenda já enviou um parecer contrário ao STF (Supremo Tribunal Federal) contra o tabelamento de preços. Embora a medida provisória tenha sido negociada pelo Palácio do Planalto e pelos ministros da Fazenda e do Planejamento com os caminhoneiros para acabar com a greve, a avaliação interna é de que a ação foi anticoncorrencial e desfavorável ao ambiente de negócios.
Na prática, o Ministério da Fazenda reconheceu o tamanho do erro e os prejuízos que ele pode causar, reforçando o argumento das entidades produtivas que incluem não só o agro, mas também a indústria e o comércio: de que o tabelamento de preços fere o princípio da livre concorrência.
O parecer da Fazenda é muito claro neste sentido quando aponta: "Ao reintroduzir o tabelamento em setor aberto à livre concorrência sem a devida análise do impacto que a medida terá sobre os demais mercados e, em última análise, sobre o consumidor, não conseguirá assegurar, conforme propôs, a existência digna, conforme os ditames da justiça social".
Várias entidades, como Acebra (Associação das Empresas Cerealistas do Brasil) e CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil), entraram com ações contra o tabelamento de fretes. Entre os argumentos, estão custos bilionários com a imposição do tabelamento do frete, a elevação dos custos dos alimentos, além da ameaça de redução da produção agrícola em áreas distantes dos grandes centros.
Em um dos estudos, realizados pela CNA, as estimativas de prejuízos que o tabelamento de fretes pode causar atingem toda a sociedade brasileira. Entre eles está um aumento médio de 12,1% no preço de alimentos, como arroz, carnes, feijão, leite, ovos, tubérculos, frutas e legumes, que representam mais de 90% da cesta básica.
O setor produtivo não é contrário a melhores condições de remuneração dos caminhoneiros, mas é impraticável privilegiar uma classe com um aumento que foi calculado sem bases técnicas e que prejudica todas as outras.
Somos contrários, sim, à intervenção do Estado nas relações de mercado que se autorregulam; ao desrespeito aos milhões de agricultores que abastecem os lares de todos os brasileiros; a políticos de carreira que, em busca de seus próprios interesses, colocam em risco a segurança alimentar do nosso país.
As entidades do setor produtivo esperam, no mínimo, que os representantes do governo reconheçam seu erro e que os caminhoneiros sejam razoáveis em negociar o valor do frete. Somente assim poderemos evitar um colapso no abastecimento alimentar do Brasil e também dos países que importam nossos grãos.