Dirigir uma carreta nas estradas da Região Metropolitana de Curitiba (RMC) se tornou um risco. Não em função da condição das rodovias ou da possibilidade de acidentes, mas pelo aumento do número de assaltos a caminhões de carga. Um levantamento do Sindicato das Empresas de Transporte de Cargas do Paraná (Setcepar) aponta que nos últimos dois meses 58 roubos foram registrados na capital e região: quase um caso por dia. Só na capital, a média é de 16 casos por mês.
De acordo com o presidente do sindicato, Gilberto Cantú, antes de 2011 ocorria um índice de três roubos de cargas por mês nas estradas da Grande Curitiba. A partir da metade do ano passado, no entanto, os ataques se multiplicaram. A tendência se acentuou em 2012. Segundo relatório do Setcepar, em maio 18 veículos de transporte de carga foram roubados na região; em junho, foram 40 assaltos. “Os números [de casos] estouraram. A categoria precisa de uma resposta rápida por parte do poder público”, diz.
Medo - Há 14 anos dirigindo uma transportadora em Paranaguá, no Litoral do estado, José Carlos Borba é testemunha da proliferação dos assaltos. “As quadrilhas estão muito abusadas. Os motoristas têm medo, estão evitando viajar à noite. Só querem sair de manhã”, conta.
Na semana passada, um caminhoneiro que presta serviços à empresa dele foi abordado em Curitiba por dois bandidos, que o obrigaram a parar a carreta. Um contêiner com 904 caixas de ferramentas foi levado pelos assaltantes e até agora não foi recuperado. O motorista foi feito refém por horas e libertado em um matagal, em São José dos Pinhais. Apenas o “cavalo” do caminhão foi encontrado.
O proprietário de uma transportadora – que pediu para não ser identificado – teve uma carga roubada no mês passado e lança dúvidas sobre a eficiência do trabalho de investigação sobre os assaltos. Na avaliação dele, a falta de prisões está diretamente relacionada ao aumento dos roubos. “A polícia estoura barracões com cargas roubadas, mas ninguém é preso. Como pode o barracão ser estourado, mas não se chegar à quadrilha? O sentimento é de impunidade”, afirma.
O delegado Cassiano Aufiero, da Delegacia de Estelionato e Desvio de Cargas de Curitiba, contesta a afirmação sobre a falta de prisões. “Em todas as vezes que localizamos um galpão teve pelo menos uma pessoa presa”, diz. Segundo ele, há 14 dias nenhum veículo de carga é roubado na Grande Curitiba. A trégua ocorreu após a prisão de um integrante de uma quadrilha que atuava na região metropolitana. O delegado afirma que, a partir desta detenção, a polícia identificou todo o grupo.
Impacto - A nova realidade das estradas alterou o modo de trabalhar das transportadoras. Segundo o sindicato, o valor do seguro dos caminhões e do próprio frete já sofreu um ligeiro aumento. Algumas empresas têm recorrido à escolta armada para trafegar em trechos de rodovias considerados mais críticos. Outras têm ampliado o investimento em rastreadores eletrônicos. “O problema é que todo esse aumento dos custos operacionais encarece o preço final do transporte. O impacto é muito grande”, diz Cantú.
50% dos casos são “golpe do seguro”, acusa delegado O chefe da Delegacia de Estelionato e Desvio de Cargas (Dedc) de Curitiba, Cassiano Aufiero, estima que pelo menos 50% dos roubos de cargas registrados correspondam aos chamados “golpes do seguro”. As próprias transportadoras simulariam os assaltos e registrariam as ocorrências com o objetivo de receber dinheiro das seguradoras. “Com isso, elas [as transportadoras] ganham em dobro: ficam com a mercadoria e com o valor do seguro”, afirma.
Segundo Aufiero, um indício da fraude é o fato de produtos não segurados – como pneus – dificilmente serem alvo das quadrilhas. Para coibir o golpe, a polícia tem feito uma investigação prévia quando as empresas vão registrar o boletim de ocorrência. “Se a gente descobrir que está mentindo, a pessoa já fica presa por falsa comunicação de crime”, diz.
Receptador - Outro pilar que sustenta o roubo de cargas, de acordo com a polícia, é a figura do receptador. Como a pena prevista para esse tipo penal é considerada branda, raramente eles ficam presos – na maioria dos casos, cabe fiança. Na avaliação do delegado, o combate à receptação é mais importante que a prisão das próprias quadrilhas.
“Se uma quadrilha for presa, logo aparece outra no lugar. O mais crítico é o receptador. É ele quem ‘dá emprego’ a todos esses bandidos”, afirma.
40 roubos a caminhões de carga ocorreram em Curitiba e região somente no mês passado – 120% a mais do que o registrado em maio, de acordo com levantamento da Setcepar.