Trabalho sob pressão

Publicado em
08 de Junho de 2012
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De um lado as transportadoras exigem caminhões com limites de idade e equipamentos de rastreamento, de outro os baixos valores dos fretes pesam no orçamento e para complicar ainda mais sua vida, o autônomo está descontente também com a falta de infraestrutura nas rodovias para atendê-lo e com a maneira como é tratado na atividade

Assim como qualquer outro emprego requer certas condições, conhecimentos e habilidades ao candidato para contratação, quem trabalha como motorista autônomo tem de cumprir uma série de exigências para sempre conseguir cargas, ir para a estrada e ganhar o próprio sustento. Em geral, as empresas solicitam três itens básicos: nome atualizado junto a seguradoras, caminhão com menos de 10 anos de uso e sistema de rastreamento. "As transportadoras pedem tudo quanto é coisa", brinca o carreteiro René Sandre, de 58 anos e autônomo desde os 20. Em sua opinião, o profissional independente precisa estar cadastrado em todas as seguradoras. "Não basta ter só uma, porque as transportadoras trabalham com empresas diferentes e para não perder carga é melhor ter todas", acrescenta.


Diante das exigências das transportadoras, o ideal é o motorista ter cadastro em várias empresas seguradoras, defende o autônomo Rene Sandré
As condições do veículo do autônomo também são avaliadas pelas empresas. "Como o caminhão é a nossa ferramenta de trabalho, precisa estar em bom estado, os contratantes exigem veículos com 10 anos de uso no máximo," explica o motorista João Pelegrino Mataloso. Dono de um Scania, ano 92, João considera difícil dizer qual o modelo preferido pelos transportadores na hora da contratação. "Não tem um tipo de veículo mais pedido, o modelo é de acordo com o tipo de carga a ser transportada", explica o autônomo.


Já tenho outros gastos durante as viagens e o rastreador seria mais uma despesa fixa para a utilização do sistema, justifica Vandimar Gomes Macedo
O sistema de rastreamento é outra exigência constante na lista de requisitos para se conseguir cargas. "Os contratantes preferem os caminhões que tem rastreador com teclado", diz o carreteiro Vandimar Gomes Macedo, 36 anos de idade e 18 de profissão e autônomo desde 2009. Mesmo com a alta procura das transportadoras por essa exigência, grande parte dos carreteiros não conta com o equipamento. "Não tenho rastreador porque ele seria mais uma despesa. Fora todos os outros gastos durante as viagens, eu desembolsaria uma taxa fixa e mensal para a utilização do sistema", justifica.


Não tenho e nem quero ter rastreador em meu caminhão, porque isso é um ’prato cheio’ para os assaltantes, opina Alfredo Carlos Magno
Já Alfredo Carlos Magnus, transportador de máquinas e peças indivisíveis do Rio Grande do Sul para o Rio de Janeiro, aponta outro motivo para a falta de adesão do equipamento. "Não tenho e nem quero ter, isso é um ’prato cheio’ para os assaltantes. Como posso deixar que alguém saiba o lugar exato onde estou? Prefiro não ter, porque se alguma coisa acontecesse comigo na estrada, desconfiaria do sistema", pontua o carreteiro. No entanto, o assessor da presidência no Setcesp (Sindicato das Empresas de Transportes de Carga de São Paulo e Região), Adauto Bentivegna Filho, diz que "esses e outros requisitos são importantes para garantir um transporte mais seguro tanto para a vida do motorista quanto para manter as condições de uso do bem transportado".


Para João Pelegrino Mataloso, o modelo de caminhão preferido pelos transportadores é de acordo com a carga a ser transportada
Cientes das condições impostas pelo mercado para se trabalhar, autônomos tentam cumprir a lista de requisitos, mas não demonstram tanto empenho em preencher 100% dos pedidos das transportadoras, por conta da desvalorização da categoria, os baixos fretes pagos pelos carregamentos, além das comissões embolsadas por agenciadores de cargas e a aplicação de restrições à circulação de caminhões nas principais vias centrais das capitais.


Não há percentagem padrão no cálculo da comissão, mas quando há grande procura por carga podemos cobrar mais, diz a agenciadora Fernanda de Souza Maia
Os inconvenientes do dia a dia da profissão têm desmotivado motoristas a permanecerem na profissão. Ilmar Maoski, autônomo há oito anos, diz sentir-se desvalorizado e pensa em vender o caminhão. " A vida na estrada é sofrida, as viagens não compensam mais, os fretes estão tão baixos que as vezes volto de uma cidade para outra vazio. Prefiro não carregar", reclama.


Mal atendimento e falta de pontos de paradas nas estrada, com banheiros e salas de descanso, além de fretes baixos são reclamações de Ilmar Maoski
Levantamento realizado no início desse ano pela NTC & Logística, entidade representativa do setor, aponta defasagem de 11,95% nos fretes pagos pelo transporte rodoviário de cargas no Brasil. Além disso, segundo o autônomo Vandimar Macedo, o lucro pela carga transportada cai ainda mais devido a comissão paga ao agenciador. "Se, por exemplo, as empresas oferecem R$2 mil para uma viagem de São Paulo a Brasília, os agenciadores pegam R$ 500 como comissão e divulgam um frete de apenas R$1.500" diz. A agenciadora de cargas do Terminal Fernão Dias, Fernanda Souza Maia, explica que não há uma porcentagem padrão usada no cálculo da comissão dos agenciadores. "Existem períodos em que a procura pela carga é muito grande, então é onde podemos cobrar um valor maior pela comissão, mas existe também o outro lado, quando temos muitas cargas e poucos motoristas. Muitas vezes cobramos abaixo que de costume para não perder a transportadora", explica.


É importante os autônomos investirem no aprimoramento profissional, estarem com caminhões e documentos em dia, defende Adauto Bentivegna, do Setcesp
Para o autônomo Arlindo Almeida Fernandes, há companheiros de profissão que contribuem para a existência de fretes com baixos. "Como têm muitos autônomos no mercado, as transportadoras jogam o valor do frete lá embaixo e acabam escolhendo o motorista que aceita o preço oferecido", afirma.


Os autônomos precisam ser mais presentes perante suas entidades e dirigentes, cobrando mais direitos e informações, sugere Norival de Almeida Silva
Enquanto as mudanças tanto para o setor quanto para a categoria não chegam, o assessor da presidência do Setcesp aconselha aos autônomos a investirem no aprimoramento profissional. "É importante fazer cursos de reciclagem oferecidos pelo Sest Senat, manter documentos em ordem e atualizados, além de possuírem veículos em condições de uso e com a segurança necessária", sugere Adauto Bentivegna.


Tem muito autônomo no mercado, as transportadoras jogam o valor do frete para baixo e escolhem quem aceita o valor oferecido, opina Arlindo Fernandes
Norival de Almeida Silva, presidente do Sindicam (Sindicado dos Transportadores Rodoviários Autônomos de Bens do Estado de São Paulo), concorda com o representante do Setcesp e acrescenta que deve haver mais união entre os profissionais da categoria. "É preciso chamar a atenção dos autônomos para que sejam mais presentes perante suas entidades e dirigentes, cobrando mais direitos e informações sobre o segmento onde trabalham.

Texto Iara Aurora 

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