Sonegação é principal problema do transporte, diz empresário

Publicado em
06 de Março de 2021
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Vale a pena acompanhar a matéria do jornalista Nelson Bortolin para a Carga Pesada, na íntegra, através do link: https://cargapesada.com.br/2021/03/03/sonegacao-e-principal-problema-do-transporte-diz-empresario/

Markenson Marques afirma que parte expressiva do setor pratica concorrência desleal driblando o Fisco

Nelson Bortolin

Sonegadores travestidos de empresários. É assim que o presidente da Cargolift, Markenson Marques, 56 anos, classifica parte expressiva dos transportadores brasileiros. Segundo ele, com a conivência do Supremo Tribunal Federal (STF), empresas do setor deixam de recolher bilhões de reais em impostos, praticando concorrência desleal e prejudicando quem atua dentro da lei.

“Só aqui no Paraná (a sede da empresa fica em Curitiba), tem uma transportadora que deve mais de R$ 160 milhões. É só olhar a lista de devedores na internet”, afirma.

De fato, uma busca no site da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional mostra que há uma empresa dedicada ao transporte rodoviário de carga (TRC) que deve R$ 161,252 milhões ao Fisco. Outras quatro, somente no Paraná, também têm dívidas de mais de R$ 100 milhões.

Quando a consulta é feita em âmbito nacional, a situação é bem mais grave. A transportadora que está em primeiro lugar na lista tem débito de R$ 10,3 bilhões Outras três também devem acima de R$ 1 bilhão.
Para Marques, que abriu a empresa no primeiro dia do Plano Real, em 1994, o pior momento econômico para o TRC é o atual. Justamente por causa da concorrência desleal aliada ao aumento de custos. “Esse é nosso pior momento porque o STF que está aí é conivente com o ilícito”, declara.

Ele ressalta que as dívidas são judicializadas pelas empresas. “As transportadoras alegam que não têm como pagar e o Supremo permite que continuem operando. Mas, na verdade, o empresário pegou aquele dinheiro que deixou de pagar (para o Fisco) e investiu em fazenda, desviou o dinheiro do imposto”, sustenta.
Além de cobrar que o STF “interprete a Constituição como ela é”, Marques considera ser necessária a aprovação de uma lei mais dura para tirar os sonegadores do mercado.

EX-VOLVO

Antes de montar a Cargolift, o empresário era funcionário da Volvo. “Trabalhava do outro lado da mesa, contratando transportador. Foi quando eu percebi como os transportadores eram despreparados. Naquela época, tinha inflação e eles vinham pedir reajuste com uma tabela debaixo do braço. E não sabia nem me dizer quanto o diesel e o pneu pesavam na planilha.”

Para fazer a diferença, ele conta que resolveu empreender. Quase 30 anos depois, Marques não vê muita mudança no mercado. “Lamentavelmente, o TRC não evoluiu: 8 em cada 10 transportadores sonegam impostos, praticam concorrência desleal. E essa é a grande causa da situação de penúria que vive o caminhoneiro brasileiro”, declara.

Essas empresas, de acordo com ele, praticam o frete abaixo do custo e “esmagam” o autônomo, quando não dão o calote. “Muitos carreteiros têm dificuldade de receber de transportadoras. Essa baderna no Brasil tem que acabar.”

INOVAÇÃO

Markenson Marques afirma que a Cargolift nasceu inovando. “Fomos os primeiros a fazer transporte multimodal no Paraná.” A empresa pegava contêineres no Porto de Paranaguá e levava de trem até Araucária, na Região Metropolitana de Curitiba. De lá, os produtos seguiam via rodoviária.

O empresário diz que a transportadora contava com equipamentos modernos para movimentar os contêineres. E o sistema era controlado por um software. “O cliente planejava no software a arrumação da carga dentro dos contêineres para pedir ao armador a quantidade correta.”

REGULAMENTAÇÃO

Para Marques, o transporte rodoviário de carga carece de mais regulamentação. “Hoje, se você construir um prédio, por menor que seja, a lei determina que um engenheiro civil tem de assinar tecnicamente responsável. Se o prédio cair, matar uma pessoa, tem o responsável.”
A atividade de transporte, segundo ele, expõe a sociedade a maior risco. “Um caminhão pode descer a Serra de Paranaguá, perder os freios por falta de manutenção, bater num ônibus e matar 40 pessoas. Quem é o responsável pela tragédia? O responsável técnico por uma transportadora hoje pode ser qualquer ‘Zé Mané’. Não tem cabimento.”

O seguro contra terceiro, na visão do empresário, deveria ser obrigatório para qualquer viagem.
Outro problema, na análise de Marques, é que a lei 11.442, aprovada há 14 anos, permitiu a contratação de seguro de carga pelo embarcador, a chamada DDR (Dispensa de Direito de Regresso), que é, segundo ele, prejudicial ao caminhoneiro. O presidente da Cargolift usa uma metáfora para defender seu argumento. “Se o motorista carrega uma carga hoje na Cargolift para um cliente A, ele tem de passar por uma regra de DDR, segundo a qual seu olho tem de ser azul. O mesmo motorista, quando for carregar uma carga pela Cargolift no cliente B, será exigido dele que tenha o olho verde.”

Se o seguro fosse 100% da Cargolift, a vida do caminhoneiro contratado pela transportadora seria bem mais fácil, porque ele precisaria atender apenas uma regra de DDR. O fim do dispositivo, conforme conta o empresário, está previsto no projeto de lei 2080, de 2015, que tramita no Congresso. “Com o fim da DDR, as grandes seguradoras não vão dar apólices para transportadores picaretas, que causam acidentes, que têm muito roubo de carga. Ou, se der, vai cobrar caro tirando a competitividade desses transportadores.”
O resultado, na visão de Marques, será a melhora do frete para todo o setor.

MÃO DE OBRA

O presidente da Cargolift afirma que não tem problema com falta de mão de obra, queixa de 9 entre 10 transportadoras. “Pago um salário decente. Não pago nada por fora. Nunca tive caixa dois. Ofereço plano de saúde, participação nos lucros e caminhão de qualidade para os motoristas”, justifica.
Ele explica como funciona a participação nos lucros. “A gente vincula o caminhão ao CPF do motorista. No final de cada mês, nosso sistema gera relatórios que mostram quanto aquele veículo faturou, quanto gastou de diesel, pneu, revisão, salário do motorista.” Do “lucro”, é retirado o valor da parcela do caminhão e 20% do que sobrar é destinado ao caminhoneiro.

MULHERES

O empresário diz que a Cargolift já teve quatro mulheres motoristas, mas que hoje não conta com nenhuma. “Só não temos agora porque não apareceram. Elas são muito bem-vindas.”
A transportadora tem uma frota de 100 cavalos de tração e 600 semirreboques. São 100 motoristas contratados pela CLT e cerca de 500 agregados que trabalham com as carretas da empresa.
O forte da Cagolift são cargas industriais. São transportados mais de 5 mil contêineres por mês. A empresa, que nasceu para atender o setor automotivo, ainda tem grande atuação nessa atividade. “Estamos na linha branca, na área agrícola e de cosméticos. Recentemente, entramos no e-commerce, setor que cresceu muito com a pandemia.”

AQUISIÇÕES

Questionado sobre o interesse estrangeiro nas empresas de transporte e logística brasileiras, ele diz que essa é uma tendência e que Cargolift já recebeu três ofertas de aquisição. “Esse movimento é bom porque valoriza a empresa brasileira. E porque é preciso concentrar mais o setor, que não pode continuar com 200 mil empresas.”
Sobre o porquê de não ter aceitado nenhuma das propostas, ele alega que tem uma missão que vai além de gerar lucro. E diz que a transportadora conta com um instituto pelo qual pratica responsabilidade social.

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