Sindicatos de classe estão deixando trabalhadores preocupados com possível perda de direitos.
Ao menos duas entidades que atuam em São Paulo estão ameaçando os trabalhadores que não pagam as contribuições sindical e assistencial de perderem direitos como reajuste salarial, vale-refeição, participação nos lucros, adicional noturno e outros.
O UOL teve acesso a duas cartas em que sindicatos condicionam direitos trabalhistas ao pagamento das contribuições. Numa delas, o Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo cita a perda do reajuste salarial e outros benefícios.
Em outra, o SindPD (Sindicato dos Trabalhadores em Processamento de Dados e Tecnologia da Informação do Estado de São Paulo) fala de forma vaga sobre a perda de direitos, sem mais detalhes. Veja também As cartas estão nos sindicatos e precisam ser assinadas por quem for pedir isenção das contribuições.
No meio delas, está escrito que o trabalhador concorda em abrir mão dos acordos coletivos (no caso dos metalúrgicos, o documento cita explicitamente reajustes salariais; na carta do SindPD, fala-se em desistir de "direitos conquistados"). Os sindicatos podem fazer isso?
Essa conduta dos sindicatos é ilegal, segundo Juliano Alexandre Ferreira, procurador e coordenador da área de Promoção da Liberdade Sindical do MPT (Ministério Público do Trabalho). "Nenhum direito decorrente de lei ou norma coletiva está condicionado a contribuir com sindicatos", afirmou.
Para Helena Gomez, advogada trabalhista do escritório Motta Fernandes, os sindicatos não podem selecionar quais trabalhadores terão acesso aos direitos negociados com o empregador. "Vejo isso como uma manobra dos sindicatos para aumentar a arrecadação, que caiu bastante depois da reforma trabalhista", disse.
Contribuições não são obrigatórias
O procurador do MPT afirmou que o trabalhador que não é sindicalizado não é obrigado a pagar nenhuma taxa ao sindicato. A contribuição assistencial já era optativa para o trabalhador, enquanto a contribuição sindical --também chamada de imposto sindical-- deixou de ser obrigatória após a reforma trabalhista, que entrou em vigor em novembro de 2017. Segundo Ferreira, todos os trabalhadores da categoria devem ser representados pelo sindicato, sejam filiados ou não e mesmo que não contribuam.
Ainda que a categoria tenha decidido em assembleia pelo desconto das contribuições, quem não é sindicalizado pode se recusar a pagar. "O sindicato não pode excluir o trabalhador por exercer seu direito de oposição", disse. Advogada recomenda não assinar carta O trabalhador só deve assinar a carta de renúncia às contribuições do sindicato se forem retirados os trechos que mencionam perda de direitos, segundo Helena Gomez, do escritório Motta Fernandes.
Caso contrário, o documento não deve ser assinado.
Se o sindicato não aceitar a carta com os trechos removidos, a alternativa é entregá-la no RH da empresa. "Com essa carta em mãos, o empregador tem como comprovar que o funcionário não autorizou o desconto quando ele for questionado pelo sindicato", afirmou a advogada. No caso de a empresa e o sindicato se recusarem a aceitar a carta do trabalhador, é possível fazer uma denúncia no site do MPT, que pode exigir que o sindicato atue de maneira correta, se constatada a irregularidade.
Quem assinou a carta pode ficar sem aumento?
É possível que quem assinou a carta abrindo mão dos direitos fique sem o aumento negociado entre sindicato e empregador, de acordo com Helena. Nesse caso, o trabalhador pode pedir na Justiça o mesmo aumento dado à categoria. "Não posso dizer que nenhuma empresa faria isso. Risco sempre há", declarou. Também não há garantias de que o trabalhador consiga o aumento ao levar o caso para a Justiça. Segundo a advogada, a decisão depende do juiz que analisará o caso e das provas apresentadas.
O que dizem os sindicatos?
Em nota, o SindPD afirmou que "seguiu rigidamente todos os procedimentos legais para realização das assembleias, publicações e notificações para a categoria". Segundo a entidade, trabalhadores que participaram das assembleias consideraram injusto que uma pequena parcela, que se acha autossuficiente, queira usufruir das conquistas do sindicato sem nenhum ônus. "Isso fere até o bom senso", disse