Rodízio versus Pedágio Urbano

Publicado em
14 de Junho de 2014
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Na semana passada, Samuel Pessôa publicou um excelente artigo na Folha, discutindo possíveis efeitos de diferentes políticas públicas (notadamente rodízio e pedágio urbano) no trânsito de São Paulo. Vale a pena dar uma olhada não só pela discussão profunda, mas também porque tem muita economia lá.

Em um ponto concordo com Samuel: rodízio não é uma forma eficiente de reduzir o trânsito, basicamente porque as pessoas compram outro carro (com final de placa diferente) para escapar da restrição. E tem evidência disso. Na Cidade do México, há um programa semelhante ao de São Paulo, porém bem mais agressivo - Hoy no circula. Dependendo do final da placa, o carro não pode circular entre 5 da manhã e 10 da noite. Em São Paulo, isso só vale nos horários de pico: 7:00 às 10:00 e 17:00 às 20:00.

artigo de Lucas Davis (Journal of Political Economy, 2008) avalia a introdução doHoy no circula em 1989. O autor não encontra nenhum efeito sobre a emissão de poluentes. Mas o número de carros registrados na Cidade do México aumentou consideravelmente com a implementação do programa. E isso ocorreu majoritariamente por conta do aumento nos registros de veículos usados (vindos de outras regiões do México e dos Estados Unidos), o que sugere que as pessoas estão comprando carros usados para escapar da restrição. Por serem mais antigos, esses veículos também tendem a poluir mais.

O rodízio tem mais um problema: é difícil fazer ajustes na margem. Por exemplo, em São Paulo, já tem gente falando em estender a restrição para dois dias da semana (ou seja, cada carro não poderia circular por dois dias, dependendo do final da placa). Isso está longe de ser uma mudança na margem. E imagino que o incentivo a adquirir um carro adicional seria enorme nesse caso.

Já o pedágio urbano atua no sentido de desestimular o uso do carro, e permite que se façam esses ajustes na margem. Por exemplo, se a tarifa for R$10 e o trânsito continuar carregado, é só aumentar o preço. E não tem como a pessoa evitar o pagamento comprando outro veículo. Mais uma vantagem: ao contrário do rodízio, o Estado acaba arrecadando recursos nesse caso.

De fato, tem o inconveniente de que os pobres seriam prejudicados pois não poderiam pagar pelo pedágio. Mas a função da política de trânsito não é redistribuir renda (isso pode ser feito com impostos sobre renda/riqueza e programas de transferência de renda, como o Bolsa Família). Além disso, o rodízio também penaliza os mais pobres, uma vez que escapam da restrição apenas aqueles que têm dinheiro suficiente para comprar um veículo adicional.

Meu principal questionamento a essa estratégia é operacional. Muito provavelmente os motoristas adotariam rotas alternativas para escapar dos pedágios. Em uma cidade cheia das "quebradas" como São Paulo (ainda mais com a ajuda do Waze), isso pode ser bem problemático: transfere-se o trânsito de vias rápidas e com bastante espaço para ruas residenciais.

Texto publicado originalmente no blog Economista X.

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