Questões relevantes na contratação de Transportador Autônomo de Cargas – Lei nº 11.442/2007*

Publicado em
19 de Março de 2017
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No nosso cotidiano jurídico, deparamo-nos com situações conflituosas envolvendo a contratação do “transportador autônomo de cargas”.

É bastante comum as empresas de transporte subcontratarem outras empresas do mesmo ramo de atividade ou transportadores autônomos de cargas para cumprir parte do percurso, devido à própria sazonalidade da atividade. A Lei n. 11.442/2007 trata do transporte rodoviário de cargas prestado por terceiros, mediante remuneração, estabelecendo em seu artigo 2º que esta atividade é “de natureza comercial, exercida por pessoa física ou jurídica, em regime de livre concorrência”. Já os incisos I e II de tal dispositivo conceituam os sujeitos, que são o trabalhador autônomo de cargas (TAC) e a empresa de transportes rodoviários de cargas (ETC).

O primeiro trata-se de “pessoa física que tenha no transporte rodoviário de cargas a sua atividade profissional”; já a segunda é a “pessoa jurídica constituída por qualquer forma prevista em lei que tenha no transporte rodoviário de cargas a sua atividade principal”. A lei em questão, em seu artigo 4º, parágrafos 1º e 2º, reconhece a existência de duas espécies de transportador autônomo de cargas: o Transportador Autônomo de Cargas Agregado e o Transportador Autônomo de Cargas Independente. Denomina-se TAC Agregado aquele que coloca veículo de sua propriedade ou de sua posse, a ser dirigido por ele próprio ou por preposto seu, a serviço do contratante, com exclusividade, mediante remuneração certa (parágrafo 1º, do artigo 4º, da Lei 11.442/07). Já o TAC Independente é aquele que presta serviços de transporte de carga de que trata a Lei 11.442/07, em caráter eventual e sem exclusividade, mediante frete ajustado a cada viagem.

Embora o artigo 5º da referida lei assevere que o contrato celebrado pelo transportador autônomo, seja ele agregado ou independente, será sempre de natureza comercial e não enseja, em nenhuma hipótese, a caracterização do vínculo empregatício, o fato é que há um grande número de ações ajuizadas por esses transportadores, perante a Justiça do Trabalho, pleiteando exatamente o reconhecimento da relação de emprego. Isso porque, para a Justiça do Trabalho, não basta que esteja previsto na lei que entre determinada relação não haverá vínculo de emprego, pois o que se leva em conta é o chamado “contrato realidade”, ou seja, os fatos que nortearam a relação.

Em vista disso, em especial na contratação do TAC Agregado, como pessoa física, é possível haver certa “confusão” entre ser ele autônomo ou empregado, haja vista a presença dos requisitos do vínculo de emprego, como a não eventualidade, a pessoalidade, a onerosidade e a subordinação. Quando há a subcontratação de uma pessoa jurídica, pressupõe-se que a prestação dos serviços poderá ser feita por vários prepostos, excluindo-se o requisito da pessoalidade. Contudo, no caso de pessoa física, será ela quem prestará os serviços, o que poderá acabar por, digamos, viciar a relação, que transmutará de autônoma para de emprego. Inclusive, tramita no Supremo Tribunal Federal, desde 21 de setembro de 2007, Ação Direta de Inconstitucionalidade, Processo ADI 3.961, proposta pelas Associações Nacionais do Ministério Público do Trabalho e dos Magistrados Trabalhistas, tendo como Relator o Ministro Joaquim Barbosa. A referida ação, cuja liminar foi negada, tenciona a declaração de inconstitucionalidade dos artigos 4º e 5º da Lei 11.442/07, e encontra-se pendente de julgamento.

O trabalhador autônomo é aquele que labora por conta própria, o que significa que assume integralmente os riscos de sua atividade, não se colocando sob a dependência de outros. Ele também não estará sujeito a horários, a ordens, nem a fiscalização do tomador dos serviços, não recebendo salários, mas pagamento pelos serviços que prestar, não estando a contratação sujeita às regras da legislação trabalhista. Porém, não podemos deixar de realçar que em determinadas atividades é quase que impossível não exigir, por exemplo, a pessoalidade na prestação dos serviços, pois como ter a cada dia uma pessoa realizando entregas de produtos que foram confiados por clientes? E no caso de o veículo que transportará as mercadorias necessitar de adaptações?

Em tais situações, talvez seja interessante a contratação de motoristas empregados, haja vista que o reconhecimento do vínculo de emprego implicará na anotação do contrato de trabalho em CTPS; no recolhimento da contribuição previdenciária; nos depósitos de FGTS e multa de 50%; no pagamento de férias + 1/3, 13º salário, bem como eventuais direitos garantidos por convenções coletivas de trabalho. Importante, portanto, antes de se decidir pela espécie de contratação, se como autônomo, nos termos da Lei nº 11.442/07, ou se como empregado, analisar as atividades que serão desempenhadas, discutir o assunto, evitando-se uma decisão impensada, que poderá acarretar em um passivo trabalhista no futuro.

De qualquer forma, deixaremos aqui algumas observações para aquelas empresas que desejam contratar transportadores autônomos de cargas:

• Exigir que o TAC, seja ele Agregado ou Independente, possua o Registro do Transportador Rodoviário de Cargas - RNTRC, na categoria Transportador Autônomo de Cargas, devendo comprovar ser proprietário, coproprietário ou arrendatário de veículo de aluguel. Para obter esse registro, o TAC deverá comprovar experiência de 3 (três) anos ou aprovação em curso específico.

• Exigir a comprovação de inscrição como segurado da Previdência Social e no Cadastro de Contribuinte Municipal, caso haja Imposto Sobre Serviços (ISS) incidente sobre a atividade a ser realizada;

• Elaborar o contrato de prestação de serviços;

• Exigir a emissão de notas fiscais ou o RPA - Recibo de Pagamento a Autônomo;

• Exigir que ele possua todos os equipamentos de controle da operação, como por exemplo, rastreador por satélite, tacógrafo, controladores de velocidade etc., não sendo recomendável a cessão pela empresa contratante;

• Exigir que ele possua veículo adequado à prestação dos serviços;

• Deixar que o TAC adote livremente os procedimentos necessários à realização das tarefas, sem interferência da empresa contratante; • Não exigir pessoalidade, permitindo a substituição por prepostos;

• Não pode haver qualquer subordinação jurídica ou hierárquica entre os transportadores autônomos de cargas e as empresas de transporte contratantes.

Além dos problemas relativos à presença dos requisitos da relação de emprego, outro ponto bastante destacado por membros do Ministério Público do Trabalho, Auditores Fiscais do MTE e em algumas decisões judiciais, diz respeito ao fato de que a contratação de transportador autônomo de cargas implica na terceirização da atividade fim da empresa de transporte, situação vedada pelo artigo 9º da LCT e pela Súmula 331 do TST, já que pode configurar fraude às leis trabalhistas.

Aliás, a questão da terceirização, de forma geral, foi objeto de audiência pública realizada pelo Tribunal Superior do Trabalho, tendo sido noticiado pelo jornal “Valor Econômico”, na data de 07/12/2011, que a Câmara dos Deputados só deve concluir a votação da proposta que trata do tema em meados de 2012. Mas, segundo os defensores de tal tese, qual seja a de que há terceirização, ao contratar o TAC Agregado ou Independente, a empresa de transporte estaria substituindo a sua frota própria e transferindo ao autônomo a sua atividade fim.

Contudo, há opiniões divergentes, no sentido de que a contratação do TAC não se trata de terceirização, mas sim de subcontratação de transporte a frete (transporte cumulativo), com fundamento nos artigos 743 e seguintes do Código Civil, na Lei Federal de n.º 11.442/07, e artigos 5º, incisos II, XIII e 170, parágrafo único, da Constituição Federal. Salientamos, por derradeiro, que deve-se observar com bastante rigor as exigências contidas na Lei n.º 11.442/07, quando da contratação do transportador autônomo de cargas, não esquecendo-se, entretanto, de que a cautela deve haver não só no ato da formalização (parte documental), mas também na execução dos serviços, pois, conforme já mencionado, de nada adianta estar em ordem a documentação e no relacionamento diário o tratamento ser de natureza empregatícia.

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