Por que a Hitachi opta pelo Porto de Itaguaí em vez do Porto de Santos: um raio-X das deficiências logísticas de São Paulo

Publicado em
09 de Agosto de 2025
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Editorial

Quando falamos de logística de transporte de cargas indivisíveis e superdimensionadas, a equação básica costuma considerar distância e tempo como variáveis primordiais. No caso de um fabricante de transformadores de grande porte localizado em Guarulhos, seria lógico esperar que o Porto de Santos, a pouco mais de 100 km, fosse a porta natural de saída. No entanto, a escolha estratégica recai sobre o Porto de Itaguaí (RJ), a mais de 400 km – quatro vezes mais distante.

À primeira vista, essa decisão parece contraintuitiva. Mas, ao analisar com profundidade os fatores estratégicos, operacionais e de custos, além da segurança, o cenário revela algo muito mais grave: a infraestrutura logística do Estado de São Paulo e o ambiente regulatório-burocrático estão afastando operações que naturalmente deveriam ocorrer em seu território.


1. Custo: a matemática invisível das taxas e tarifas

O transporte de cargas superdimensionadas em São Paulo está sujeito a um emaranhado de custos adicionais, entre eles:

  • TAP (Tarifa Adicional de Pedágio) e TOP (Tarifa Operaçôes Especiais) cobradas apenas nas concessionárias estaduais paulistas, no caso SPMAR e ECOVIAS DOS IMIGRANTES (vide exemplo tabela abaixo)

  • Necessidade de múltiplas Autorizações Especiais de Trânsito (AET), já que o percurso até Santos cruza trechos sob jurisdição federal (DNIT) e estaduais (DER-SP.

  • Custos indiretos relacionados a interdições, escoltas e restrições de janela de operação impostas pelas concessionárias.

No trajeto para Itaguaí, apesar da distância maior, a carga circula majoritariamente por rodovias federais (como a Dutra), onde o processo é centralizado no DNIT e a negociação é feita com apenas uma concessionária (CCR Rio-SP), reduzindo significativamente a burocracia e custos paralelos.


2. Operacional: menos atores, menos gargalos

O trajeto via Santos exige lidar com:

  • Várias concessionárias, cada uma com regras, prazos e tarifas próprias.

  • Diferentes sistemas e fluxos de aprovação de AET.

  • Complexidade na coordenação de escoltas e na gestão de travessias de pontos críticos.

Já via Itaguaí, o número de atores institucionais se reduz drasticamente, facilitando a coordenação, reduzindo risco de atrasos e simplificando o planejamento logístico.


3. Segurança: previsibilidade é proteção

Em operações de alto valor agregado, como o transporte de transformadores, previsibilidade é um elemento central de segurança.

No Estado de São Paulo, a sobreposição de regras e a ausência de um sistema unificado aumentam o risco de paradas não planejadas, atrasos e até improvisações operacionais que expõem a carga e a equipe a situações de insegurança.

No trajeto via Itaguaí, a uniformidade de procedimentos e prazos reduz incertezas e melhora a confiabilidade do transporte.


4. Estratégia: quando o custo Brasil empurra para fora

A decisão de optar por Itaguaí é mais que uma escolha logística — é um sintoma de um problema estrutural:

  • A burocracia excessiva em São Paulo não só encarece, como também desestimula a utilização de sua infraestrutura rodoviária e também portuária.

  • A tarifação estadual aplicada ao transporte especial funciona como um desincentivo competitivo.

  • Em tempos de aumento da competição internacional e pressões como as tarifas norte-americanas sobre produtos brasileiros, qualquer custo extra ou atraso desnecessário pode ser a diferença entre ganhar ou perder um contrato global.

Conclusão: o alerta que não podemos ignorar

A escolha pelo Porto de Itaguaí, mesmo com maior distância, expõe uma realidade preocupante: São Paulo, o estado mais rico e industrializado do Brasil, está perdendo competitividade logística para estados vizinhos.

Isso ocorre não só por falta de infraestrutura rodoviária e portuária, mas, também, por deficiências na gestão logística e na harmonização regulatória, além de uma política tarifária que penaliza o transporte de cargas estratégicas para a indústria nacional.

Se quisermos proteger e expandir o "Made in Brazil" em um cenário global cada vez mais hostil, precisamos agir em duas frentes:

  1. Investir em mais estradas adaptadas ao transporte de cargas especiais.

  2. Eliminar a burocracia e revisar as tarifas que hoje empurram nossas cargas e nossa riqueza para fora do território paulista.

Enquanto isso não acontecer, casos como o da Hitachi serão apenas a ponta do iceberg de um processo silencioso de perda de competitividade nacional.

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