Perspectivas de melhoras para o Brasil somente com um novo governo. E aí a responsabilidade também é nossa.*

Publicado em
07 de Dezembro de 2021
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Artigo escrito por Paulo Roberto Guedes – 06/12/21*
 
Em agosto deste ano escrevi um artigo (“Entre combater a pandemia e proteger a economia, o governo federal brasileiro optou pelo agravamento da crise”) apenas para constatar o que muitos já sabiam: a falta de rumo e de liderança, características deste (des) governo, tanto para o enfrentamento dos reais problemas nacionais como aqueles causados pela pandemia, têm contribuído decisivamente para o agravamento da crise instalada e aumentado a desconfiança com relação ao desempenho do Brasil para o próximo ano. Lamentavelmente 2022 poderá ser tão ruim ou pior do que 2021.
 
Ao não adotar as medidas cientificamente reconhecidas como corretas no combate à pandemia, além de retardar o início da retomada do crescimento econômico e gastar muito mais do que deveria (e nem sempre de forma clara e eficaz), o Brasil alcançou números em proporções muito acima das médias mundiais, quando se comparam os casos e as mortes gerados pela covid-19: com cerca de 2,71% da população mundial o País teve 8,39% dos casos e 11,77% das mortes provenientes da pandemia, segundo dados da Our World Data computados até o dia 30/11/21.
 
O Brasil não fez a lição de casa e, como muito bem “relatou” a CPI da Covid do Senado Federal, após elencar os diversos tipos de crimes cometidos (1), principalmente pelas autoridades federais, “o que restou evidente até o momento da conclusão dos trabalhos da comissão de especialistas é a ocorrência de uma gestão governamental deliberadamente irresponsável e que infringe a lei penal (grifos meus), devendo haver pronta responsabilização”. E mais: “Não se trata, apenas, de descumprimento de deveres por parte dos gestores públicos, mas, também, da recusa constante do conhecimento científico produzido ao longo do enfrentamento da pandemia do Covid-19” (grifos meus).
 
Complementando esse triste cenário, o índice de desemprego não ‘cede’ nas proporções que se necessita e alguns dos principais indicadores macroeconômicos vem projetando situações de piora. Baixo crescimento da economia (2), aumento da inflação (3) e das taxas de juros e desvalorização do real, não projetam melhor desempenho econômico.
 
Especificamente com relação à inflação, reconhece-se que há, de fato, um aumento de caráter mundial, pois a pandemia, além de ‘criar’ novos hábitos no consumidor, desorganizou o sistema produtivo mundial, interrompeu a fabricação de mercadorias, desestruturou grande parte das cadeias de suprimentos e ‘forçou’ um aumento muito rápido nos preços da maioria das ‘commodities’. Entretanto, e sem qualquer dúvida, em virtude de seus próprios erros, o Brasil acelerou o aumento dos preços e de forma generalizada. Desconfiança com relação à manutenção do equilíbrio das finanças públicas e às políticas de proteção do meio-ambiente, questões com relação aos preços da energia oriunda do petróleo ou das hidroelétricas e o cenário político e institucional, são alguns exemplos que proporcionaram uma exagerada ‘precificação’ de ativos financeiros no Brasil. A taxa de câmbio parece ser um bom exemplo.
 
Por outro lado, considerando que a economia brasileira é bastante indexada (inflação do dia é utilizada como referência para a correção de preços de amanhã), o fator ‘inercial’ tem potencializado a inflação brasileira ainda mais. 
 
De qualquer forma acredito que seria importante discutir, pelo menos, se a pressão inflacionária no Brasil é somente fruto do excesso de demanda ou se não há, também, pressões por eventual ‘falta’ de oferta. Não se deve esquecer que a falta de crédito e os juros altos também inibem a demanda. E se isso for verdade, somente aumentar as taxas de juros não resolve o problema.  Portanto, há que se analisar mais detalhadamente os principais motivos para a queda no consumo das famílias, principalmente neste ano, considerando-se alguns fatores fundamentais: desemprego, perda do poder de compra diante da inflação, juros altos, pouco crédito e baixo percentual de renda disponibilizada para o consumo, considerando o alto nível de endividamento familiar.
 
Portanto, não há condições concretas para expectativas melhores com relação ao desempenho da economia brasileira no futuro próximo. Aliás, muito pelo contrário, pois se Bolsonaro e o atual Congresso (4) não são confiáveis e muito pouco fizeram para amenizar os reais problemas brasileiros neste mandato (cadê as Reformas?), imagine-se o que não farão em época de eleição. Enfatize-se, inclusive, que o Senado e a Câmara Federal desrespeitam decisão do Supremo Tribunal Federal (5) ao trabalharem não só para a manutenção da Emenda do Relator, mas também para manter ocultos os nomes dos parlamentares favorecidos nos anos de 2020 (com R$ 30,1 bilhões) e 2021 (com R$ 18,5 bilhões). Crise institucional à vista? 
 
Com relação a um dos assuntos mais comentados e discutidos nas últimas semanas, a PEC dos Precatórios (6), há que se considerar que o assunto ainda não terminou e, parece, deverá se transformar em uma “queda de braço” entre Senado e Câmara Federal, na medida em que o Senado alterou vários pontos (7) do projeto anteriormente aprovado pelos deputados. Novos problemas à frente.
 
Pois é, buscando sua reeleição a qualquer custo, o presidente Bolsonaro, com apoio explícito do Presidente da Câmara Federal e do “Centrão”, mas também de congressistas que não querem se expor e adoram votar secretamente, não só está aumentando os gastos públicos como ignorando suas responsabilidades orçamentárias, fiscais e Constitucionais. Compreende-se, aqui, porque o Presidente Bolsonaro colabora decisivamente para a aprovação da Emenda do Relator. 
 
Indiscutivelmente, como disse o economista Armínio Fraga em entrevista cedida à jornalista Adriana Fernandes e publicada pelo Estadão do último dia 06: “O que vivemos agora é a continuidade do que começou em 2014: a destruição do arcabouço de responsabilidade fiscal do País. Isso é gravíssimo, um fator de incerteza e de risco altamente relevante”. 
 
Ora, como diminuir as expectativas inflacionários se a política fiscal inexiste e os gastos estão descontrolados? E como estimular investimentos privados quando não se respeita a Constituição e as regras do Orçamento Federal? Não sem motivo o Banco Central deverá, ainda nesta última reunião do Copom, aumentar a taxa Selic (8), valendo ressaltar que quaisquer movimentações no sentido de se diminuir uma inflação que já alcançou os dois dígitos, exigirá muito esforço e com consequências indesejáveis, como é o caso da recessão econômica já “em marcha”. 
 
Também não sem motivo, o presidente Jair Bolsonaro já ameaça a “nova autonomia do BCB”, pois a ele não interessa – aliás nem a nós, mas por motivos diferentes – economia ‘em baixa’. Mais “incertezas” institucionais?
O roteiro é conhecido: taxa de juros em crescimento e aumento dos gastos do governo elevarão a dívida pública e, de forma correspondente e imediata, as despesas financeiras para fazer frente ao “serviço da dívida”, cujo percentual, com relação ao PIB, poderá voltar à casa dos 90,6% (Dívida Bruta) ainda neste ano e a 92,4% em 2022, segundo dados do FMI. Ainda, de acordo com o FMI, os países emergentes deverão alcançar, na média, respectivamente, 64,3% e 69,8%, enquanto os países da América Latina, excetuando-se o Brasil, terão medias de 73% e 73,2%, respectivamente.
 
Não há dúvidas que a forma desastrosa como se maneja a economia e o péssimo ambiente institucional criam um clima totalmente contrário àquele desejado pelos empresários e investidores (9), restando evidente a reação do mercado, com reflexos imediatos – e terríveis - nos índices da Bolsa de Valores e na cotação do dólar.
 
É óbvio que o Brasil ainda possui um conjunto significativo de desvantagens quando comparado a outros países no mundo (10) e que a nova cepa da Covid-19, a Ômicron, também contribui para que os graus de incertezas aumentem. Mas está claro que as incertezas “proporcionadas” pelo (des) governo brasileiro adicionam outros ingredientes de piora nas condições deste País (11).
 
Em resumo, a agenda ‘eleitoreira’ do governo ainda gera equívocos no combate à pandemia, a economia não funciona como deveria, e os serviços públicos, sem novos investimentos, prestam serviços cada vez piores (excetuando-se, é claro, o programa de vacinação contra a Covid-19) à população. Desilusão, desconfiança, medo e apreensão (12), são os principais sentimentos da imensa maioria dos brasileiros, cujos níveis de cansaço e irritação são crescentes. 
 
Precisamente no dia 06 de julho deste ano, ao publicar artigo no Portal do Guia do TRC (“A economia ainda é um problema a ser equacionado), eu comentava que era preciso “abandonar, de vez, pensamentos e modelos ultrapassados, diferentemente do que apregoa o governo atual e seu ministro da economia, que só acreditam no chamado “deus mercado”. E completava: “a moderna economia, e sua própria visão de futuro, no qual setores público e privado desempenham papeis complementares, baseia-se na inovação, no desenvolvimento tecnológico e científico e exige compromissos permanentes com a prevenção da saúde, com a sustentabilidade, a preservação do meio-ambiente, a inclusão social e a diminuição da desigualdade”. Para finalizar fiz a seguinte pergunta: “Estamos falando da Social Democracia?”. Pois é, em entrevista do economista Armínio Fraga, aqui já citada, ao dizer que as discussões com relação à desigualdade farão parte dos debates nas próximas eleições ele ponderou: “O modelo social-liberal, que foi o do Fernando Henrique, ainda me parece o melhor caminho”.
 
Felizmente, como parecem refletir diversas pesquisas, grande parte da população brasileira percebeu que um governo populista, irresponsável e retrógrado como este de Bolsonaro, assim como já havia percebido no desastroso governo Dilma, é danoso para o Brasil, sua população e para a própria Democracia, sugerindo que se dê um ao fim ao posicionamento extremista e radical que ambos teimam em querer praticar. Mas isso, evidentemente, somente poderá ser constatado, dependendo dos resultados das próximas eleições presidenciais. E quanto a isso, a responsabilidade é nossa. 
 
(1) Conclusão final do parecer: “Em face do exposto, sintetiza-se a resposta à consulta nos seguintes termos: não são poucas as situações que, ao ver da comissão de especialistas, merecem o aprofundamento das investigações pelos órgãos de controle do Estado brasileiro, assim como são bastante evidentes as hipóteses reais de justa causa para diversas ações penais. Os fartos elementos probatórios estão a demonstrar a existência de “crime de responsabilidade” (art. 7º, número 9, da Lei 1.079/50), de crimes contra saúde pública, como os crimes de epidemia (art. 267 do Código Penal) e de infração de medida sanitária preventiva (art. 268 do Código Penal), além da figura do charlatanismo (art. 283 do Código Penal); de crime contra a paz pública, na modalidade de incitação ao crime (art. 286 do Código Penal); de crimes contra a Administração Pública, representados pelos crimes de falsidade (arts.298 e 304do Código Penal) e de estelionato (art. 171, §3º, c/c art. 14, II, ambos do Código Penal), de corrupção passiva (art.317doCódigo Penal), de advocacia administrativa (art. 321do Código Penal) e de prevaricação (art. 319 do Código Penal). Por fim, não menos importante é a repercussão jurídica na esfera internacional das condutas examinadas pela comissão de especialistas, que configuram crimes contra humanidade (art. 7º do Estatuto de Roma). Imputações penais potencialmente cabíveis aos agentes públicos e privados responsáveis por ações e omissões no combate à pandemia – conf. requerimento 826/21 para comissão de especialistas – 13.09.2021;
 
(2) A queda de 0,1% no terceiro trimestre e a revisão do índice relativo ao segundo trimestre (passou para 0,4% negativos), indicam que o Brasil está em recessão técnica, com tendência à continuar, considerando que nos meses de outubro, novembro e dezembro os indicadores não são animadores.
 
(3) Aliás, parte significativa do mercado já prevê, para 2022, uma recessão. Se se considerar ainda, quaisquer efeitos da Ômicron e seus impactos em todo o mundo, esses números ainda poderão piorar.
 
(4) “Congresso acelera projetos de interesse dos parlamentares às vésperas de 2022” foi o artigo publicado pelo Estadão. Segundo a reportagem, nNas próximas semanas um pacote para atender os diversos grupos políticos que apoiam Bolsonaro está previsto para entrar em pauta neste último mês do ano, inclusive a liberação dos ‘jogos”. Pois é, nada a ver com os interesses nacionais.
 
(5) O ex-secretário a Receita Federal, Everardo Maciel, ao escrever o artigo intitulado “A anarquia orçamentária” (Estadão de 02/12/21), foi extremamente claro e certeiro: “A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), com base em voto da ministra Rosa Weber, que sustou a execução das denominadas “emendas do relator”, no Orçamento da União, e determinou a identificação da autoria e destinação das emendas já pagas, além de bem fundamentada (grifos meus), suscitou um debate, malgrado insuficiente, sobre a relevante, porém negligenciada, questão orçamentária no Brasil. Emendas de parlamentares ao orçamento integram o instituto da representação popular. Atender às demandas de seus representados é parte legítima do mandato parlamentar. Porém, nada disso justifica as chamadas “emendas parlamentares” no orçamento, sejam elas individuais, de bancada ou do relator (grifos meus).
 
(6) A PEC dos Precários é fundamental para os objetivos do governo federal, pois “cria” cerca de R$ 106,1 bilhões para novas despesas no Orçamento de 2022 que, como já sabido, é ano de eleições.
 
(7) Principais pontos alterados pelo Senado Federal na PEC dos Precatórios:
  • Transformação do Auxílio Brasil, inicialmente programado para terminar em 31.12.2022, em programa permanente e sem exigência, pelo menos até o final de 2022, de apresentar fonte de financiamento (ao contrário do que determina a Lei de Responsabilidade Fiscal - LRF).
  • Diminuição do tempo - de 2036 para 2026 - para o pagamento dos precatórios não pagos;
  • Destinação obrigatória de recursos, obtidos pela PEC, para a saúde, a assistência social e a Previdência;
  • Mantido fora do ‘teto dos gastos’ os precatórios do antigo Fundef a Estados municípios.
 
(8) Não há dúvidas que os custos internacionais e a crise fiscal interna pressionam os custos para cima, mas há risco evidente, como disse o economista-chefe da XP Investimentos, Caio Megale ao jornalista Alex Ribeiro do Jornal Valor (03.12.21), de o BC cometer o “overkill”, isto é, aumentar exageradamente as taxas Selic e esperar que os efeitos sobre a inflação sejam sempre os melhores possíveis e sem ‘efeitos colaterais”. Pressão inflacionária é um deles. Ainda segundo Megale, o BC precisa estar sempre atento para manter o equilíbrio entre “volatilidade do PIB X volatilidade da Inflação”.
 
(9) Em 2020 houve uma contração de 62% no fluxo de Investimentos Diretos no Brasil, que caiu da 6.ª posição entre os maiores receptores do mundo para a 11.ª. Neste caso, os investimentos dependem dos ‘estrangeiros’ que, como se sabe, não querem correr riscos desnecessários quando se pode investir em mercados mais estáveis, rentáveis e seguros. São claros os exemplos de saída de empresas que mantinham instalações e operações no Brasil. Embora possa ser mais profundamente discutido este assunto, está claro que o País vem perdendo espaços importantes nas cadeias globais de valor.
 
(10) O PIB dos países que compõem a OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico) cresceu 3,4% nos três primeiros trimestres do ano e a União Europeia 4,0%. A taxa de desemprego na OCDE já está em 5,8% e a inflação dos últimos 12 meses, finalizado em outubro, alcançou a média de 5,2%.
 
(11) Em artigo intitulado “Descompasso com o mundo” (Estadão de 14.10.21), fica claro quais são os motivos pelos quais o Brasil tem uma grande desvantagem quando comparados com outros Países de características semelhantes. Aliás, são problemas apontados a décadas por especialistas, economistas e instituições multilaterais, como FMI e Banco Mundial. O Brasil, de fato, tem menor potencial produtivo, gostemos ou não, caracterizado pelos irados níveis de “investimento em máquinas, equipamentos e obras, pela escassez de inovação, pela insuficiência do avanço tecnológico e pela carência de mão de obra em condições de operar uma economia moderna”. Para compor o quadro de forma geral, vale incorporar “pouca integração nas cadeias globais de negócios, proteção excessiva, impostos pouco funcionais, entraves burocráticos, orçamentos públicos muito rígidos e desperdício de recursos”
 
(12) “Fim das ilusões”, artigo do economista Luis Eduardo Assis, publicado no Estadão dia 16.08.21: “Não há um projeto para o País, e, se houvesse, faltaria capacidade gerencial de implementá-lo. Sobretudo, não há mais tempo. A única artimanha que pode ser tentada é a compra de votos com o mais reles assistencialismo populista.
  • A inflação bateu em 9% ao ano, a maior desde maio de 2016. 
  • A previsão de crescimento do PIB para 2022 vem declinando sistematicamente. 
  • As ameaças ao teto de gastos provocam siricutico no mercado, elevando as taxas de juros de longo prazo. Os juros de cinco anos pularam de 6% no começo do ano para 9,3% agora. 
  • O estímulo fiscal de 2021 não se repetirá no ano que vem. A previsão é de que o déficit primário atinja R$ 183 bilhões neste ano, mais do que o dobro do déficit de 2019, antes da pandemia.
  • Qual é o plano liberal que o governo tem na manga para retomar o crescimento e o emprego? Não há nenhum
  • Menor estímulo fiscal significa maior dificuldade de manter o crescimento, o que é particularmente nefasto com 14,8 milhões de pessoas desocupadas. Qual é o plano liberal que o governo tem na manga para retomar o crescimento e o emprego? Não há”. 
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