Os bastidores da travessia de uma carga superdimensionada

Publicado em
24 de Outubro de 2015
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Escoltar cargas superdimensionadas ou indivisíveis exige, devido à complexidade da operação, mais atenção e paciência (determinados veículos, nesta categoria, podem atingir o comprimento equivalente a um campo de futebol, portanto, seu deslocamento é lento: andam, em média, a 40 km/h em terrenos planos e de 5 a 10 km/h numa subida), requer muito do chamado espírito de equipe e até um certo jogo de cintura.

Tensão e adrenalina se misturam a emoções como alívio e satisfação pelo dever cumprido, atraindo o operador de trânsito IV, José Carlos da Silva, 50 anos de idade, 20 de CET, lotado no Departamento de Transportes Especiais - DTE, ligado à Superintendência de Suporte à Fiscalização – SSF.
“Somos a área especializada em acompanhar a travessia de cargas superdimensionadas e produtos perigosos que passam quase todas as noites por São Paulo enquanto a maioria dos cidadãos dorme”, explica. À frente do DTE está o engenheiro Antônio Tadeu Prestes de Oliveira (Toni), responsável por uma equipe de 33 operadores de trânsito. Das 22h00 às 6h00, eles têm muito a fazer pela segurança no deslocamento de cargas gigantes.



Operação logística conjunta
Além da CET, a operação complexa envolve a Eletropaulo, concessionárias de telefonia, rede de trólebus e TV a cabo. “Na hora H, montamos bloqueios, invertemos provisoriamente o sentido de avenidas e pontes, remanejamos placas de orientação, fios e colunas semafóricas. Tudo para permitir a passagem da carga sem danificar o patrimônio público”, conta o Engº Toni.
Em 2015, o DTE já acompanhou pelo menos cinco carretas de 32 eixos pesando mais de 500 toneladas. Em média, a cada operação, a CET utiliza cinco operadores e duas equipes de sinalização, com um custo médio ao transportador de R$ 4.000,00. No ano passado, foram feitos 731 acompanhamentos ou duas carretas superdimensionadas circulando dentro da cidade, todas as noites.

E quando ocorre o inesperado? Acidentes acontecem.
Mesmo com tanto cuidado e planejamento, acidentes acontecem. O operador José Carlos acompanhava, em 26 de maio, um conjunto transportador carregado com um transformador medindo 103,5 metros de comprimento, 6,4 metros de largura, 5,6 metros de altura e com 565 toneladas, quando a carreta quebrou na Av. Cupecê, a 150 metros antes da divisa com Diadema (destino final da escolta para a CET).
Por volta das 4 horas da manhã, houve o inesperado: “Quando a carga se soltou da unidade tratora, ouvi estouros no poste e a luz foi cortada na avenida. Só pensava em como desviar o trânsito que iria se formar no pico da manhã. Imediatamente, informei a Central de Operações, solicitei a presença do gestor da área para planejarmos e ativarmos os desvios necessários, mantive contato com a transportadora para agilizar a remoção, pedi acionamento de órgãos de apoio como SPTrans, Defesa Civil, Subprefeitura e quem mais fosse preciso e, claro, também me comuniquei com o meu chefe.”
“As pessoas pensam, equivocadamente, que a demora é culpa nossa. Mas, cabe à empresa transportadora oferecer equipamentos, peças e acessórios para a remoção do veículo que ocupa a via”, defende Toni.
O QTA se deu às 21 horas daquela mesma terça-feira. O QRU da Cupecê foi atendido por 60 agentes da CET, ao todo.

Números da Central de Operações
Balanço do DOP/GCO revela a comunicação à Central de Operações de 160 ocorrências sob o código 208 entre janeiro e maio deste ano contra 214 registros no mesmo período de 2014. Já os acidentes (código 308) somaram sete de janeiro a maio de 2015 contra oito em igual período do ano passado.



 
Cargas acompanhadas: transformadores, rotores, barcos, avião, girafas... girafas?!
 
Em entrevista, o Engº Toni relembra as travessias mais complexas e, por isso mesmo, memoráveis já monitoradas pela sua equipe.
 
Repórter: De início, que tipo de carga a CET acompanha?
Toni: Aquelas que requerem o trabalho da operação em campo, como transformadores, pequenos aviões, carros alegóricos, barcos, etc. Às vezes, é preciso andar pela contramão, passar sobre uma ponte. Aí nós entramos. 
 
Repórter: Não há risco de um transformador pesado provocar a queda de uma ponte? 
Toni: Os riscos são estudados. Há itinerários pré-estabelecidos para diferentes tipos de cargas. As pontes em São Paulo suportam até 15 toneladas por eixo. O que exceder é acompanhado por instrumentação, avaliação topográfica, com laudo de engenheiro e ART (Anotação de Responsabilidade Técnica). 
 
Repórter: Não há outro jeito de essas cargas superdimensionadas não passarem por dentro da cidade? O Rodoanel não ajuda?
Toni: O Rodoanel ajuda, sem dúvida. Contudo, no trecho Sul dele, sabia que existe uma ponte em reforma sem previsão de liberação sobre a Represa Billings que suporta somente até 200 toneladas? E há cargas indivisíveis mais pesadas do que isso. São Paulo é o polo industrial econômico mais importante do país, é a economia em movimento na travessia de cargas. (NOTA DA REDAÇÃO: DEPOIS QUE ESSA ENTREVISTA FOI CONCEDIDA, ESSE PROBLEMA FOI CORRIGIDO E JÁ NÃO HÁ MAIS RESTRIÇÕES A VEÍCULOS COM PBT ACIMA DE 213t NO TRECHO SUL DO RODOANEL)
 
Repórter: Você se lembra de alguma(s) mais estranhas que já contaram com o monitoramento da CET?
Toni: Uma vez, a carreta que levava uma aeronave ficou mais tempo na Marginal Tietê, e as pessoas perguntavam como um avião havia pousado ali. Na verdade, não houve pouso nem queda; acabara de ser comprada e estava sendo transportada, apenas isso. Já acompanhamos, também, a travessia dos rotores usados na construção da Usina de Itaipu e de enormes pás eólicas. Sobre os carros alegóricos, hoje o percurso ficou mais fácil porque algumas partes são montadas só na hora do desfile, já no sambódromo. Mas, quer saber a carga mais curiosa? Não foi nem uma, mas duas girafas.
 
Repórter: Girafas?! 
Toni: Sim, a primeira acompanhada foi em 2004, para Araraquara. A última, de 2008, ia acasalar no RJ. Sabia que uma girafa não pode ir deitada no caminhão? Se ela dobrasse o pescoço, poderia até morrer. Na carroceria, reproduzimos o habitat numa versão menor, com comida, pro animal ir se acostumando. Mas, ele não queria colaborar muito com a gente. Programávamos de partir numa noite, porém a girafa não entrava de jeito nenhum! Orientados pelos veterinários do Zoológico daqui, esperamos o tempo dela. Numa noite, entrou no caminhão, não saiu. Finalmente, partimos até o acesso à Dutra. No fim, deu tudo certo. A viagem foi inteira de pé.
 
Saiba mais sobre a legislação e regulamentação de cargas indivisíveis
 
Pela legislação vigente (Resolução 210/06 do Contran), veículos que transportam carga superdimensionada são todos com ao menos uma dessas características: mais de 4,4 metros de altura, largura superior a 2,6 metros, peso superior a 45 toneladas, comprimento excedente a 18,4 metros. Para transitar pelo município de São Paulo, devem portar uma Autorização Especial de Trânsito – AET. Por dia, o DTE emite em média 70 AETs (média diária de 2015). Em 2014, foram emitidas 13.857 autorizações dessa natureza. 
 
 
 
Quem descumpre as regras está passível de autuações registradas em fiscalizações diárias feitas pelos 33 operadores do DTE. 
 
 
        Os principais enquadramentos dispostos nessas incursões são estes:
 
 
Reportagem escrita por: Tatiane Miashiro, jornalista na CET São Paulo – MTB 33.274.
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