Já em 02/11/2015, através de um texto publicado no linkedin e de forma um pouco ingênua é verdade, eu pedia a renúncia, de seus cargos e também da vida política, da senhora Dilma e dos senhores Lula, Temer, Cunha e Renan, pois “a presença de todos eles no cenário político brasileiro atual não ajudava em mais nada, pois eles apenas trabalham em causa própria. Seja para manter o projeto de poder ou se safar da Lava Jato. Na verdade eles representam uma minoria - cada vez menor - da população brasileira e não tem quaisquer contribuições a dar a não ser se afastarem do cenário político brasileiro”.
Mais tarde, no dia 26 de março de 2016, véspera da Páscoa, eu postei no linkedin um novo texto que tinha título interessante: “A ressurreição do Brasil está na imediata realização de eleições diretas para a Presidência da República”. Naquele texto eu procurei elencar alguns dos principais motivos pelos quais, após o impeachment da presidente Dilma, o Tribunal Superior Eleitoral deveria cassar a chapa Dilma / Temer e promover eleições diretas. Relembro alguns desses motivos:
1º. No meio político, e também em alguns setores empresariais, são poucos aqueles que desejam a continuidade da Operação Lava Jato;
2º. Para a maioria dos partidos políticos a Lava Jato, após a saída da Dilma, já não teria mais “serventia”, muito pelo contrário, pois sua continuidade só iria trazer dificuldades de governança e de diálogo com o Congresso, uma vez que era muito grande e diverso o número de políticos envolvidos nos escândalos de corrupção. Para os políticos que assumiriam o poder, também a Lava Jato em nada ajudaria, posto que o novo governo ainda teria que conviver com um País conturbado e vivendo sua maior crise da história;
3º. Considerando o estágio das investigações da Lava Jato ficava cada vez mais difícil identificar – muito menos acreditar - quem não estivesse, concretamente, envolvido nesse e noutros escândalos que ainda estavam por vir. A política, de fato, estava cada vez mais desacreditada com os “políticos de plantão”;
4º. Apenas a realização do impeachment, sem novas eleições, colocaria no poder, políticos que estão diretamente envolvidos no mesmo escândalo e que, sem dúvida, iriam trabalhar para que a Operação Lava Jato, o mais urgentemente possível, chegasse ao fim. Até com discursos de que isso seria necessário para retomar o caminho da paz, da democracia e do desenvolvimento econômico;
5º. As denúncias contra a chapa Dilma / Temer, de que teria utilizado recursos desviados da Petrobrás para abastecer a campanha política nas eleições de 2014, mostravam-se inquestionáveis e indiscutíveis. Tudo o que havia sido divulgado até aquele momento tornava a condenação da chapa Dilma e Temer não só possível, mas também muito provável.
6º. O Brasil ganharia muito com isso, pois já se sabia que o Vice-Presidente da República, os Presidentes da Câmara e do Senado (sucessórios na linha presidencial) e diversas outras lideranças políticas, tanto da situação como da oposição, muito em breve estariam prestando contas à justiça.
Portanto, minha conclusão, à época, era de que somente novas eleições atenderiam, de forma objetiva, não só as reivindicações colocadas pela maioria do povo brasileiro (1), mas, também, as condições para a retomada da estabilidade política e do crescimento econômico.
Mais tarde, escrevi e publiquei dois outros textos. Um reforçando essa mesma posição (dia 25/04/16: “Impeachment e Eleições Diretas para Presidente já”) e outro comentando que o Brasil havia, por falta de coragem, conivência ou por corrupção, de nossos dirigentes e governantes, perdido o “tempo” (29/11/16: “Pode custar ainda mais caro para o Brasil, o desserviço prestado pelo TSE ao demorar tanto para julgar as denúncias contra a chapa Dilma / Temer”). Naquele momento, infelizmente, já não mais havia tempo para a realização de eleições diretas.
Também comentei nesses artigos, como agora novamente reforço, para o fato de que não havia, e ainda não há, solução fácil e sem dor para a solução dos principais problemas brasileiros. E mais: se continuarmos desrespeitando a Constituição brasileira, com decisões casuísticas, em desacordo com o que preceitua o Estado Democrático de Direito e que não atendam as necessidades da nação brasileira, notadamente os milhões de desempregados, “poderemos chegar, rápida e perigosamente, a um processo de deterioração política e social incontrolável”.
Mas a maioria de nossa classe dirigente tem um estoque inesgotável de incompreensão sobre o quê, de fato, ocorre em nosso País (2). Esse tipo de diligente ainda não entendeu que para a esmagadora maioria de brasileiros, substituir um governo de malfeitores por outro, por mais competente que seja, não é suficiente, uma vez que a continuidade das investigações da Lava Jato e outras operações que combatam a corrupção (3) também é necessária e deve fazer parte da agenda de qualquer governo que se apresente como democrático e justo.
Agora tudo ficou mais difícil, uma vez que a realização de eleições diretas já não é mais possível e a realização de eleições indiretas, com esse Congresso nada confiável continua sendo muito temerária. Adicione-se a isso, o fato de que a situação econômica ainda não está resolvida e que cerca de quatorze milhões de desempregados continuarão procurando emprego e ainda por um bom tempo.
Mas, ao nos depararmos com as novas denúncias e as novas delações, e a menos que não surjam soluções “criativas”, parece que estamos caminhando para a realização de eleições indiretas para a Presidência da República. O STF, através do ministro Edson Facchin e a pedido do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, já autorizou (18.05.17) abertura de inquérito contra o presidente Michel Temer, diante das delações e gravações de áudio feitas por Joesley Batista, do Grupo JBS. As delações são sobre eventuais pagamentos de propina para o ex-deputado Eduardo Cunha – preso deste outubro do ano passado e já condenado pelo juiz Sergio Moro a 15 anos de prisão, por crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e evasão de divisas – como uma forma de mantê-lo calado. Ainda, segundo essas denúncias, com o conhecimento e a anuência de Temer.
Infelizmente, como comentou a jornalista de política do Estadão, Eliene Cantanhêde, “a crise continua”, pois as delações dos irmãos Batista, cujos teores deverão ser divulgados ainda hoje pelo STF, também incluem, além de diversos políticos, Lula, Dilma, Renan e Serra.
Há muita controvérsia sobre essas delações, inclusive o comentário de que, entre outros motivos, elas foram aproveitadas para proteger os envolvidos na Lava Jato (4). Coincidentemente, ao contrário do que ocorreram com outras, os partidos e os movimentos que sempre se colocam como defensores de Lula e de Dilma, rapidamente as aceitaram como verdadeiras. Para eles, agora, as delações valem e são legais, o MPF e a PF fizeram um grande trabalho, as gravações são legítimas e a imprensa, principalmente a Globo, está funcionando de forma independente e imparcial. Paralelamente, as movimentações populares defendendo eleições diretas já eclodiram em todo o País. E agora, como era esperado, são os partidos de sustentação do governo Temer que questionam sobre qualidade, legitimidade, veracidade e entendimento das gravações e delações apresentadas pelos irmãos Batista.
Mesmo considerando que a transcrição do áudio tenha muitos defeitos e que as conversas apresentadas são menos “cruéis” para o Temer como anteriormente se propagandeou, tudo o que foi apresentado é grave e coloca o presidente em uma condição muito difícil (5). Mesmo que Temer não tenha participado direta e ativamente desses movimentos de obstrução da justiça, ele deveria, no mínimo, ter tomado providências a respeito. Parece que Michel Temer, político experiente, caiu numa “arapuca” e permitiu, em sua própria presença, que se realizassem, em sua casa, conversas nada republicanas. Se foi uma armadilha (6) ou não, só o tempo dirá, mas ele próprio se complicou e se deixou envolver.
Temer, em discurso feito ainda ontem, disse que não renuncia. É o seu direito. Mas, pelo que parece, foi uma decisão tomada para defender única e exclusivamente seus interesses e não os do País.
O Brasil parou novamente e a desconfiança no governo federal atual é total. Não será possível que se tomem quaisquer providências ou se proponham ou discutam quaisquer reformas, por mais simples que sejam, a partir de um governo que está em crise e com tal descrédito. A desintegração do governo, independentemente da apuração do caso, já é evidente. Partidos políticos da base de apoio já ensaiam a saída do governo, ministros já estão pedindo demissão e a população – coxinhas e mortadelas agora juntos – já está se mobilizando para o “fora Temer”. Seria possível governar com a população voltando às ruas e apenas com o apoio do PMDB, também em frangalhos e envolvido em escândalos de corrupção? A menos que algo muito extraordinário aconteça, a situação do governo Temer é insustentável.
Justamente agora que a economia começava a mostrar alguns pequenos, mas consistentes, resultados positivos, o caos está instalado novamente no Brasil. E como política e economia sempre andam juntas não há porque esperar que a economia brasileira tenha resultados diferentes. O que aconteceu ontem, no mercado financeiro e na Bolsa de Valores são apenas alguns indícios. Outros, lamentavelmente, virão.
A economista Monica de Bolle, pesquisadora do Instituto Peterson de Economia Internacional, em entrevista dada para a jornalista Alexa Salomão, no Estadão de ontem, foi clara: “não renunciar vai levar a economia para o buraco”. Aliás, ele vai mais longe: “não apenas Temer tem de sair. É preciso também tirar da linha sucessória e do governo, todos que sejam investigados na Lava Jato ou paire algum risco de envolvimento. O País precisa purgar isso”. E, num cenário mais catastrófico alerta: “Na perspectiva de corrosão institucional, se ficar como está, o Brasil caminha para virar uma Venezuela”.
Embora particularmente eu não acredite nisso, pois o Brasil conta com instituições importantes funcionando e uma sociedade civil organizada, a situação atual é muito grave e exige tomada de atitudes. Mas é fundamental, mesmo momento, que não se dê espaços para oportunistas e aventureiros populistas.
Diante desta vergonhosa situação e que tantos males vem trazendo para País, o melhor seria que o senhor Michel Temer pudesse permancecer em seu cargo de Presidente da República do Brasil até o final deste mandato-tampão (isto não quer dizer que ele não deva responder por eventuais crimes cometidos posteriormente). E, aí sim, com as eleições diretas, eleger um novo governo, democrático, republicano e que respeitando o Estado de Direito, reúna condições para trabalhar em paz e colocar em prática um projeto de convergência, no qual sejam, de fato, discutidos, analisados e equacionados os reais problemas brasileiros. Mas para isso será necessário que os novos postulantes aos cargos políticos tenham capacidade suficiente para resgatar o valor e a importância da política na vida do cidadão. A confiança na Política e na Democracia precisa ser retomada pela sociedade brasileira e esse será um dos desafios das classes dirigentes deste País.
Caso não seja possível a sustentação política do governo Temer e considerando que o TSE deverá julgar, em breve a chapa Dilma / Temer, que o STF autorizou abertura de inquérito contra o presidente e que vários pedidos de impeachment estão sendo colocados perante o Congresso Nacional, o mais conveniente, neste momento para o Brasil, seria o pedido de renúncia do Presidente, para que, via solução constitucional, um governo provisório, mesmo eleito por um Congresso desacreditado, possa levar o Brasil em bons termos até as próximas eleições. Manter a atual equipe econômica seria muito bom!
O momento atual exige serenidade, sabedoria e equilíbrio de todos os nossos governantes e dirigentes. Sem oportunismos e buscando soluções para o Brasil, despojados dos interesses pessoais individuais (como isso é difícil!), as principais lideranças brasileiras precisam acreditar na restauração da moralidade pública e no respeito ao Estado Democrático de Direito, como única forma de resgatar a confiança da sociedade brasileira na Democracia, na Política e nos Políticos.
(1) Conforme pesquisas feitas pelo Datafolha, durante as manifestações realizadas à época, em Brasília, junto àqueles que se colocaram a favor do impeachment, e consequentemente contra o governo Dilma, o vice Michel Temer não era a solução para 68% dos entrevistados que, acreditavam, realizaria uma péssima administração. 54%, inclusive, queriam o seu impeachment.
(2) “A recuperação do Brasil é difícil por si só, mas se depender de grande parte dos políticos brasileiros, ela será impossível”. Artigo publicado no Guia Portal do TRC e postado no linkein do dia 23/11/2016.
(3) “Uma pesquisa inédita conduzida pelo instituto de pesquisa Idea Big Data entre 8 a 13 de maio mostra que 56% dos eleitores não pretendem reeleger nenhum candidato nas próximas eleições, independentemente do cargo. Ao mesmo tempo, 64% das pessoas não pretendem votar em nenhum envolvido na operação Lava Jato, sejam eles inocentes ou não”. Nexo Jornal, coluna de Humberto Laudares, “Que renovação política?” 17/Mai/17. Laudares, PhD em economia, é especialista em políticas públicas e desenvolvimento.
(4) Em artigo publicado hoje n’O Globo ("Eu tô segurando as pontas"), o jornalista Merval Pereira faz essa constatação: “A ORCRIM só pensa em obstruir a Lava Jato e os grampos de Joesley Batista mostram isso claramente”. Muito do que se ouve “nas conversas entre o presidente Michel Temer e o senador Aécio Neves com o dono da JBS Joesley Batista, em momentos distintos, é uma série de crimes sendo descritos, sendo premeditados”. “E demonstram que continua em marcha uma ação no Congresso para anistiar os parlamentares acusados de corrupção na Operação Lava Jato e obstruir as investigações. E que se organize, inclusive, “uma ação de empresários para conseguir a aprovação no Congresso da anistia política, esta uma sugestão de Temer que ele pede que não seja atribuída a ele”.
(5) Segundo o Antagonista de hoje, no anexo 9 da delação premiada, Joesley Batista comenta que se reuniu com Michel Temer mais de 20 vezes, desde que se conheceram em 2010 e que diversas provas foram apresentadas para mostrar que propinas foram pagas a Michel Temer em 2010, 2012, 2014 e 2015. Há, ainda segundo o Antagonista, uma oferta de pagamentos, para Temer, equivalentes a 5% sobre os negócios que a JBS tinham no CADE. O Antagonismo publicou, inclusive, “a cronologia da propina da JBS para Temer”.
(6) Joesley Batista é o principal acionista da JBS, grupo empresarial reconhecido mundialmente e classificado como o maior exportador mundial de proteína animal. Autorizado pelo Ministério Público Federal, Joesley e sua família começarão a viver nos Estados Unidos e manterão intacto seu império agroindustrial.
Segundo a Opinião do Estadão de hoje, “Joesley Batista e outros delatores sairão praticamente livres, pagando multas irrisórias, embora tenham cometido – e confessado! – cabeludos crimes. Para honrar tão generoso acordo com o MP, o empresário saiu por Brasília a armar flagrantes, com gravador escondido no bolso, a serviço dos que pretendem reformar a política na marra”.
Ainda, segundo o Estadão: “Durante as horas que se seguiram à divulgação da existência do explosivo material, mesmo que não se soubesse o exato teor do que disse Temer, criou-se um fato político gravíssimo. A demora em tornar pública a gravação se prestou, deliberadamente ou não, a prejudicar o acusado, encurralando-o. A versão que certamente interessava ao vazador, portanto, se impôs”.
É importante não esquecer que a JBS é uma empresa, no mínimo, complicada. Já em 2013, Miriam Leitão, em seu artigo “Campões 2.0” (23.04.2013), reproduzido no livro “A verdade é teimosa – Diários da crise que adiou o futuro” (Intrínsica, 2017), comentava sobre empréstimos subsidiados – com prejuízos para o BNDES - dados ao grupo para transformá-lo em uma das maiores empresas do mundo. Ainda no último dia 17, em artigo para o Estadão, Miriam Leitão comenta novamente sobre as diversas investigações (Operações Sepsis, Greenfield e Bullish) que se fazem para apurarem os negócios e as “relações promíscuas e nebulosas entre empresas do grupo (JBS) e os órgãos do governo” durante os governos Lula e Dilma. Segundo o artigo, “o grande temor do empresário Joesley Batista era acordar uma madrugada com a ordem de prisão e a sua casa invadida”.