A questão já não é mais saber se os caminhões também se tornarão autônomos, mas sim quando isso irá ocorrer. E o que acontecerá com os motoristas? Em ambos os casos, as perspectivas são positivas. Nos Estados Unidos, já existem caminhões autônomos rodando pelas rodovias há três anos, em fase de testes, e está previsto para 2019 o lançamento do primeiro veículo comercial com essa tecnologia. Já os motoristas deverão continuar nos caminhões por muito tempo, menos ocupados com o volante, os pedais e o câmbio e mais dedicados à inteligência do transporte.
No Brasil, esses avanços devem levar mais tempo para chegar às rodovias. “A burocracia para conseguir fazer um teste em vias públicas aqui é imensa”, lamenta um dos maiores especialistas do assunto no País, o PhD em Computação Fernando Osório, do Laboratório de Robótica Móvel do Campus de São Carlos da Universidade de São Paulo (USP). Por aqui, a tecnologia está restrita por enquanto a ambientes confinados, como a agricultura e a mineração .
Os veículos autônomos prometem uma série de ganhos de produtividade, desde a ampliação do tempo em que o caminhão poderá permanecer rodando até a drástica redução no número de acidentes, já que a maioria deles são causados por fatores humanos. Considerando-se que o caminhão do futuro será inteligente para autodiagnosticar problemas mecânicos, os acidentes que não são responsabilidade humana também terão grande decréscimo.
O empenho dos maiores fabricantes de caminhões e de novos players em relação ao assunto é um bom indicador de como anda essa disputa. A Daimler, maior fabricante de veículos pesados comerciais do mundo – proprietária da Mercedes-Benz, entre outras marcas –, obteve ainda em maio de 2015 a primeira licença para circulação de um caminhão autônomo nas rodovias dos Estados Unidos, concedida pelo estado de Nevada, depois da comprovação de que o protótipo batizado de Freightliner Inspiration havia percorrido 16 mil km em testes realizados na Alemanha.
Já há modelos de caminhões fabricados no Brasil com algumas funções automáticas, como o Actros, da Daimler. O sistema de gerenciamento inteligente dos freios, que conta com um radar instalado no para-choque, permite ao motorista definir a distância mínima em relação ao carro da frente – para manter essa zona de segurança, o sistema diminui automaticamente a velocidade do caminhão. Outro recurso é o aviso sonoro que chama a atenção para mudanças de pista realizadas pelo caminhão sem prévia sinalização.
Um estudo da Economist Intelligence Unit prevê que os caminhões autônomos do futuro serão menores do que os veículos longos que circulam hoje pelas rodovias. “As entregas expressas ou o comércio eletrônico poderiam mudar para fretes menores e mais frequentes”, afirma Larry Burns, ex-vice-presidente de Pesquisa e Desenvolvimento da General Motors. Outra tendência apontada são os comboios de caminhões autônomos liderados por um veículo dirigido por um motorista humano, em testes na Europa e em Cingapura.
Recarga em movimento
O impulso decisivo dos caminhões autônomos depende, contudo, da consolidação da tecnologia dos motores elétricos em veículos de grande porte. As recargas são o grande obstáculo, pois, nas alternativas desenvolvidas até agora, as baterias dependem de um longo tempo de conexão à fonte elétrica. Em busca de uma solução, o Projeto Fabric, financiado pela União Europeia e envolvendo 25 parceiros, entre eles Volvo e Scania, trabalha na viabilidade de um sistema de carregamento das baterias em movimento, a partir de uma bobina condutora que, enterrada sob o asfalto, induz corrente elétrica nos veículos equipados com bobinas complementares.
A Tesla, empresa fundada em 2003 e que está à frente do desenvolvimento de motores elétricos, anunciou a chegada ao mercado, já no ano que vem, do seu caminhão elétrico Semi, equipado com a função Autopilot. Confortavelmente instalado em uma posição centralizada no veículo, de design futurista, o caminhoneiro deverá permanecer atento para a necessidade de algum tipo de intervenção, mas a ideia é que o veículo circule por conta própria na maior parte do tempo.
Com quatro motores independentes, abastecidos por um pacote de baterias de lítio instalado sob a cabine, o Semi terá à disposição nos Estados Unidos uma rede de recarga de alta potência, que precisa de apenas 30 minutos para proporcionar 650 quilômetros de autonomia. Assim que abriu os pedidos do modelo, cujo preço definitivo deverá ficar em torno de US$ 150 mil, a Tesla conquistou a adesão de clientes de peso, como a PepsiCo, que encomendou 100 unidades.
Um dos argumentos de venda mais fortes é a redução pela metade dos custos de operação em comparação aos caminhões movidos a diesel – o que, de acordo com Tesla, assegura o retorno do investimento em apenas dois anos. A promessa de durabilidade é outro apelo. A propaganda afirma que o caminhão foi feito para rodar pelo menos 1 milhão de milhas – ou 1,6 milhão de quilômetros.
A tecnologia dos veículos autônomos será implantada gradualmente, e isso exigirá uma transição que pode se estender ainda por uma ou duas gerações. Nesse período, os motoristas terão de lidar com um aparato tecnológico cada vez mais sofisticado – e precisam estar preparados para isso.
Atenção especial aos caminhoneiros
Os caminhoneiros sempre terão muita importância para toda a cadeia envolvida no transporte de cargas. O conhecimento que eles detêm e as decisões que tomam são fundamentais para todo o sistema – dos fabricantes de veículos aos administradores de rodovias. Um exemplo é a Arteris, que mantém diversas iniciativas voltadas à categoria que reúne cerca de 2 milhões de profissionais no País. “Vamos continuar incentivando a conscientização dos caminhoneiros”, afirma Antonio Cesar Sass, diretor-superintendente da Arteris Planalto Sul, concessionária do grupo Arteris responsável pela BR-116, que liga Curitiba (PR) à divisa de Santa Catarina com o Rio Grande do Sul.
O programa Saúde na Boleia já atendeu mais de 100 mil caminhoneiros, que passam por avaliação física e check-up médico, recebem orientação sobre alimentação e doenças, podendo ainda ser vacinados contra febre amarela e hepatite B.
A empresa investe constantemente também em campanhas de conscientização sobre a necessidade de cumprir as horas corretas de trabalho e de cuidar das condições mecânicas do veículo, especialmente no caso dos motoristas autônomos, cujos caminhões têm idade média de 20 anos, o dobro dos veículos pertencentes a transportadoras e empresas.