Estudo do WRI mostra que cidades mais acessíveis e com melhores opções de transporte possuem maiores chances de crescer nas próximas décadas
À medida que mais pessoas se mudam para as cidades, as ruas congestionadas, os deslocamentos onerosos e a falta de opções confiáveis de transporte vão afetando a economia urbana e a qualidade de vida de todos. A capacidade das pessoas de chegar aos seus empregos, escolas, atividades culturais e comércio é um importante fator econômico para as cidades. As estimativas do custo do tempo perdido nos congestionamentos já variam entre 2% e 5% do Produto Interno Bruto (PIB) na Ásia e em até 10% do PIB em Pequim e São Paulo. Com muitos projetos de infraestrutura focados na construção de ruas e viadutos, que trazem ainda mais veículos para as vias já lotadas, uma nova pesquisa do World Resources Institute (WRI) revela que cidades mais acessíveis e com opções de transporte disponíveis para todos os habitantes têm melhor chances de crescimento nas próximas décadas.
O novo estudo do WRI, From Mobility to Access for All: Expanding Urban Transportation Choices in the Global South, foi lançado durante a cúpula do Fórum Internacional do Transporte no dia 23/05, em Leipzig, na Alemanha. Ao utilizar uma nova abordagem para identificar quais moradores estão mal atendidos em questões de transporte, o documento apresenta uma análise realizada em duas cidades para ilustrar como o acesso a oportunidades e transporte estão estreitamente ligados.
A pesquisa constatou que, em Joanesburgo, na África do Sul, um residente médio tem acesso a 49% dos empregos em até 60 minutos de deslocamento ao utilizar qualquer modo de transporte. Já na Cidade do México, o residente médio tem acesso a apenas 37% dos empregos. Poucos habitantes nas duas cidades – entre 7% e 9%, respectivamente Joahnaesburgo e Cidade do México – têm acesso fácil a empregos e paga pouco pelos deslocamentos.
O WRI recomenda duas amplas mudanças: melhores opções de transporte que conectam pessoas a empregos e oportunidades, e foco na redução da quantidade de tempo e dinheiro que todo mundo gasta diariamente nas cidades.
"O declínio das densidades e a crescente expansão urbana, somadas ao aumento do uso de veículos particulares e a falta de opções de transporte confiáveis e acessíveis, dificultam acessar locais que precisamos diariamente", afirmou Anjali Mahendra, co-autora do relatório e diretora de Pesquisa no WRI Ross Centro para Cidades Sustentáveis. “As cidades tem que deixar de priorizar um tráfego mais rápido e que acomoda mais veículos para privilegiar o acesso de todos, e isso exige uma integração muito mais forte entre as agências de planejamento de transporte e o planejamento urbano.”
Das 2,5 bilhões de pessoas que irão se mudar para as cidades nas próximas três décadas, 90% estarão na Ásia e na África. À medida que a renda aumenta nessas regiões, a posse de carros e motos aumenta rapidamente. Em 2010, eram 2,5 novos registros de veículos motorizados a cada criança nascida na América Latina e três novos veículos a cada nascimento na Índia.
Em muitas cidades, se deslocar para o trabalho, escola, consultas médicas ou atividades de lazer exige caminhadas extensas ou perigosas, longas esperas por serviços mal conectados em locais inapropriados ou viagens caras em veículos inseguros e desconfortáveis. O estudo, que faz parte do World Resources Report, Towards a More Equal City, constata que o acesso restrito afeta tanto as comunidades de baixa renda espalhadas pelas cidades (a população "abandonada" e mal atendida) quanto as de baixa-média renda nos bairros residenciais e periféricos que usam carros particulares, motocicletas e transporte informal em longos e congestionados deslocamentos.
Repensar as ruas, seus usos e realizar adaptações para transformar as vias em locais mais seguros é importante para promover acessibilidade. A criação de faixas exclusivas para o transporte coletivo, de espaços dedicados a veículos não motorizados e a abertura de ruas apenas para pedestres têm tido bons resultados em cidades como Bogotá, Cidade do México e Buenos Aires. Essas ações também já obtiveram efeitos expressivos em São Paulo, com a redução das velocidades. Entre 2014 e 2016, São Paulo apresentou uma queda de 32% nas mortes no trânsito e de 33% na taxa de pessoas feridas devido a redução de velocidade de 50 km/h para 40 km/h em áreas com grande circulação de pedestres e de 60 km/h para 50 km/h em vias arteriais e expressas.
Além disso, uma rede multimodal e integrada orientada para o usuário oportuniza acesso a mais lugares da cidade, atendendo as necessidades de deslocamento das pessoas. Novos modelos de transporte baseados em dados abertos, veículos compartilhados e soluções digitais são chave para remodelar a mobilidade das cidades. A eficiência dessa rede é ainda melhor quando há uma restrição no uso de veículos privados, que gera mais espaço para outros modos de transporte. A taxação de congestionamento e limitação de estacionamentos são algumas iniciativas que podem inibir o uso de veículos privados e incentivar o uso do transporte coletivo.
“Há conhecimento técnico no Brasil para executar essas medidas, o que falta é uma combinação de liderança política e engajamento da comunidade na identificação e implementação dessas recomendações. Muitas cidades não vislumbram ainda todos os ganhos que a acesso mais amplo aos lugares pode gerar. Isto diz respeito a facilitar o acesso a empregos, serviços e outras oportunidades. Quando o cidadão prospera, a cidade toda ganha”, aponta Luis Antonio Lindau, diretor do programa de Cidades do WRI Brasil.