Nova lei, frete e pressão por prazo motivam uso de drogas nas estradas

Publicado em
01 de Outubro de 2015
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Causas são apontadas por caminhoneiros e autoridades de SC e PR. Relatos foram exibidos em duas reportagens especiais no RBS Notícias.

A mudança da lei que permite uma jornada maior de trabalho, a pressão das empresas por prazos e o preço do frete são fatores apontados por caminhoneiros e autoridades para o aumento do consumo de drogas por motoristas que trafegam nas rodovias do país. Foi o que mostrou a segunda reportagem especial do RBS Notícias nesta sexta (25) (veja no vídeo acima).

Para cumprir os prazos e receber a renda integralmente, caminhoneiros têm usado cada vez mais estimulantes e drogas, como a cocaína e o crack, como mostrou a primeira reportagem especial, exibida na quinta-feira (24). Nos depoimentos, profissionais admitem que ficam até 15 dias sem dormir.

Confira a 1ª reportagem

Sem a droga e estimulantes,  motoristas garantem que a renda cairia pela metade. "Só se aumentasse o valor do frete, se tu tivesse um local de parada", diz um dos caminhoneiros ouvidos pela equipe de reportagem que percorreu, durante quase um mês, cerca de 2 mil quilômetros de rodovias federais em Santa Catarina e no Paraná.

“Se tu não trabalhar, vem outro trabalhar no teu lugar que faça o horário, que não pára. O caminhão tem que rodar, faturar”, relata outro motorista.

"O patrão não compra três caminhões porque um faz o serviço de três andando", garante mais um motorista ouvido pela reportagem.

Segundo Luiz Graziano, chefe de comunicação da Polícia Rodoviária Federal em Santa Catarina, muitas empresas têm conhecimento do consumo de drogas de motoristas. "Nós temos denúncias de que algumas empresas transportadoras ou fecham os olhos ou compactuam também dessa prática".

 

Perigo nas estradas
Uma pesquisa do Ministério Público do Trabalho do Mato Grosso do Sul mostrou que, de cada três caminhoneiros que trafegam nas rodovias, há risco de pelo menos um estar drogado.

Além de colocar em risco a própria vida, os motoristas drogados significam um grande perigo para quem trafega nas rodovias. Segundo a Polícia Rodoviária Federal, em 2014 aconteceram pelo menos 5.397 acidentes com caminhões nas rodovias federais de Santa Catarina. Isso representa 30% de todos os acidentes registrados ano passado.

Nessas batidas, morreram 237 pessoas, o equivalente a 44% de todas as mortes registradas em 2014.

Mudança da Lei
"Pra mudar o rebite, acho que tem que mudar o Brasil", afirma um caminhoneiro. Foi o que tentou uma lei criada em 2012 para controlar o tempo dos motoristas nas estradas e dificultar o uso de drogas. Segundo o procurador, esta lei visava proteger o motorista em cima de três pilares: controle da jornada de trabalho, a garantia de uma remuneração digna e a vedação do pagamento por comissão.

Mas em março de 2015, uma nova lei passou a permitir que o motorista dirija até 12 horas por dia, o pagamento de comissão e o fim do pagamento do tempo de espera, como por exemplo, o tempo parado para descarregar a mercadoria.

"Hoje nós temos uma nova lei que legitima a desproteção que, sem nenhum exagero, escraviza o motorista brasileiro", diz o procurador Paulo Douglas de Moraes, do Ministério Público do Trabalho do Mato Grosso do Sul.

Já para Pedro Lopes,  presidente da Federação das Empresas de Transporte de Cargas e Logística de Santa Catarina (Fetrancesc), a mudança da lei ocorreu porque veio a pressão de algumas áreas da economia brasileira, especialmente do agronegócio, "que achava que o caminhão tinha que andar mais, principalmente no pico da colheita",  garante ele.

Mas ele defende a categoria e diz que falta fiscalização nas rodovias. "Tem o motorista profissional que atende às empresas e tem o motorista autônomo. Esses estão vulneráveis na estrada. Eles andam porque têm que pagar a prestação do caminhão e sustentar a família.  No momento que isso vai lá pra estrada, foge do controle de todos nós. E aí são as autoridades que devem ter responsabilidade de fazer esse controle nas estradas".

Responsabilidade
Para a mulher de um caminhoneiro ouvida pela equipe de reportagem, não é só uma questão de lei. Para ela, quem contrata esse tipo de mão-de-obra também precisa assumir parte da responsabilidade. "Ele [marido] fala pra mim quando eu chamo pra ele vir embora, que ele não pode vir porque ele tem que atingir a meta. Se não fizer, o salário dele cai em 40%", desabafa.

"Primeiro grande problema é que o Brasil quer resolver os problemas mudando lei. A responsabilidade é de todos. O sistema todo hoje ele é falho. Hoje nós nao conseguimos fiscalizar, não conseguimos punir. Todo o sistema contribui para que essas pessoas busquem uma alternativa econômica nas drogas", afirma Luiz Graziano, inspetor da Polícia Rodoviária Federal em Santa Catarina.

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