"Não basta um terminal, é preciso rodovias, ferrovias..."

Publicado em
15 de Agosto de 2013
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Renato Barco, presidente da Companhia das Docas do Estado de SP, diz que a atividade portuária é uma das mais difíceis de se desenvolver.

Enquanto o Porto de Santos enfrenta dificuldades de acessibilidade, outros, mais novos, carecem de demanda. Para ele, a saída está no Plano Nacional de Logística, que precisa acelerar a integração dos portos a rodovias e ferrovias. A urgência em implementar esse plano, afirma, é essencial para que projetos como o Porto de Açu sejam bem sucedidos.

O que a MP dos Portos muda na vida do Porto de Santos? Quais planos estão sendo traçados hoje em decorrência disso?

Não prevemos um impacto muito grande. Sabemos onde queremos chegar, com a medida provisória ou sem ela. Tudo isso nos remete ao nosso plano para 2024, quando movimentaremos 230 milhões de toneladas. Em 2013, temos a expectativa de bater a meta de 110 milhões de toneladas. Ou seja, em 12 anos, queremos dobrar nossa capacidade. Agora se inicia uma nova fase concorrencial, mas ainda é muito cedo para saber como será o futuro da atividade no porto em decorrência disso. Até porque ainda está sendo pensada a regulamentação da lei. Não sabemos como serão as regras dos portos privados.

Mas o senhor, e outros presidentes de portos, foram consultados sobre a MP?

Nos ativemos às questões dos investimentos. A questão jurídica foi toda pensada pelo governo federal, sem a interferência das companhias.

Os portos privados podem "roubar" cargas dos públicos?

Dentro desse mesmo plano, aferimos que nossa capacidade de movimentação de contêineres alcançará 11 milhões de TEUs (unidade equivalente a um contêiner de 20 pés). Mas nossa projeção é de uma demanda de 9 milhões de TEUs, muito maior do que há hoje. Estabelecemos uma folga razoável, mas com um grande crescimento. Não sei se parte disso será "roubado" pelos portos privados. É preciso calma, pois a maturação deste mercado virá com o tempo.

A meta de movimentar 320 milhões de toneladas é viável? Este ano, com a supersafra foram registrados inúmeros problemas.

Sim. Isso nos obrigou a tomar medidas de ordem práticas para reduzir os problemas. Outras, demandam tempo até saírem do papel. Temos problemas de acessibilidade. Isso é claro.

Investimentos recentes em portos têm enfrentado muitas dificuldades para emplacar, caso do porto de Açu. A viabilidade de um porto é tão difícil assim de ser conquistada?

Não é para um porto como o de Santos. Temos a felicidade de estarmos localizados no carro-chefe, na locomotiva do país. Além de estarmos em um estado com uma demanda incrível, há altíssimo valor agregado. Se temos problemas de infraestrutura para atingir nossos objetivos, imagino que portos mais afastados tenham problemas ainda maiores. Isso faz com que, em muitas vezes, a carga que deveria fluir por outros locais, flua por Santos.

O Plano Nacional de Logística, que determinará a política portuária, tem que se preocupar com a infraestrutura desses locais. Não adianta apenas colocar um terminal em uma área inóspita. Agregado a esse terminal, são necessárias ferrovias, rodovias e uma área desenvolvida. Um país que quer crescer precisa desenvolver novas regiões.

Falta integração entre o porto e os governos federal e estadual para mitigar esta questão?

Acho que há muitas dificuldades em transferir a produção para outros portos, que não o de Santos. Nossa interlândia primária fica a mil quilômetros de distância, em um canal que converge tudo para cá. Não seria o momento de criticar alguma esfera do governo, pois todos estão respondendo às demandas. O porto está fazendo sua lição de casa, o estado e o governo federal também.

Temos projetos, como o Ferroanel, que facilitarão o escoamento, não só da safra, mas da produção industrial. A carência é tão grande, que as obras caem no esquecimento. Agora nós estamos em licitação para construir outro trecho da Avenida Perimetral, no Guarujá. Também há um processo para obra do Mergulhão, que irá revitalizar a área que compreende do armazém 1 ao 8. Para a cidade, será muito positiva, trará Santos para perto do porto.

A lição de casa está em dia, mas há problemas de armazenagem...

Temos uma capacidade de armazenamento de grãos e açúcar que ultrapassa 2 milhões de toneladas. O que agrava o problema é a chegada simultânea de toda essa carga. Mesmo assim, conseguimos fazer com que todos os navios fossem atendidos. Podemos até melhorar a armazenagem no porto, mas a questão é qua faltam áreas de armazenagem na origem. Os produtores têm limitações e, em muitas situações, fazem dos caminhões ou dos vagões seus armazéns. Tudo fica estocado na Cônego Domênico Rangoni (rodovia que é o principal acesso ao porto).

Qual a responsabilidade do porto nessas filas, estejam na terra ou no mar?

Percentualmente, é difícil dizer. Há muitos navios ao largo querendo atracar, mas muitos deles vêm sem programação. É uma quantidade incompatível, até mesmo injusta, com a capacidade de atracação. Por outro lado, os terminais têm suas responsabilidades em relação a investimentos em equipamentos compatíveis com a alta performance. O porto, digo, a Companhia das Docas, tem como sua responsabilidade cuidar da dragagem, dar condição para que os navios circulem e atraquem no porto.

Falta uma organização maior fora do terminal portuário, em relação a agendamento de horários, por exemplo?

Não adianta chegar uma carga de 10 mil toneladas, quando a capacidade é de 5 mil. Pedimos a colaboração de exportadores e importadores, que ao mandar uma carga dessas, consultem os terminais para ter conhecimento de seu local na fila. Hoje, temos um controle muito bom, mas tudo feito de forma manual.

Como vê a evolução do porto?

Quando cheguei, ele só ia até o terminal 35. Era muito menor que hoje. Vi a expansão para a margem do Guarujá e a criação do corredor de exportação. Depois, ficamos muitos anos sem vermos grandes obras do governo federal para o seu crescimento. Com o renascimento da Secretaria Especial de Portos, isso foi retomado. Foi feito o plano nacional de dragagem, que contemplou o porto de Santos. O que necessitamos agora são de obras que melhorem a logística, os gargalos rodoferroviários no entorno do porto.

Há uma área na margem do Guarujá habitada por uma comunidade carente. Isso restringe o investimento?

É uma pedra no sapato. Se de um lado você tem famílias, que requerem cuidados, há uma área fronteiriça que poderia ser aproveitada. Eles não vivem divinamente e nós não conseguimos construir mais terminais. Serão necessárias intervenções do governo federal, do Ministério das Cidades, para tirar estas famílias de lá.

Como é ser meio empresário, meio gestor público?

É difícil para o Renato Barco empresário entender as mazelas de uma empresa pública. Há coisas com as quais você é obrigado a conviver. Vacilos podem ser irreversíveis em uma empresa pública, podem manchar até o seu CPF.

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