Depois de enfrentar os constantes transtornos na fiscalização em razão da altura inadequada para o transporte de gado, os caminhoneiros do setor contam agora com uma importante decisão do governo federal que corrigiu o problema. Uma deliberação do Conselho Nacional de Trânsito (Contran) aumentou em 30 centímetros a altura máxima desse tipo de veículo usado no deslocamento e locomoção de animais vivos, também conhecido como caminhão boiadeiro. Com a medida, o tamanho agora dessas carretas passou de 4,40 para 4,70 metros.
A elevação dessa altura só foi possível graças à Deliberação nº 177 publicada no dia 12 de dezembro no Diário Oficial da União. A iniciativa ocorreu após representantes dos caminhoneiros recorrerem ao Ministério da Infraestrutura e ao Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) para pedir uma regulamentação rápida para o segmento. A reivindicação da categoria recebeu o apoio dos frigoríficos. Líder na produção dessas gaiolas de transporte, a Carrocerias Boiadeiro sempre lutou por essa alteração, por considerar mais adequada para transportar equinos e bovinos.
Com a simpatia dos dois órgãos governamentais, a medida também dispensa a emissão de Autorização Especial de Trânsito (AET) para esse tipo de veículo. Na prática, a decisão por parte do governo resolveu de vez com a falta de regulamentação acerca do tamanho do caminhão boiadeiro que faz esse tipo de serviço, sobretudo, o de dois andares. A nova deliberação do Contran fez alterações à Resolução nº 675/2017, sobre o transporte de animais de produção ou interesse econômico, esporte, lazer e exposição.
Mas antes dessa alteração feita no fim de 2019, uma outra regulamentação também do Denatran determinava que o caminhão boiadeiro com dois pisos não podia passar dos 4,40 metros. Ou seja, a medida contradizia a própria Resolução nº 675/2017. Dessa forma, os veículos de carga do segmento não conseguiam atender o tamanho certo dos animais que eram transportados para as diversas regiões do país.
O impasse dessas carretas se arrastava desde 2016, quando houve a primeira tentativa de regulamentar a altura de uma carreta boiadeiro. Naquele ano, o deputado federal Zé Silva (SD-MG) apresentou o Projeto de Lei 6392, que ainda está em tramitação na Câmara. Até o ano passado, a proposta já estava pronta para ser votada, após passar pelas comissões. Porém, a demora na análise levou os caminheiros fazerem a reivindicação junto ao governo.
Altura já usada na prática
Apesar de até então proibido, muitos transportadores já trabalhavam com caminhões boiadeiro na altura de 4,70 metros sem a liberação pelo Contran para dar mais condições adequadas no deslocamento dos bovinos. O especialista de bem-estar animal da Friboi, o médico veterinário Everton Andrade, explica que havia a necessidade de aumento na altura desses veículos de carga de dois andares. Segundo ele, isso é uma avaliação de toda a cadeia produtiva – fazenda, transporte e frigorífico.
Andrade esclarece que o tamanho reivindicado no caminhão boiadeiro era necessária em razão da ocorrência de lesões, sobretudo, nas raças zebuínas, que costumam ser mais altos de 1,60 metro. Esse tamanho costuma ser o espaço para os bois nas carretas de dois andares, com a altura antiga da carroceria.
Prova disso, um levantamento feito pelo Grupo de Estudos e Pesquisas em Etologia Animal (Etco), 63% dos 4.235 machos zebuínos enviados para abate à planta da Friboi em Diamantino (MT) tinham altura superior a 1,60 metro do cupim ao chão. Ou seja, deixa pouco espaço em relação ao teto do caminhão boiadeiro. Isso pode gerar estresse e contusões durante o transporte. Em muitos casos, há o alto risco desses animais se machucarem devido “aperto do cupim” contra a parte de cima do compartimento durante o transporte.
“Essa altura máxima de 4,70 metros é a mais adequada no ponto de vista técnico, econômico e, principalmente em relação aos animais. Trata-se de uma conquista decorrente do esforço de vários profissionais para reformular as regras de transporte de gado. A medida beneficia toda a cadeia produtiva, pois favorece o bem-estar dos bovinos, tanto no embarque, viagem e no próprio desembarque”, avalia o especialista.
Andrade ressalta ainda que a ampliação da altura das carrocerias do caminhão boiadeiro reduz a ocorrência de hematomas nas carcaças dos bois. “Essa incidência causa prejuízo tanto para a indústria quanto para os pecuaristas. Esse aumento no tamanho contribui para a melhoria da qualidade da carne brasileira”, complementa.
Produção e adaptação das gaiolas
As fabricantes de implementos rodoviários usados no transporte de gado têm apoiado a medida de aumentar a altura para prezar o melhor deslocamento desses animais. Líder do segmento, a Carrocerias Boiadeiro já começou a produzir com o tamanho de 4,70 metros. Além disso, a montadora também efetua as adaptações necessárias para o caminhão boiadeiro antigo atender a nova dimensão estabelecida.
“Hoje a nossa fábrica está preparada para fabricar com as novas alturas e reformar as carretas boiadeiro menores que precisem de ajustes”, explica Luiz Roberto Marin, gerente da Carrocerias Boiadeiro. A empresa fabrica implementos há mais de 50 anos.
O executivo conta ainda que a companhia acompanhou toda evolução da pecuária nacional durante sua existência. Na sua avaliação, houve um aprimoramento genético do rebanho, o que resultou ganhos de peso e de altura. “O padrão de 4,40 m de tamanho do caminhão boiadeiro ficou defasado, daí veio a luta para adequação da legislação para 4,70 metros juntamente com parceiros de transporte e frigoríficos”, completa Marin.