MP permite que Correios disputem mercado de logística comercial

Publicado em
12 de Abril de 2010
compartilhe em:

O planejamento estratégico dos Correios para os próximos anos prevê uma revolução. A Medida Provisória (MP) que o governo deverá publicar nas próximas semanas abre espaço para a estatal começar a operar em serviços de logística comercial, onde hoje operam gigantes internacionais como Fedex, DHL e UPS, e empresas nacionais como Cometa, TNT, TAM Cargo e VarigLog.

Segundo o presidente da Empresa Brasileira de Correios (ECT), Carlos Henrique Custódio, se permanecer apenas nas áreas em que tem monopólio, como cartas e informes bancários, a empresa terá valor econômico praticamente nulo dentro de algum tempo e passará a apresentar déficit que exigirá dos cofres públicos uma quantia bilionária todos os anos, como já ocorre nos Estados Unidos e em diversos países da América Latina, levando ao fechamento de muitas estatais.

Para enfrentar esse cenário, nos últimos três anos a ECT elaborou um novo plano para diversificar sua atuação em logística, usando a infraestrutura que possui e principalmente sua capilaridade. As estratégias vão desde intensificar a atuação na entrega de mercadorias compradas por meio eletrônico até vender serviços financeiros como seguros e títulos de capitalização, usando os carteiros que sobem e descem as ruas do país todos os dias. Para isso, Custódio conta com a aprovação da MP que tem, entre seus principais dispositivos, transformar a ECT em uma sociedade por ações (SA). A empresa poderá ter subsidiárias sozinha ou também com sócios privados.

Custódio confirmou que os Correios têm interesse em montar, com a iniciativa privada, uma empresa aérea, conforme publicou o Valor no início do mês. Recentemente, a ECT sofreu seguidos contratempos com a quebra de aviões de pequenas companhias aéreas que lhe prestam serviços. Algumas delas têm menos de cinco aeronaves, o que compromete grande parte do potencial das empresas. Os principais fornecedores no setor aéreo aos Correios hoje são: Total, Airbrasil, Rio, Trip, Gol, TAM, VarigLog, NTA, ABSA e Webjet.

Com os problemas de algumas dessas empresas, entregas em todo o país têm sofrido atrasos. A ECT gasta, em média, R$ 400 milhões por ano com serviços aéreos. Com a empresa própria, teria mais segurança sobre o funcionamento dessa malha, podendo ter mais aviões de reserva, exemplifica o seu presidente.

O formato dessa empresa ainda será definido, mas estima-se que os Correios terão 49% das ações e a outra empresa, que contaria com apoio inicial do BNDES, teria 51% da participação, ou seja, o controle acionário. O modelo societário ainda não foi definido, mas poderá ser uma Parceria Público Privada (PPP), uma joint venture ou ainda outro formato.

Os Correios possuem, atualmente, cerca de R$ 4 bilhões em capital. Até há alguns anos, esse patrimônio permitia à empresa um certo conforto porque sua receita financeira era bastante elevada com a remuneração de juros. Nos últimos anos, porém, a ECT passou a ter mais dificuldades, mas ainda se mantém no azul. O número de correspondências carregadas pela empresa caiu em 1 bilhão nos últimos cinco anos, o que representa R$ 700 milhões a menos na receita, por ano. "Precisamos ter uma melhor configuração porque é claro que o volume de cartas cai significativamente, principalmente de uma pessoa física para outra."

Custódio destaca que, apesar da queda na demanda dos Correios, a infraestrutura da empresa tem pouca elasticidade. Por ser uma estatal, a ECT não pode demitir livremente, por exemplo.

Nos últimos anos, o USPS, o correio americano - que tem monopólio mais abrangente do que o da ECT no Brasil -, demitiu milhares de pessoas e estuda entregar correspondências apenas em três dias por semana. Mesmo assim, o USPS exige bilhões de dólares do governo dos EUA todo ano para cobrir o déficit, observa Custódio.

No Brasil, em 2008, entre impostos e dividendos, a ECT ainda rendeu R$ 2 bilhões ao governo.

Para Custódio, há grandes chances de os Correios serem competitivos ao concorrer com as empresas privadas de logística. "Eles atuam só no filé mignon", afirma o presidente da ECT, referindo-se à presença maior das empresas no Sudeste, onde estão 85% do faturamento da ECT. Já foram mapeados cerca de 2 mil concorrentes da estatal nesse mercado - de empresas de motoboys a aéreas - mas, para ele, a capilaridade da estatal garante a competitividade mesmo nos novos serviços. Não haveria custo maior para esses serviços de mão de obra ou transporte, por exemplo, já que os carteiros e os aviões dos Correios poderão ficar ociosos com o tempo. "Com a MP, vamos até continuar a crescer, porque hoje ninguém faz o que a gente faz e ninguém consegue fazer logística mais barato."

Um dos serviços que Custódio quer intensificar é o de assistência técnica de produtos, buscando-o na casa do cliente e levando-o para a empresa responsável. Esse serviço, chamado de logística reversa, já é adotado em fase preliminar para aparelhos celulares.

Segundo Custódio, transformando-se em uma estatal SA, como hoje são Petrobras e Caixa Econômica Federal, por exemplo, os Correios buscarão novos critérios de governança corporativa. A estatal foi o gatilho da maior crise política enfrentada pelo governo Lula, o Mensalão.

Custódio descarta a abertura de capital da estatal, mas assegurou que, como SA, a ECT vai buscar maiores padrões de governança corporativa, como publicar balanços periódicos e ter maior responsabilidade social. "Apesar do risco econômico, sempre teremos um importante papel estratégico e social por nossa presença em todo país."

Plano é receber arquivo digital, imprimir e entregar 

Os Correios usarão sua presença em todas as cidades do país para criar nos próximos anos o chamado "correio híbrido", sistema de entrega de mensagens que circulam de forma eletrônica e são impressas em região próxima de onde está o destinatário. O presidente dos Correios, Carlos Henrique Custódio, explica que esse serviço deverá auxiliar principalmente bancos, porque eles costumam imprimir suas correspondências em poucas regiões do país. Hoje, por exemplo, a Caixa Econômica Federal imprime no Sudeste todos os extratos de FGTS que envia a todo o Brasil.

Custódio considera até uma parceria futura com a Federação Brasileira dos Bancos (Febraban). "Em vez de a empresa precisar postar em uma agência dos Correios dez dias antes do vencimento da fatura, ela faz isso eletronicamente com dois dias de antecedência e nós entregamos para uma central qualquer", afirma Custódio. Além disso, ele comenta que o serviço será uma desoneração ao banco, à medida que reduzirá custos de frete.

A ideia é espalhar impressoras pelo país, para que as faturas ou extratos bancários não tenham de percorrer a maior parte do território nacional para ser entregues. Os bancos enviarão um arquivo digital com a fatura para que os Correios imprimam no local mais próximo do destinatário. Esse sistema existe na Europa, diz Custódio, para quem a medida coloca a ECT no mundo digital.

Entretanto, isso pode ameaçar o projeto similar da Febraban, o Débito Direto Autorizado (DDA), recentemente lançado, pelo qual o devedor se cadastra em seu banco para receber as faturas pela internet. Custódio afirma que, dependendo da forma como se der o processo, o DDA poderia até mesmo ser reformulado: "Talvez o DDA possa até deixar de existir e a gente possa fazer uma parceria com a Febraban", disse.

Custódio é ligado ao setor bancário, onde fez carreira e chegou a ocupar cargos de alto escalão na Caixa e também atuou na Febraban. "Lá na frente, quando a certificação digital for uma obrigatoriedade, ninguém melhor do que os Correios para comercializá-la. Você comercializa a certificação e dá a entrega do e-mail de graça", diz. Segundo ele, esses planos dos Correios precisam começar a ser formulados agora, quando a instituição depende muito do papel. "Se não entrarmos nesses novos negócios, em novas tecnologias, vamos acabar", diz.

Boletim Informativo Guia do TRC
Dicas, novidades e guias de transporte direto em sua caixa de entrada.