É dramática a situação das rodovias privatizadas por Dilma Rousseff. Nem mesmo a Lei nº 13.448, de 2017, que serve como uma luva para destravar investimentos nas ferrovias, soluciona o impasse. Sem dinheiro e sem o prometido crédito do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), as concessionárias suspenderam os investimentos na duplicação das estradas, estimados em mais de R$ 30 bilhões pela Associação Brasileira das Concessionárias de Rodovias (ABCR). Essas operadoras correm o risco de serem obrigadas a devolver as estradas ao governo por não cumprirem os contratos.
Das seis rodovias leiloadas na chamada 3ª etapa — BR-163/MS, BR-163/MT, BR-040/DF/GO/MG, BR-060-153-262/DF/GO/MG, BR-153/GO/TO e BR-050/GO/MG —, apenas a MGO Rodovias, empresa responsável pelas obras da principal ligação do Distrito Federal com São Paulo, a BR-050, está com o cronograma em dia. As demais, que cruzam o Centro-Oeste e escoam grande parte da produção agrícola do país, paralisaram os investimentos em duplicação. Uma delas, a Via 040, da Invepar, cogita usar o expediente de devolução amigável previsto na lei. Na BR-153, a concessão caminha para caducidade.
A paralisação das obras tem impacto direto no emprego. O caminhoneiro José Jorge de Campos Abreu, de 64 anos, que há três terceiriza o serviço para a MGO, diz que recebe hoje cinco vezes menos do que há cinco anos. "Mas eu tenho que agradecer, porque meus colegas, que trabalhavam para as outras concessionárias, estão sem receber e parados", diz.
O presidente da ABCR, César Borges, explica que o cenário econômico mudou após os leilões, realizados em 2012 e 2013. "Houve uma queda de 30% no tráfego por causa da crise, e o BNDES restringiu o financiamento. Concedeu o empréstimo ponte, mas, na hora de dar o definitivo, reduziu de 70%, como estava previsto, para 40%", diz. As companhias ficaram sem capital. E a MP das Concessões, convertida na lei nº 13.448, não contempla as rodovias. "O atual governo não entendeu o caso. E criou uma lei que prevê a devolução das concessões, mas não especifica como será feita a indenização dos investimentos feitos até agora", lamenta Borges. Procurado, o BNDES não comentou o assunto.
A especialista em concessões de rodovias Letícia Queiroz de Andrade, sócia do Escritório Queiroz Maluf, revela que nem todas as companhias querem devolver as concessões. "A ampla maioria quer mudanças no contrato para readequação do equilíbrio econômico-financeiro", explica. A questão é que os problemas estão se acumulando, sem que o governo faça alguma coisa, o que obriga a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) a pressionar pela caducidade das concessões, já que as obrigações contratuais não estão sendo cumpridas.
"O problema da 3ª etapa é que obrigava a duplicação dos trechos nos primeiros cinco anos. Nenhuma concessionária, sem financiamento, conseguiu cumprir. Na MP das Concessões apareceu um artigo que dava poderes à ANTT para postergar essa obrigação para 12 anos ou por meio do conceito de necessidade, conforme a demanda. No momento da aprovação da MP, esse artigo caiu", diz Letícia.
Solução
O governo vem prometendo uma solução, por meio de uma MP específica para as rodovias. Uma fonte do Ministério dos Transportes diz que ela está em elaboração, mas não há prazo para ser editada. "Estamos em compasso de espera. O governo precisa lançar logo uma MP para as rodovias", ressalta Borges, da ABCR. Letícia estima que as empresas não aguentarão mais que três meses. "A MP ainda precisa ser formulada, aprovada, virar lei e depois ser regulamentada. Tudo isso tem um prazo e há concessões em que já está configurada a caducidade”, assinala.
Em 26 de junho, a ANTT recomendou ao Ministério dos Transportes a decretação da caducidade do contrato de concessão da BR-153/GO/TO, sob responsabilidade da Galvão. A pasta diz que "o processo encontra-se em análise técnica e jurídica". Sobre as demais concessões, o ministério afirma que ainda não há proposta de caducidade. "Embora se observe atrasos na execução das obras, eles podem ser ajustados pela ANTT, no cálculo do reequilíbrio econômico-financeiro", afirma, em nota.
"Estamos em compasso de espera. O governo precisa lançar logo uma MP para as rodovias" —César Borges, Presidente da ABCR
O que diz cada operadora
» O Grupo CCR, controlador da CCR MSVia, da BR-163/MS, informa que protocolou na ANTT um pedido de revisão contratual e comunicou a suspensão das obras de duplicação. "A proposta da empresa é rediscutir as bases do contrato à luz das dificuldades atuais, como atraso em licença ambiental e mudança das bases para financiamento do empreendimento pelo BNDES e pela Caixa, reduzindo de 70% para 40% o montante financiado". A empresa diz que o governo demorou um ano a mais do que o previsto para liberar as obras.
» A Via 040, concessionária do trecho entre Brasília (DF) e Juiz de Fora (MG) da BR-040, conta que investiu, desde 2014, R$ 1,78 bilhão em obras e que já duplicou 73 km. "A licença ambiental, uma obrigação contratual por parte do governo, foi liberada somente em 13 de abril, com mais de dois anos de atraso. "A demora impactou o projeto da concessão, alterando custos, cronogramas e a mobilização de frentes de obras", justifica. A Via 040 protocolou em maio pedido de revisão do contrato e avalia as possibilidades da lei 13.448/2017.
» A Triunfo Concebra informa que, desde que assumiu a concessão da BR-060-153-262/DF/GO/M, em 2014, tem trabalhado dentro dos parâmetros de atendimento do seu contrato com a ANTT e que é do interesse da empresa seguir com o cumprimento do contrato. Entretanto, se for possível a reprogramação das obras utilizando a real necessidade econômica-financeira das duplicações com consequente repactuação dos prazos, possivelmente não será necessária a utilização da Lei 13.448.
» A Rota do Oeste, concessionária da BR-163/MT, afirma que entregou o equivalente a 26% da obrigação total das obras de duplicação, que é de 453 km. "No entanto, o financiamento de longo prazo para o projeto até o momento não foi aprovado, o que inviabilizou o início da segunda etapa do projeto, ainda no ano passado". Nos primeiros cinco anos, estavam previstos R$ 3,9 bilhões em investimentos. "O projeto é econômica e financeiramente viável. Portanto, neste momento a caducidade ou a relicitação não se apresentam como soluções", conclui.