A Medida Provisória 936 publicada em 01/04/2020 institui o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda e medidas trabalhistas complementares para enfrentamento do estado de calamidade pública e da emergência de saúde decorrente do COVID-19.
Cria as seguintes medidas emergenciais para manutenção do emprego e renda: 1) pagamento de benefício emergencial; 2) redução proporcional de jornada de trabalho e de salários, cujo acordo terá duração máxima de 90 dias e; 3) suspensão temporária do contrato de trabalho, através de acordo com vigência de, no máximo, 60 dias. Em ambos os casos será devido um benefício emergencial, que será custeado pela União.
A MP 936 teve vigência inicial de 60 dias a contar do dia 02/04/2020 e através do Ato da Mesa do Congresso Nacional n.44, de 28/05/2020, teve a sua vigência prorrogada pelo período de 60 dias.
No último dia 28 de maio a Câmara dos Deputados, em sessão por teleconferência, aprovou a MP 936 e agora segue para votação no Senado Federal. A MP 936 teve 1033 emendas apresentadas e 8 substitutivos e foram aprovadas várias alterações ao texto original, inclusive algumas alterações na CLT, conforme passaremos a expor.
Alterações nas medidas emergenciais e transitórias trabalhistas
O Ministério da Economia fará uma divulgação semanal, por meio eletrônico, com informações detalhadas sobre os acordos firmados, com o número de empregados e empregadores beneficiados, bem como divulgará o quantitativo de demissões e admissões mensais realizados no País (art.4º, par.único).
Durante o estado de calamidade pública o empregador poderá adotar as medidas do programa emergencial de forma parcial, ou seja, tanto a suspensão do contrato de trabalho quanto a redução da jornada e de salário podem ser adotadas para toda a empresa, alguns setores, parcial ou na totalidade dos postos de trabalho, respeitados os prazos de 90 dias e de 60 dias, respectivamente (art.7º e 8º).
Respeitado o limite temporal do estado de calamidade pública (até 31/12/2020), o Poder Executivo poderá prorrogar o prazo máximo de redução proporcional de jornada de trabalho e de salário, na forma do regulamento (artigo 7º, par.3º e artigo 8º).
4) A ajuda compensatória mensal poderá ser considerada despesa operacional dedutível na determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL das pessoas jurídicas tributadas pelo lucro real; ser deduzida dos rendimentos do trabalho não assalariado da pessoa física, conforme disposto no caput do art. 6º da Lei nº 8.134/90; ser deduzida dos rendimentos tributáveis recebidos pelo empregador doméstico, sujeitos ao ajuste anual na declaração de rendimentos de que trata o art. 7º da Lei nº 9.250/95; ou deduzida do resultado da atividade rural, como despesa paga no ano-base, apurado na forma do art. 4º da Lei nº 8.023/90 (art.9º, par.1º, inciso VI).
Durante o período de redução proporcional de jornada de trabalho e de salário, a contribuição de que tratam o art. 20 da Lei nº 8.212/91, e o art. 28 da EC nº 103, de 12/2019, poderá ser complementada na forma do art. 20 desta Lei (art.7º, par.2º).
Disciplina a participação das empregadas gestantes no Programa Emergencial com interrupção das medidas emergenciais quando ocorrer o início do salário-maternidade e a contagem da garantia de emprego em decorrência das medidas emergenciais adotadas, por período equivalente a vigência dos acordos, devendo ser contada a partir do término do período estabilitário próprio da gestante (art.10, inciso III) e estabelece regras para o empregador em relação ao contrato da empregada gestante, inclusive doméstica em relação ao pagamento do salário-maternidade (art.22).
Ampliação da exigência de negociação coletiva para implementação das medidas emergenciais de suspensão do contrato e de redução de salário e de jornada de trabalho. Pela redação original da MP 936 a redução de 25% dos salários pode ser adotada por acordo individual para todos os empregados, para a redução de 50% e de 75% pode ser feito acordo individual para os empregados com salário até R$ 3.135,00 ou mais de R$ 12.202,12 e curso superior, ou seja, os empregados que ganham mais de R$ 3.135,00 e menos de R$ 12.202,12 só poderão ter seus contratos modificados por negociação coletiva. Pelo texto aprovado na Câmara houve alteração do patamar salarial do primeiro grupo (R$ 3.135,00) para que seja admitido o acordo individual para os empregados com salário igual ou inferior a R$ 2.090,00, quando o empregador tiver auferido em 2019, receita bruta superior a R$ 4,8 milhões, ou R$ 3.145,00, quando o empregador tiver auferido receita bruta igual ou inferior ao valor mencionado (art.12, inciso I).
Se após a pactuação de acordo individual houver celebração de convenção ou acordo coletivo com cláusulas conflitantes com as do acordo individual, deverão ser observadas as seguintes regras: 1) a aplicação das condições estabelecidas no acordo individual em relação ao período anterior ao da negociação coletiva; 2) a partir da vigência da convenção coletiva ou do acordo coletivo de trabalho, a prevalência das condições estipuladas na negociação coletiva, naquilo em que conflitarem com as condições estipuladas no acordo individual (art.12, par.5º e 6º).
Cria ultratividade assegurando que as cláusulas normativas das CCT e ACT vencidos ou vincendos, salvo as que dispuserem sobre reajuste salarial e sua repercussão nas demais cláusulas de natureza econômica, permanecerão integrando os contratos individuais de trabalho, no limite temporal do estado de calamidade pública, e somente poderão ser modificadas ou suprimidas mediante negociação coletiva (art.17, inciso IV).
Fica proibida a dispensa do empregado pessoa com deficiência durante o estado de calamidade pública (art.17, inciso V).
11) Cria novas regras para o Benefício Emergencial, dispondo que o Ministério da Economia fica autorizado a prorrogar o período de concessão do benefício na forma de regulamento, respeitado o limite temporal do estado de calamidade pública (artigo 18, par.4º).
O Benefício Emergencial mensal de que trata este artigo não pode ser acumulado com o pagamento de outro auxílio emergencial, devendo ser garantido o direito ao melhor benefício (art.18, par.5º).
Durante o período de recebimento do Benefício Emergencial mensal de que trata este artigo, o empregado com contrato de trabalho intermitente fica autorizado a contribuir facultativamente para o Regime Geral de Previdência Social (art.18, par.6º).
Enquadramento previdenciário dos empregados com redução de jornada e salário ou suspensão do contrato de trabalho, através da aplicação das alíquotas de 7,5% para até 1 salário mínimo; 9% para valores acima de 1 salário mínimo até R$ 2.089,60; 12% para valores de R$ 2.089,60 até R$ 3.134,40; 14% para valores de R$ 3.134,41 até o limite de R$ 6.101,06. (art.20, incisos I a IV).
15) Possibilidade de cancelamento do aviso prévio em curso e participação de programa emergencial, através de comum acordo entre empregado e empregador (art.23).
16) Repactuação durante o estado de calamidade pública de empréstimos consignados, financiamentos, cartões de crédito e de arrendamento mercantil com o desconto em folha de pagamento ou na remuneração disponível ao empregado que sofrer redução proporcional de jornada de trabalho e de salário; ao empregado que tiver a suspensão temporária do contrato de trabalho; ao empregado que, por meio de laudo médico acompanhado de exame de testagem, comprovar a contaminação pelo novo coronavírus (art.25).
Concessão do Benefício Emergencial aos empregados dispensados sem justa causa durante o estado de calamidade pública que não preencham os requisitos para acesso ao seguro desemprego no valor de R$ 600,00 por 3 meses, a contar da dispensa (art.28). O Benefício Emergencial não será devido ao empregado na hipótese de extinção de contrato de trabalho intermitente, celebrado nos termos do § 3º do art. 443 da CLT.
Concessão do Benefício Emergencial aos trabalhadores que tenham direito à última parcela do seguro-desemprego em março ou abril de 2020 (art.29).
Não aplicação do artigo 486 da CLT (fato do príncipe) na hipótese de paralisação ou suspensão de atividades econômicas por ato da autoridade pública para o enfrentamento do estado de calamidade pública decorrente da COVID19 (art.30).
Desoneração da folha de salários (contribuição previdenciária sobre a receita bruta) até 31/12/2021, devendo o Poder Executivo Federal estimar o montante da renúncia fiscal (arts.36 e 39).
Para os empregados que se encontram em gozo do benefício de aposentadoria as medidas emergenciais de suspensão do contrato de trabalho e redução de jornada e de salário poderão ser feitas por acordo individual escrito desde que o empregador pague uma ajuda compensatória mensal.
Alterações na CLT
Jornada dos bancários
Alteração no artigo 224 da CLT que trata da jornada dos bancários, afastando a jornada especial de 6 horas diárias para os empregados que recebem gratificação de função não inferior a 40% do salário do cargo efetivo, que remunera a 7ª e a 8ª horas trabalhadas.
Normas coletivas dos bancários
Inclusão do artigo 226-A da CLT para dispor que as Convenções e Acordos Coletivos de Trabalho, inclusive de âmbito nacional, da categoria profissional dos bancários, terão força de lei.
Fornecimento de alimentação
Alteração do art.457 da CLT para dispor que o fornecimento de alimentação, seja in natura, seja por meio de documentos de legitimação, como tíquetes, vales, cupons, cheques e cartões eletrônicos destinados à aquisição de refeições ou de gêneros alimentícios, não possui natureza salarial, não é tributável para efeitos da contribuição previdenciária e dos demais tributos incidentes sobre a folha de salários e não integra a base de cálculo do imposto sobre a renda da pessoa física.
Remuneração
4) Alteração do art.458 da CLT para dispor que além do pagamento em dinheiro, compreendem-se no salário, para todos os efeitos legais, a habitação, o vestuário ou outras prestações in natura, exceto alimentação, que a empresa, por força do contrato ou do costume, fornecer habitualmente ao empregado, vedado, em qualquer hipótese, o pagamento com bebidas alcoólicas ou drogas nocivas.
Salário utilidade
5) Alteração do artigo 486, par.3º, da CLT, para dispor que a habitação fornecida como salário-utilidade deverá atender aos fins a que se destina e não poderá exceder a 25% do salário contratual.
Atualização de créditos judiciais trabalhistas
6) Alteração do art.879, par.7º, da CLT, para dispor que a atualização dos créditos decorrentes de condenação judicial será feita pela variação do IPCA-E, ou por índice que venha a substituí-lo, calculado pelo IBGE, que deverá ser aplicado de forma uniforme por todo o prazo decorrido entre a condenação e o cumprimento da sentença, com acréscimo de juros de mora equivalentes à remuneração adicional dos depósitos de poupança, devidos estes, em qualquer caso, somente a partir da data do ajuizamento da reclamação e aplicados pro rata die, ainda que não explicitados na sentença ou no termo de conciliação. Altera também o artigo 39 da Lei 8.177/91 para estabelecer que os débitos trabalhistas de qualquer natureza, quando não satisfeitos pelo empregador ou empregado, nos termos da lei, ACT ou CCT, sentença normativa ou cláusula contratual serão atualizados monetariamente pela remuneração da poupança e os juros de mora na forma no art.879, par.7º, da CLT.
Execução
7) Alteração do art.883 da CLT para dispor que não pagando o executado, nem garantindo a execução, seguir-se-á a penhora dos bens, tantos quantos bastem ao pagamento da importância da condenação, acrescida de custas, correção monetária e juros de mora, na forma do art.879, par.7º, da CLT.
Atualização de depósitos judiciais trabalhistas
8) Alteração do art.899, para.4º, da CLT, para fixar que o depósito judicial será atualizado da mesma forma que o crédito trabalhista (correção pelo IPCA-E e juros da poupança).
Fiança bancária e seguro garantia
9) Alteração do art.899, par.11, da CLT para prever que o depósito recursal poderá ser substituído, a qualquer tempo, por fiança bancária ou por seguro garantia judicial, a critério do recorrente, dentre outras regulamentações, contidas nos parágrafos 12 a 15 do mesmo artigo.
Participação nos Lucros e Resultados
Altera a Lei 10.101/09 que trata da PLR para estabelecer que as partes podem adotar procedimentos de negociação da Participação nos Lucros e Resultados simultaneamente e estabelecer múltiplos programas e fixar múltiplos PLR, desde que atendida a periodicidade prevista em lei. Na definição dos critérios, regras e metas para fixação e recebimento dos valores da PLR, será sempre respeitada a autonomia da vontade das partes contratantes. Caso haja inobservância da periodicidade prevista em lei apenas os pagamentos feitos em desacordo com a norma serão nulos, assim entendidos os que: a) forem excedentes aos segundo; b) feitos a um mesmo empregado, dentro do mesmo ano civil; e c) os pagamentos feitos a um mesmo empregado, em periodicidade inferior a um trimestre civil do pagamento anterior.
A MP 936/20 está em vigor e produzindo efeitos jurídicos desde a sua publicação e deve ser examinada pelo Congresso Nacional para que seja transformada em lei, dentro do prazo máximo de 60 dias, prorrogáveis uma vez por igual período, sob pena de perder a sua eficácia.
Como o conteúdo da MP 936 foi alterado na Câmara dos Deputados ela passa a tramitar como projeto de lei de conversão e segue agora para votação no Senado Federal.
Caso as alterações mencionadas sejam convertidas em Lei as alterações na CLT serão definitivas e as medidas emergenciais trabalhistas continuarão a ter eficácia temporária, ou seja, enquanto perdurar o estado de calamidade pública.
Narciso Figueirôa Junior
Assessor Jurídico do SETCESP