A Justiça do Trabalho é a Justiça do desempregado, diz o bordão repetido por quem atua nas causas trabalhistas. Até hoje, esse ramo do Judiciário conserva a fama de ter como principal público o ex-empregado, que vai aos tribunais buscar o pagamento de horas trabalhadas ou indenizações devido à rescisão do contrato. Juízes do Trabalho, porém, querem mudar isso. A ideia é fazer com que os insatisfeitos ajuízem ações contra seus empregadores enquanto ainda têm o contrato em vigor.
“Há uma visão individualista e patrimonialista. Em vez de se prevenir, afastar o risco ou neutralizar o perigo, prefere-se que o dano aconteça para que haja indenização”, diz o juiz Guilherme Guimarães Feliciano, presidente da Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 15ª Região.
Feliciano é autor de uma tese aprovada nesta sexta-feira (4/5) no XVI Congresso Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho, organizado pela Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho, que pretende incentivar a tutela inibitória e de remoção do ilícito no processo laboral. O que o juiz quer, por exemplo, é que sindicatos coletivizem demandas na perspectiva preventiva, para evitar acidentes de trabalho. Estimulando essa atitude por sindicatos e associações, segundo ele, será possível promover melhorias nos ambientes de trabalho sem que seja necessário ao trabalhador se expor.
A iniciativa é parte de uma estratégia dos juízes de, frente à enxurrada de ações por danos morais nos tribunais, se adiantar e propor teses para que as ações possam ser ajuizadas enquanto ocorre o problema, e não depois que o trabalhador assediado já pediu as contas por não aguentar mais o ambiente em que trabalha. Ajuizar ações contra o próprio empregador pode não parecer uma maneira inteligente de resolver um problema, uma vez que, estando frente a frente em uma sala de audiência, empregado e empregador podem fazer subir a animosidade, provocando uma demissão.
Os números justificam a preocupação dos magistrados. As cinco maiores demandas no Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo em 2011 foram: férias proporcionais; décimo terceiro salário; aviso prévio; expurgos inflacionários e multa de 40% do FGTS. São todos pedidos costumeiramente feitos após a rescisão do contrato, quando o ex-empregado vai à Justiça cobrar seus direitos.
Outra tese aprovada no evento que deve servir como diretriz para juízes do Trabalho de todo o país é a de que a Justiça deve usar a tutela inibitória para melhorar as condições de trabalho e manter na empresa o funcionário que tenha sido vítima de assédio moral ou assédio sexual. Autora da proposta, a juíza do Trabalho Alda Barros de Araújo, de Maceió, defende que a rescisão do contrato deve ser feita apenas quando não houver possibilidade de manter a relação de trabalho.
Ela explica que, com isso, a Justiça privilegiará a manutenção do contrato e “a garantia ao trabalho decente”. Questionada sobre a possibilidade de um empregado entrar na Justiça por assédio moral e ser ainda mais assediado por isso, a juíza diz que cabe à Justiça fiscalizar se a empresa está cumprindo o que foi determinado e promovendo melhorias no ambiente.
“Se um chefe pratica assédio moral contra um funcionário, é melhor que a empresa demita esse chefe — que pode fazer o mesmo com outros funcionários — do que esperar a demissão do funcionário hostilizado para ressarci-lo financeiramente”, defende.