Investidor vê risco em concessão de ferrovias

Publicado em
04 de Março de 2013
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Grupos nascidos da construção pesada iniciaram conversas com empresas especializadas em administração de ferrovias

Grupos nascidos da construção pesada iniciaram conversas com empresas especializadas em administração de ferrovias à procura de parceiros para as novas concessões do setor. Entretanto, apesar do interesse na formação de consórcios, a iniciativa privada tem dúvidas sobre o modelo do governo e vê riscos nos aportes bilionários exigidos pelo programa de concessões.

Para as empresas, a maior insegurança reside no fato de a estatal Valec ser a responsável por remunerar o investimento. Diferentemente dos contratos antigos, no novo desenho a concessionária não pode transportar cargas na própria ferrovia - para não causar dificuldades para concorrentes.

A Valec comprará do concessionário, ano a ano, a capacidade total de movimentação na ferrovia. Por um lado, o modelo elimina o risco de demanda, já que a Vale garante a compra. Por outro, cria um "risco governo".

O receio dos executivos é que, no futuro, um novo governo possa tomar medidas que modifiquem a remuneração da concessionária da ferrovia - por exemplo, interrompendo o desembolso feito pela Valec antes que os investimentos do concessionário sejam amortizados. Ciente da preocupação, o governo não abriu mão do modelo, mas sinalizou que pode publicar uma medida provisória para aumentar a segurança do investidor - colocando também a União como responsável pelos pagamentos.

Além de considerar o "risco governo" no pacote de ferrovias, os investidores ainda têm críticas sobre a rentabilidade dos empreendimentos. A taxa interna de retorno do projeto, desalavancada, é criticada pelas empresas desde a apresentação do pacote e não está sendo alterada. O governo está priorizando mudanças nas condições de financiamento, o que melhora somente a taxa alavancada. "É pouco provável que haja apetite da iniciativa privada", resume um executivo.

Mudanças nos números do Planalto também têm causado desconforto. Nas apresentações feitas a potenciais investidores, Bernardo Figueiredo, presidente da Empresa de Planejamento e Logística (EPL), informou que a taxa interna de retorno alavancada para os projetos de ferrovia estava sendo estimada entre 13% e 16% ao ano. Esse foi o número usado nas palestras realizadas em São Paulo e Brasília. Mas nas apresentações no exterior, que já passaram por Nova York e Londres, a mesma taxa foi anunciada entre 9,26% e 12,5% ao ano. "Houve uma dissonância e isso causa insegurança. O governo precisa afinar o discurso", afirma um executivo.

Apesar dos receios, a iniciativa privada demonstra interesse no negócio. O que mais agrada é o fato de o futuro concessionário não estar sujeito ao risco de demanda. Esse será um problema exclusivo do governo, responsável pelos pagamentos. Com isso, resta ter a garantia de que o concessionário será remunerado pelo governo durante os 35 anos de contrato.

Estão no aguardo das regras definitivas para avaliar a real participação no pacote as subsidiárias de grupos oriundos da construção, como CCR (controlada por Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa e Soares Penido), Odebrecht TransPort, Triunfo Participações e Investimentos (TPI) e Invepar (de Previ, Funcef, Petros e OAS). Também sinalizam interesse companhias ligadas ao setor de commodities, como a Cosan, e até a recém-criada Estação da Luz Participações (EDLP).

Paulo Godoy, presidente da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), diz que tantos receios são decorrentes do fato de o modelo para ferrovias ser uma novidade no país. "Tudo que é novo gera incerteza. As concessões de estradas, por exemplo, já estão consagradas. Qualquer empresa especializada já sabe tudo sobre as regras de rodovias", afirma.

Nos contatos atuais de concessão de ferrovia, firmados na década de 1990, as concessionárias eram responsáveis pelos investimentos na infraestrutura (trilhos e dormentes, por exemplo) e também podiam movimentar seus trens na malha. Atualmente, América Latina Logística (ALL), MRS Logística e Vale são as principais empresas que atuam em concessões de ferrovia no país.

Mas, na visão do Planalto, os contratos causaram monopólio, dificuldades excessivas ao desenvolvimento da concorrência e subutilização de parte dos trechos.

Por isso, no novo pacote cada empresa interessada deve escolher: ou investe na via como concessionário ou atua como transportador de cargas. Muitos interessados ainda não decidiram qual será a atuação.

Para Godoy, o governo já está tomando medidas para mitigar a percepção de risco da decorrente da "novidade" do negócio. Na semana passada, por exemplo, o Planalto anunciou que vai antecipar 15% da remuneração à concessionária antes mesmo de a obra ser terminada. Mesmo assim, o presidente da Abdib defende que o modelo precisa ter mecanismos que garantam segurança jurídica, estabilidade regulatória e rentabilidade adequada.

Outra dúvida que permanece entre os envolvidos no setor é o plano do governo para quatro trechos, incluído no pacote das novas concessões, que atualmente já estão sob administração da iniciativa privada. São ferrovias de América Latina Logística (ALL), MRS Logística, Transnordestina Logística e Ferrovia Centro Atlântica (FCA).

"Para os trechos que estão concedidos, o governo irá celebrar acordos com as atuais concessionárias objetivando a devolução para que possam ser disponibilizados para novas concessões", diz posicionamento enviado pela Empresa de Planejamento e Logística (EPL), que coordena o assunto. Quase sete meses após o lançamento do pacote, no entanto, o governo ainda não concluiu a negociação e também não divulga detalhes sobre o plano.

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