Reportagem nos Estados Unidos mostra as condições de trabalho precárias de entregadores de empresas contratadas pela Amazon
O entregador Zachariah Vargas conta que tinha dezenas de caixas pra entregar quando, acidentalmente, fechou a porta do caminhão sobre seus dedos. Vendo o sangue escorrer e com a impressão de que havia um osso exposto, ligou para seu supervisor. "Ele disse 'Quantos pacotes você ainda tem?', e orientou a entregar todas antes de procurar ajuda."
Preocupado, Vargas ignorou o chefe e voltou à instalação para cuidar do ferimento. Afirma que foi ridicularizado e intimidado: "'A Amazon está te observando. Eles não gostam quando os pacotes não entregues voltam', disse o supervisor".
A história é relatada em uma reportagem do site Business Insider. Além de Vargas, foram ouvidos outros 30 atuais ou ex-entregadores de 14 empresas terceirizadas que prestam serviços à Amazon. Os relatos mencionam situações precárias de trabalho, com turnos que podem chegar a até 16 horas sem pausa para ir ao banheiro e sem pagamento de hora extra. Intimidações, salários atrasados e prazos de entrega quase impossíveis de cumprir também se mostram comuns.
A contratação de empresas terceirizadas para fazer entregas é comum no varejo. A prática oferece menos custos à empresa e também a ajuda a delegar despesas e algumas responsabilidades. Para a Amazon, uma das maiores varejistas do mundo, essas vantagens parecem fazer mais sentido. Segundo outra reportagem do site, a empresa passou a oferecer incentivos, como na aquisição de vans, para quem quisesse começar o seu próprio negócio de entregas para se conectar à sua rede. “Não é necessário ter experiência em logística”, diz o site de divulgação do programa.
A Amazon não é diretamente responsável por dar ordens ou cuidar da rotina de tais entregadores. Apesar disso, vários deles responsabilizam a empresa por condições precárias. O motivo, segundo eles, está na quantidade de mercadorias e nos prazos exíguos. Segundo a reportagem, cada entregador deve entregar de 250 a 300 pacotes por dia. O número pode chegar a 400, em períodos como vésperas de feriado.
A carga de trabalho, segundo os relatos, leva muitos motoristas a situações extremas. Fazer xixi em garrafas é uma das formas de não parar no trânsito. Muitos deles se sentem obrigados a exceder limites de velocidade e passarem por sinais vermelhos para cumprir prazos apertados.
Quando não conseguem cumprir seus roteiros, os motoristas dizem ser ameaçados com demissão ou outras represálias, como ficar sem receber entregas por um determinado período – o que, na prática, representa não receber pagamento. Segundo os relatos, os autores das ameaças são supervisores das prestadoras terceirizadas, e não da Amazon. Segundo eles, porém, refletem os prazos e as exigências da empresa e o medo que tais supervisores têm de perder contratos.
"A expectativa que a Amazon estabeleceu – de frete grátis e rápido – é quase uma impossibilidade", diz Tia Koonse, gerente de pesquisa legal e política do UCLA Labor Center, em entrevista à reportagem. Segundo ela, a “invisibilidade” do processo por trás dessa promessa faz com que os consumidores ignorem o que acontece com os trabalhadores responsáveis por cumpri-la.
Em resposta à publicação, a Amazon afirmou existirem alguns desafios dentro de sua ampla rede de provedores de entrega e que está trabalhando para melhorar o sistema. A empresa alega trabalhar com seus parceiros, ouvir suas necessidades e implementar novos programas para “garantir que as pequenas empresas de entrega que atendem aos clientes da Amazon tenham as ferramentas necessárias para proporcionar uma excelente experiência de cliente e funcionário”.