Às vésperas do julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) das três ações diretas de inconstitucionalidade contra a lei que criou os pisos mínimos do frete rodoviário, formou-se no Congresso Nacional uma frente parlamentar com quase 300 integrantes para buscar uma conciliação entre caminhoneiros e embarcadores. Ela deverá ser oficialmente instalada em setembro, mas seus articuladores já participam das negociações. Hoje, uma nova reunião será realizada no Ministério da Infraestrutura.
"Queremos criar um ambiente com valores justos que contemplem os dois lados", disse ao Valor o presidente da frente, deputado Nereu Crispim (PSL-RS). O vice-presidente será o líder do mesmo partido no Senado, Major Olímpio (SP). Parlamentares ligados aos embarcadores também integram o grupo.
Crispim disse que está em "conversas avançadas" com o Ministério da Infraestrutura para chegar a um meio-termo entre a tabela obrigatória defendida pelos caminhoneiros e a metodologia da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) aplicada como uma referência, como defendem os embarcadores.
Um ponto de partida, afirmou o deputado, é não falar mais em tabela, e sim em planilha de custos. Um preço fixo pode ser maior ou menor do que o custo, explicou. Já a planilha permitiria calcular o frete considerando as especificidades de carga, veículo, trajeto e pavimento, entre outras variáveis.
Se encontrada, essa posição intermediária poderá ser mantida qualquer que seja a decisão do STF. É o que o ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, vem chamando de "desmame" da tabela de preços.
Uma conciliação, porém, continua bastante difícil. Hoje haverá reuniões no Ministério da Infraestrutura, e empresas e motoristas estabeleceram como limite de negociação posições muito distantes. Nos dois lados, há ceticismo quanto a um acordo.
"Nossa premissa básica é de que qualquer negociação só prospera com uma tabela referencial", afirmou o presidente-executivo da Associação Nacional dos Usuários de Transportes de Carga (Anut), Luiz Henrique Teixeira Baldez. "Fora disso, não tem negociação."
Os embarcadores acreditam que o STF definirá pela inconstitucionalidade da lei dos pisos mínimos. Por isso, insistem que a negociação deve ser feita em torno de preços de referência, ou seja, não obrigatórios.
Os caminhoneiros, porém, não abrem mão da obrigatoriedade. "Não concordo, porque ganhamos a lei e ela é vinculatória", afirmou o líder caminhoneiro Wallace Landim, o Chorão, um dos convidados para a reunião no ministério.
Na semana passada, 32 entidades representativas das empresas entregaram ao governo um documento defendendo que os preços do frete sejam referenciais. E se comprometendo a estimular, entre os associados, a contratação direta de caminhoneiros autônomos. Foi uma contraproposta à solução apresentada antes pelos caminhoneiros, que era uma tabela aperfeiçoada. "Ela reflete os preços de mercado, ou seja, a realidade que já existe hoje", disse Chorão.
O diálogo tem sido difícil. Na semana passada, o Valor mostrou que o clima havia azedado e alguns embarcadores ameaçavam deixar a mesa de negociações. Esse ambiente permanece. "Se não resolver, eu lavo minhas mãos", afirmou o caminhoneiro. Não se trata de convocar uma paralisação, explicou. "Mas não dá para ir toda semana a Brasília e não resolver nada."
A lei dos pisos mínimos, que os caminhoneiros evitam chamar de "tabelamento" justamente para descaracterizar conflito com o princípio constitucional da livre iniciativa, foi uma conquista histórica da categoria, alcançada após a paralisação de 2018. A grande queixa da categoria é que ela não vem sendo aplicada.
A fiscalização da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) é insuficiente. O governo trabalha em duas formas de fiscalização eletrônica: um documento eletrônico de transporte chamado DT-e, ainda em desenvolvimento, que informará entre outras coisas o valor do frete. E o "travamento" da emissão do Código Identificador da Operação de Transporte (Ciot) para cargas contratadas abaixo do valor mínimo. Sem o Ciot, a carga não pode viajar.
Essa segunda alternativa gera polêmica com os embarcadores, que querem manter em aberto a possibilidade de contratar frete menor, ainda que sob o risco de pagar multa. É, porém, a solução defendida pelos caminhoneiros desde o ano passado.