Fluxo local invade o Rodoanel e fura projeto

Publicado em
05 de Abril de 2010
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A entrada de veículos no Trecho Sul do Rodoanel foi planejado para ser restrita às alças das principais rodovias. No entanto, moradores do entorno têm improvisado acessos por estradas de terra para aproveitar as vantagens de ter o mais novo ramal viário de São Paulo passando perto de casa.

O Estado flagrou ontem diversos veículos entrando e saindo do Rodoanel por alças não-asfaltadas - e enlameadas. Dois acessos improvisados foram identificados: um na altura do km 46, no limite dos municípios de Embu-Guaçu e Itapecerica da Serra, e outro cerca de dois quilômetros antes, também em Itapecerica.

Como o Trecho Sul foi planejado para não ter acessos ao trânsito local de veículos, o estado das alças contrasta com a qualidade das novas pistas do Rodoanel. Ali, o risco de um acidente é alto: as ruas de terra ficam em barrancos íngremes, sem proteção lateral ou sinalização e, após a chuva de ontem, estavam enlameadas e escorregadias.

Atolados. No acesso do km 46, um Tempra preto estava atolado a menos de um metro do acostamento do Rodoanel. "Eu só queria passear, pra ver como era essa estrada nova, mas acabamos atolados aqui", disse o proprietário do veículo, o segurança Mauro Balbino, de 31 anos.

Mauro estava com a mulher e três filhos e ficou preso no local por quase uma hora. Moradores dos bairros vizinhos chafurdavam na lama para ajudar a desatolar o carro - o que só foi possível após colocarem, por baixo do pneu, sobras de brita e outras pedras deixadas ali pelas empreiteiras que trabalharam na construção do Trecho Sul.

Segundo moradores que assistiam às tentativas de resgate do carro, é normal utilizar o acesso de terra para entrar no novo trecho do anel viário. "É o terceiro carro que atola só hoje (ontem). Mais cedo, foram duas S-10, uma prata e outra preta. Esse cara aí da preta foi até multado por um marronzinho (policial rodoviário), que chamou um guincho para o carro dele", disse o jardineiro Valdeci Soares.

Do outro lado do Rodoanel, no sentido Imigrantes-Régis Bittencourt, vários veículos utilizavam outro acesso improvisado para entrar na Rodovia SP-214, que leva aos bairros do M"Boi Mirim e Capela do Socorro, na zona sul de São Paulo. Durante os 30 minutos em que a reportagem ficou no local, pelo menos 15 veículos deixaram o asfalto novo do anel viário para entrar na rua lateral - íngreme e enlameada.

Temporário - De acordo com o comandante do Policiamento do Rodoanel, tenente Luís Antônio Caria Tajaíba, os acessos laterais foram feitos para que os carros e máquinas que trabalhavam na construção do trecho chegassem ao local das obras. "As empreiteiras tinham seus canteiros de obras e cada um tinha um acesso lateral para o Rodoanel. Quando elas terminaram o serviço, algumas fecharam os acessos com cerca metálica, mas outras não", explicou.

Segundo ele, os engenheiros responsáveis pela obra prometeram bloquear as entradas em até sete dias. "Até lá, estamos só orientando o pessoal, até mesmo sobre o risco de ficar atolado por causa da chuva", disse.

A Desenvolvimento Rodoviário S.A. (Dersa), responsável pelo Trecho Sul, informou que os acessos ainda são utilizados como via para a realização de serviços complementares - como a instalação de cabeamento de fibra ótica para o monitoramento de TV, por exemplo. Segundo a empresa, todos os acessos serão fechados assim que terminarem os serviços.

Volta a São Paulo - Até as 23h50 de ontem, o movimento nas estradas na volta do feriado de Páscoa ainda era intenso. Na Rodovia Castelo Branco, a lentidão chegava a 24 quilômetros, entre os km 63 e 39.

De acordo com a concessionária Ecovias, administradora do sistema Anchieta-Imigrantes, mais de 4,6 mil carros ainda passavam, por hora, pelas rodovias.

As Rodovias dos Bandeirantes, Padre Manoel da Nóbrega e Tamoios também registravam fluxo intenso, com os alguns pontos de parada. Às 12h40, um engavetamento de três veículos foi registrado no km 52 da Rodovia dos Bandeirantes, em Jundiaí - sem feridos. Já na Rodovia Régis Bittencourt, uma colisão frontal entre dois veículos deixou duas pessoas levemente feridas. O acidente ocorreu na altura do km 362, em Miracatu. Na Rodovia Ayrton Senna, à tarde, cinco pessoas ficaram feridas após o capotamento de dois carros na altura do km 41, sentido interior.

Governo prevê menos tráfego na cidade - Aberto para tráfego na quinta-feira passada, o Trecho Sul do Rodoanel deve receber, em dias úteis, cerca de 16,5 mil caminhões e 55,5 mil veículos de passeio, segundo o governo. A Secretaria Estadual dos Transportes prevê queda de 37% no número de caminhões na Avenida dos Bandeirantes e de 43% na Marginal do Pinheiros, na zona sul da capital.

Má sinalização faz jardineiro ’montar’ posto de informação 

O governador Alberto Goldman (PSDB) certamente não sabia o presente que dava ao jardineiro Valdeci Soares, de 38 anos, quando liberou as novas pistas do Rodoanel para o tráfego, na quinta-feira. Enquanto para muita gente a obra representou menos tempo no trânsito, para Valdeci foi diferente. "Ganhei um passatempo", conta.

Essa foi a sua conclusão, após passar quase todo o Domingo de Páscoa sentado no viaduto sobre a Avenida José Simões Louro Junior, perto do bairro Crispim, onde mora, em Itapecerica da Serra. Fazendo o quê? "Eu fico aí vendo o movimento, aí quem está vindo de carro encosta para pedir informação e eu ajudo."

Para isso, Valdeci chegou lá às 9h e só voltou para casa quando já era noite. Durante esse tempo, indicou ? sem pedir nada em troca ? várias vezes onde ficava o retorno mais próximo, explicou o caminho para motoristas perdidos e ajudou a desatolar três carros que ficaram presos num caminho de terra improvisado.

GPS - Mesmo sendo feriado, o trabalho não é pouco, por causa das falhas de sinalização do novo trecho. Em alguns momentos, carros chegaram até a se enfileirar no acostamento para pedir informação. E, como trabalho quase incessante, Valdeci se tornou uma espécie de GPS do Rodoanel.

"Aqui, licença, como é que eu faço para ir para Curitiba daqui, hein?", perguntou o empresário Paulo Henrique Godiano. A resposta veio certeira: "Você pega um retorno naqueles cones vermelhos ali, no meio da pista, e anda 10 km de volta até a Régis."

"Rapaz, estou querendo ir para Diadema. É para lá mesmo?", indagao o eletricista Vágner Conceição . "Sim, "tá" certo. Segue direto até a Imigrantes e pega o acesso na direita. Aí é só entrar em qualquer uma na direita que você já está lá", explicou.

Valdeci nasceu perto dali, em Parelheiros, e morou a vida toda em Itapecerica. Tem família ? mulher e dois filhos. Mas nada disso o impediu de passar quase todo o Domingo de Páscoa sobre o viaduto da José Simões. "Ah, ficar em casa à toa não dá não. Se não tiver nada para fazer, venho para cá. Ainda mais hoje, o primeiro domingo."

Se ele diz, tudo bem. Os motoristas ? que ainda se perdem bastante no novo e mal sinalizado ramal do Rodoanel ? agradeceram.

Motoristas começam a sentir efeitos da nova estrada 

O Estadao de S.Paulo Sexta-feira Santa, um dia após a inauguração do Trecho Sul do Rodoanel ? que interliga as rodovias Anhanguera, Imigrantes e Régis Bittencourt ?, taxistas avaliam os reflexos da via no trânsito de São Paulo. "Levei 12 minutos, quinta-feira à tarde, do Cebolão (Castelo Branco) até aqui (Aeroporto de Congonhas). Não faria esse trajeto em menos de 40 minutos", diz Roberval de Oliveira, de 52 anos. "Do Cemitério da Vila Alpina ao aeroporto, às 20h, contei só três caminhões", afirma Márcio Ribeiro, de 35 anos.

O fluxo de veículos nas vias de acesso ao aeroporto, especialmente na Avenida dos Bandeirantes, que tem trânsito intenso de caminhões, é bom termômetro para avaliar os efeitos do Rodoanel. Adilson Nascimento, de 56 anos, acredita que o trânsito vai melhorar quando os motoristas estiverem familiarizados com as opções de itinerário. "Muita gente não sabe como pegar o Rodoanel. Alguns não sabem nem onde fica", afirma.

Moradores da zona sul. Flávio Lambstain, de 31 anos, concorda com o taxista. "Leva um tempo até o pessoal perceber que a Bandeirantes pode ser opção de caminho livre", diz o auditor que mora na própria avenida, tem clientes em Alphaville e costuma rodar 50 km por dia.

Para o corretor de imóveis Marcelo Soares, de 38 anos, morador do Planalto Paulista, o trânsito estava melhor na quinta-feira, mas apenas à tarde. "A Marginal (Pinheiros) e a Bandeirantes estavam paradas de manhã", afirma Soares.

Segundo a CET, a lentidão foi maior de manhã. Mas o gráfico comparativo do trânsito em relação à véspera do mesmo feriado no ano passado, às 19h, aponta ganho de até 71% neste ano.

Frequentadores de uma confeitaria na Avenida Ibirapuera, em Moema, e moradores do bairro, não chegaram a um consenso. Para as seis pessoas sentadas à mesa do comerciante Isac Alves do Bonfim, de 61 anos, é como se o Rodoanel não houvesse sido inaugurado. "Ainda não deu pra ver a diferença", diz ele.

Na mesa vizinha, o economista Wendel Caldas, de 30 anos, e sua mulher, Regiane Vendramini, de 35, acham que o trânsito da região está melhor. Caldas conta que, no passado, chegou a levar 20 minutos para percorrer o trecho de 1,5 km que vai da Avenida dos Bandeirantes à Alameda dos Maracatins. "Anteontem fiz em 5 minutos, às 19h.", diz ele.

Na Avenida Luiz Carlos Berrini, o motoqueiro Josué de Souza, de 25 anos, diz que ainda não sentiu melhora no trânsito. "É cedo para avaliar. Acho que segunda-feira (hoje), começa o teste de verdade."

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