Estudo da Maersk aponta que a infraestrutura logística impede o crescimento brasileiro no Comex

Publicado em
12 de Novembro de 2013
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É mais barato enviar um contêiner do Brasil para a China do que transportar carga em um caminhão de Campinas a Santos, em São Paulo.

A falta de infraestrutura rodoviária e portuária e de interligação entre os modais logísticos foram os pontos principais que fizeram com que o Grupo AP Moller-Maersk (Fone: 13 3035.7777) chegasse a essa conclusão.

A empresa realizou um levantamento dos principais desafios brasileiro no desenvolvimento do comércio exterior. A compilação de diversos dados apontou que o processo logístico no país não acompanha o desenvolvimento do comércio.

Segundo o estudo da Maersk, o Brasil é a 7ª maior economia global, mas o movimento nos portos de todo país em 2012 foi de apenas oito milhões de TEUs, o equivalente à carga movimentada apenas no Porto de Los Angeles, nos Estados Unidos.

O tráfego de contêineres nos portos do país teve desenvolvimento nos últimos anos, passando de três milhões de TEUs em 2000 para oito milhões de TEUs em 2011. Mas, a qualidade de infraestrutura portuária não acompanhou o ritmo.

Em 2007, o índice de qualidade dos portos no Brasil era de 2,6. Já em 2011, ele continuava praticamente o mesmo, ficando em 2,7 – considerando que o índice tem nota mínima um, para portos extremamente subdesenvolvidos, e nota máxima sete, para aqueles bem desenvolvidos e eficientes pelas normas internacionais.

“Como estamos dentro desse negócio, é possível ver claramente que o país está ficando para trás.

O volume movimentado triplicou nos últimos 11 anos, mas a qualidade de serviço dos portos em geral continua a mesma. Ou seja, toda a infraestrutura criada, os investimentos feitos até agora só serviram para manter os portos funcionando”, diz o diretor comercial da Maersk Line Brasil, Mario Veraldo.

FALTA DE INFRAESTRUTURA

O Ministério dos Transportes estima que 58% das movimentações de carga feitas no Brasil são realizadas através do modal rodoviário. Com essa dependência, o comércio no país sofre com os altos custos logísticos devido a diversos fatores, como a má qualidade das estradas, acidentes, roubos e danos à carga.

Apenas em 2011, o Brasil gastou US$ 16,6 bilhões na reconstrução, restauração e manutenção de 59.313 km de seus 213.000 km de estradas pavimentadas. A falta de pavimentação também se torna um agravante. Apenas 16% das rodovias brasileiras são pavimentadas, e essa falta de infraestrutura é uma das principais razões de danos às mercadorias durante o transporte.

O levantamento da Maersk também destacou os problemas com roubo de carga e gastos médicos relacionados a acidentes rodoviários. Segundo o estudo, o Brasil é um dos três países, junto com o México e a África do Sul, com maior risco de roubo de cargas de caminhões: dados do último levantamento da NTC & Logística – Associação Nacional do Transporte de Carga e Logística mostraram que em 2011 foram registrados 13 mil casos de roubos de carga no país, com perdas de R$ 920 milhões.

Já os custos médicos são estimados em US$ 3,7 bilhões ao ano, sendo esse o segundo custo de saúde mais alto para o país, ficando a desnutrição em primeiro lugar.

“Em São Paulo você vê a imensa quantidade de caminhões, e esse tipo de transporte tem um frete muito alto, porque os custos são altos. Dentro do Estado as estradas ainda são boas, mas quando você sai, a situação fica muito pior. Temos contêiner que leva 30 dias para chegar ao Porto. E por todos os tipos de problema, como caminhões que furam o pneu três, quatro vezes em uma única viagem. E quando você chega a Santos, que deveria ser um alívio porque é o destino final, a situação é, muitas vezes, uma espera de dois, três dias para entrar no Porto”, lamenta Veraldo.

Um estudo de 2012 do Banco Mundial concluiu que o transporte terrestre é o maior gargalo em Santos. O custo do transporte rodoviário para o Porto chega a ser de 25% a 40% mais caro do que para outros grandes portos no mundo.

Um dos agravantes dessa situação é a demora na liberação das cargas. Em 2012, o tempo de espera – definido como o tempo desde a chegada dos navios nos portos até a atracação para a movimentação de carga – foi de 16 horas. O tempo total de estadia no Porto de Santos também teve aumento nos últimos anos. Definido como o tempo de espera e tempo no cais, ele foi de 26 horas, em 2013, para 35 horas, em 2012.

“Se pegarmos a última crise, com as imensas filas de caminhões que não conseguiam entrar no Porto, a média nesse período foi de 72 horas de espera. Os navios chegavam para atracar e invariavelmente tinham que esperar três dias. Isso acaba com qualquer programa de logística eficiente”, diz Veraldo. “Por esses e outros problemas de infraestrutura, o transporte para Santos chega a ser 40% maior que em outros lugares. Temos um cliente que está com problemas para escoar seus produtos, porque 80% de seus caminhões, que deveriam fazer um fluxo regular até o Porto, acabam ficando parados dentro de Santos durante uma semana e meia. E quando o sistema fica desbalanceado desse jeito, ele gera problemas para todo mundo, não conseguimos atracar, os terminais não conseguem operar e os caminhoneiros não conseguem voltar. Isso reflete na espera no porto”, completa ele.

Outro entrave nos portos brasileiros é a burocracia. O estudo da Maersk apontou que os atrasos na liberação alfandegária em países da América Latina e Caribe aumentam os custos de transporte entre 4% e 12%. O Brasil figura entre os piores em termos de alfândega na região. De acordo com estimativas, a escassez de armazenagem no Brasil é de cerca de 40 milhões de toneladas por ano.

Um contêiner com commodities ou produtos finais demora, em média, 21 dias para ser liberado após a chegada ao Porto de Santos. No Porto de Rotterdam, na Holanda, a média é de apenas dois dias.

“Com esses problemas que enfrentamos hoje, Santos virou um gargalo terrível para quem trabalha com navegação. Porque ele é o responsável por receber os navios que chegam da Europa e da Ásia, e é dele que sai a última carga também. Mas com esses problemas as cargas descem dos navios e ficam muito tempo paradas. Essa média de 21 dias, se pegarmos os últimos dois meses, passou para 25, 28 dias.

A produtividade do Porto está relacionada com os problemas rodoviários que enfrentamos, mas também com a questão burocrática que temos no país. Um contêiner ficar parado 21 dias esperando liberação em porto não é aceitável em nenhum lugar do mundo, e não deveria ser no Brasil também”, critica Veraldo.

SOLUÇÕES

Para impulsionar o comércio, o estudo da Maersk acredita que são necessárias soluções para quatro desafios. O primeiro seria a construção de uma estrutura logística em torno dos portos nacionais.

Segundo o diretor comercial da Maersk Line Brasil, os grandes terminais a serem inaugurados em Santos são necessários e vão melhorar a situação, mas uma estrutura em torno do Porto que funcione de maneira adequada é essencial para o pleno funcionamento dos empreendimentos.

“Os acessos rodoviários são precários, há muita falta de infraestrutura. Se essa infraestrutura em torno do Porto não estiver funcionando, os problemas irão apenas se mover de um lado para o outro. A estrutura de mar, nós temos, o que precisamos agora é que o fluxo de toda essa cadeia logística funcione. Não podemos ter uma fila de 15 km em um lugar que você precisa de uma logística eficiente”, afirma Veraldo.

“Com os dois novos terminais que passarão a operar em Santos, o Brasil Terminal Portuário e o Embraport, acredito que teremos uma considerável oferta de capacidade, que poderá diminuir sensivelmente a situação do tráfego, mas eles não vão resolver a questão do tráfego rodoviário. Esses terminais foram efetivamente concebidos como terminais de contêineres e, por exemplo, no BTP temos uma área exclusiva para estacionamento de cerca de 90 carretas, o que visa a diminuir o trânsito. Mas essa não é uma solução definitiva, é uma alternativa que vai amenizar a situação, mas não vai resolver o problema da forma que precisamos”, também comenta o diretor de relações institucionais da BTP, Paulo Simões.

Investimentos em cabotagem também são vistos como uma oportunidade para reduzir a dependência excessiva em caminhões. Segundo a Maersk, se 2,7 milhões de contêineres fossem transportados via cabotagem, ao invés de utilizarem caminhões, haveria uma redução de: 4,4 milhões de toneladas na emissão de CO2, aproximadamente 36 mil acidentes rodoviários e US$ 125 milhões com custos de manutenção de estradas.

Ainda segundo o estudo, os custos logísticos no Brasil são cerca de 15% a 18% do PIB, e uma das razões para esse alto valor está no uso excessivo do transporte rodoviário em comparação a outros modais, como trens e navios.

“O modal rodoviário vai sempre existir no Brasil, nos próximos 50 anos pelo menos, temos certeza, mas precisamos da cabotagem como uma alternativa viável para desafogar essa infraestrutura”, explica Veraldo.

“Sabemos que todos os estudos mostram que o caminhão representa 60% de toda a cadeia logística nacional. Fizemos algumas análises pensando em como poderíamos melhorar esses gargalos nas estradas. E na nossa visão, o potencial de carga que está em caminhões e que poderia ser migrada ao longo dos anos para cabotagem é de 2,7 milhões de TEUs. Entendemos que as mercadorias que estão próximas da costa, algo em torno de 300 quilômetros, têm um potencial muito grande para que passem a viajar menos em caminhão e mais através desse recurso natural que está ai, e que é pouco utilizado”, também comenta o diretor presidente da Mercosul Line, Roberto Rodrigues.

Aumentar a eficácia das operações aduaneiras, reduzir a burocracia dos portos e desenvolver a mão de obra que trabalha nesse setor também são ações vistas como pontos-chave para impulsionar o crescimento do comércio.

Segundo o estudo da Maersk, há uma grave escassez de mão de obra qualificada nos setor marítimo, de portos e de offshore, o que retarda a internacionalização do Brasil e limita a competitividade da indústria.

Para ajudar esse desenvolvimento, a Maersk Training está investindo R$ 10 milhões em um novo centro de treinamento, inaugurado em julho último. Voltado para treinar e capacitar profissionais que possam operar os equipamentos e ferramentas que a companhia está trazendo para o Brasil, ele tem como meta formar 4.000 brasileiros por ano até 2016. O objetivo da iniciativa é ajudar que a produtividade brasileira chegue a um nível internacional.

“A Maersk estabeleceu uma unidade no Rio de Janeiro para qualificar a mão de obra tanto de apoio à parte de offshore quanto para operação em terminais portuários. Os profissionais do BTP, que operam os guindastes, foram todos treinados por essa unidade. Esse é um ponto crucial, porque a qualificação vai permitir a melhor eficácia possível”, afirma Rodrigues.

“Estamos investindo na questão da educação também, para melhorar a eficácia de produtividade no Brasil. Mas a questão é que isso só vai acontecer se o ambiente for propicio, não é uma questão só de fazer o investimento, e, sim, de ter um ambiente que consiga absorver esses investimentos e gerar retornos esperados. Temos uma série de investimentos sendo feitos, mas chegamos a um ponto que esses investimentos se tornaram pequenos diante da situação crítica que enfrentamos em termos de estrutura logística no país”, também comenta Veraldo.

Até o fim do ano, a Maersk planeja realizar um seminário com stakeholders e especialistas do setor para discutir os grandes desafios dos gargalos logísticos brasileiros. O conteúdo gerado será utilizado para a criação de um relatório com recomendações para elevar a competitividade do Brasil no comércio global.

A MAERSK NO BRASIL

Completando, em 2013, 100 anos de presença no Brasil, a AP Moller-Maersk está desde 2008 trabalhando dentro de um programa de investimentos de US$ 6 bilhões no mercado nacional.

A Maersk Line investiu US$ 2,2 bilhões em 16 novos navios SAMMAX, que foram desenvolvidos sob medida para as condições locais. Eles têm capacidade para transportar até 8.600 contêineres (TEUs) e navegam em águas rasas. O SAMMAX, segundo a empresa, é 10% mais eficiente no consumo de combustível e obtém uma melhoria de 37% na produtividade de atracação.

No Porto de Santos, os navios desse modelo melhoraram o tempo de carga e descarga geral em cerca de 7%. As embarcações também têm potencial de aumentar o comércio em 35.000 TEUs por ano.

“O SAMMAX é uma das soluções que a Maersk trouxe para o Brasil para ajudar nesses problemas que identificamos. O primeiro investimento feito com esses US$ 6 bilhões foi na aquisição desses 16 novos navios. E o que eles têm de interessante é que foram desenhados considerando restrições físicas que os portos brasileiros têm.

Ou seja, eles foram os maiores navios desenhados para conseguir entrar em portos brasileiros sem restrições, que são de calado e largura de canal de acesso, e todas elas foram consideradas”, explica Veraldo.

Outro investimento do Grupo é no BTP – terminal para contêineres e granéis líquidos no Porto de Santos, que começou suas atividades em agosto último. O investimento de cerca de US$ 1 bilhão foi feito pela APM Terminals junto com o seu parceiro de joint venture, a Terminal Investment Limited.

O BTP aumentará a capacidade do Porto de Santos em 40%, o que representa um aumento de comércio avaliado em US$ 15,3 bilhões por ano. Ele também tem potencial para reduzir os alto custos do transporte marítimo em até 8% e aumentar o comércio entre 170.000 e 230.000 TEUs, correspondentes a um valor comercial de US$ 6 bilhões a US$ 8 bilhões. A expectativa é que a BTP tenha uma produtividade de 80 contêineres por hora e receba navios com capacidade de até 10.000 TEUs, assim que estiver operando por completo.

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