Especialistas enxergam fundo do poço seletivo na indústria

Publicado em
03 de Fevereiro de 2016
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A queda de 0,7% da produção industrial entre novembro e dezembro de 2015, feitos os ajustes sazonais, veio pior do que esperavam os economistas e mostrou um quadro bastante ruim para os investimentos, mas pode ter representado o "fundo do poço" para alguns setores. Segundo especialistas, isso não significa que a tendência negativa da indústria será revertida nos próximos meses, mas sim que as retrações ficarão mais modestas, dado que os empresários parecem ter adequado o nível de atividade nas fábricas de modo a não elevar ainda mais o volume de estoques. A grande exceção neste cenário fica por conta do setor de bens de capital, que despencou 25,5% no ano passado, mostrando um quadro de desolação para os investimentos.

Segundo a Pesquisa Industrial Mensal ­ Produção Física (PIM­PF), divulgada ontem pelo IBGE, a indústria recuou 8,3% de janeiro a dezembro de 2015, pior resultado na série histórica do levantamento, iniciado em 2003. O setor opera em patamar semelhante ao de janeiro de 2009 e está 19,5% abaixo do pico histórico alcançado em junho de 2013.

A forte contração ao longo do ano reflete um cenário macroeconômico deteriorado, avaliou o gerente da coordenação de indústria do IBGE, André Luiz Macedo. Baixa confiança de
empresários e consumidores, mercado de trabalho desaquecido, renda em queda, crédito mais caro e restrito e inflação em alta foram fatores negativos para a indústria, apontou Macedo.

Na comparação mensal, a principal influência negativa sobre a atividade industrial em dezembro veio dos fabricantes de bens de capital, que reduziram sua produção em 8,2% sobre novembro. As demais três categorias de uso subiram no período, com destaque para a de bens duráveis (ver quadro), que havia acumulado perda de 18,1% nos últimos quatro meses.
Também na passagem mensal, 13 dos 24 ramos pesquisados pelo IBGE recuaram. As maiores quedas ocorreram nos segmentos de máquinas e equipamentos, bebidas e metalurgia. Do outro lado, entre os 11 setores que aumentaram sua atividade, estão os de veículos automotores, equipamentos de informática e papel e celulose.

Os números de dezembro indicam um "desastre" para os investimentos, dado o desempenho do segmento de bens de capital, avalia Júlio Gomes de Almeida, professor da Unicamp e consultor do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), mas podem significar que o "fundo do poço" finalmente chegou para os demais grandes setores. Reforçam essa análise os índices de confiança empresarial de dezembro e janeiro da Fundação Getulio Vargas (FGV), afirma Almeida, que subiram puxados pela melhora de expectativas de curto prazo.

"O grande problema é que se a queda do investimento não for definida por um fator episódico, e eu acredito que não, tudo o que se revelou um pouco melhor em dezembro vai por água abaixo", pondera ele. Isso porque, quando cai a Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF, medida das contas nacionais do 

As informações do que se investe em máquinas, construção civil e pesquisa), primeiramente a indústria de bens de capital é afetada, mas, em um segundo momento, a geração de renda é reduzida, o que tem impacto sobre todos os demais segmentos industriais.

De qualquer forma, o economista do Iedi afirma que os dados do IBGE trouxeram notícias positivas, relacionadas principalmente ao processo de ajuste dos estoques indesejados. "Parece que chegou um ponto em que os empresários não estão mais acumulando estoques indesejados. Isso significa uma grande melhora? Ainda não, mas significa que agora o empresário está deixando de perder tanto."

De acordo com a Sondagem da Indústria de Transformação da Fundação Getulio Vargas (FGV) referente a janeiro, o indicador de nível de estoques do setor caiu 4,3 pontos sobre dezembro, para 117,3 pontos. Cinco das seis categorias de uso pesquisadas reportaram volume menor de mercadorias paradas, com exceção de bens duráveis, em que a proporção de empresas com estoques excessivos superou em 51,7 pontos a fatia com estoques insuficientes.

Por conta do volume ainda expressivo de inventários acumulados no setor e da retração das vendas de veículos em janeiro, calculada pela Fenabrave (entidade que reúne concessionárias), o economista Rodolfo Margato, do Santander, diz que a alta na produção de bens duráveis em dezembro terá vida curta. Por outro lado, ramos como papel e celulose, alimentos e calçados já podem ter recebido impulso positivo do setor externo naquele mês, tendência que deve continuar neste ano.

A produção de alimentos cresceu 2,6% ante novembro, enquanto a atividade no segmento de papel e celulose aumentou 5,4%. A produção de couro, artigos de viagem e calçados teve alta menor no mês, de 0,6%. "Esses setores vão mostrar alguma recuperação, ainda que de forma bastante lenta, neste ano", disse.

Como, porém, a herança estatística deixada por 2015 para o ano seguinte é negativa em cerca de 6% e o quadro segue desafiador para os setores de bens de capital e bens duráveis, Margato descarta qualquer chance de reação da indústria em 2016, quando a atividade industrial deve recuar 5,5% em seus cálculos.

A queda de 25,5% da produção de bens de capital em 2015 indica que a indústria está cortando investimentos e que a recuperação do setor não virá em 2016, concorda Natalia Cotarelli, do banco ABC Brasil. Ela espera redução de 3,5% da produção industrial neste ano.

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