"Emocionar funciona melhor que informar"

Publicado em
03 de Outubro de 2011
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Todo o tempo, os seres humanos estão tentando convencer as pessoas a seu redor de alguma coisa – que os filhos gastem menos ou estudem mais, que o companheiro aja de outra forma, que seu colega de empresa trabalhe de outro jeito. Mas, se esse esforço se baseia só em argumentos racionais e informação, é bem provável que fracasse. O aviso é do psicólogo americano Chip Heath, professor da Escola de Negócios da Universidade Stanford, nos Estados Unidos. Há 20 anos ele estuda a vida das ideias, como algumas são aceitas pelo grupo e resultam em mudanças, enquanto outras morrem rapidamente. Sua conclusão: mudanças, no trabalho ou em outros aspectos da vida, só acontecem quando motivadas por emoções. Se o objetivo é convencer e envolver os outros, deixe os números em segundo plano e invista num discurso capaz de fazer uma criança dizer “uau!”. Heath participa nesta semana do Fórum HSM Inovação e Crescimento, em São Paulo.

ÉPOCA – Como funcionam as mudanças nos grupos de pessoas?
Chip Heath – Há um lado analítico do cérebro que sabe que precisamos mudar. Mas há outro lado, o emocional, que confronta essa necessidade. Por isso, campanhas de saúde pública que apelam para a racionalidade costumam fracassar. Campanhas contra o fumo ou a obesidade quase sempre são assim. Elas mostram como é ruim fumar ou comer mal, mas esquecem que esses são hábitos difíceis de largar. As pessoas sabem que precisam se alimentar direito, mas elas precisam sentir a necessidade de mudar. Uma das campanhas antitabagismo mais bem-sucedidas nos Estados Unidos botou de lado o apelo racional. Ela mostrou a imagem de uma mulher envelhecida, doente, com muita dificuldade para respirar, entre a vida e a morte. Ela, que tem 35 anos, diz: “Comecei a fumar para parecer mais velha. Infelizmente, funcionou”. Ou seja: há uma série de emoções que levam alguém a começar a fumar. É preciso outra emoção, mais forte – a campanha usa o choque – para convencer o indivíduo a tentar se livrar do vício.


ÉPOCA – Esse processo é o mesmo para qualquer pessoa, em qualquer situação?
Heath – Certamente. Quando eu e Dan (Heath, irmão de Chip e coautor de seus livros) procuramos descobrir como as mudanças acontecem, não fomos pesquisar empresas. Fomos ver de que forma elas aconteciam na esfera individual, em coisas aparentemente banais. Fomos buscar o princípio, o fundamento da mudança. Afinal, somos diferentes, mas nossos cérebros são iguais – no trabalho e na vida.


ÉPOCA – O medo é a melhor emoção para convencer alguém a mudar?
Heath – O medo motiva as pessoas a fazer o que deve ser feito. Se você é um treinador e quer que seu time jogue direito, funciona intimidar a equipe ao dizer quão ruim será perder aquele jogo. Mas isso tem limite. Pesquisas mostram que as pessoas só conseguem se manter criativas e inovadoras se estiverem felizes e otimistas. Por isso, não acho que instigar o medo seja a melhor opção. Nossa tendência é nos concentrarmos no que vai mal, no que precisa ser resolvido. Meu ponto de vista é que, para mudarmos, é melhor aproveitar os sucessos, o que já deu certo, e pensar em fazer mais disso amanhã, em repetir o que deu certo. Mesmo no meio do pior problema, é fácil encontrar pontos positivos.


ÉPOCA – A abordagem emocional pode ajudar em entrevistas de emprego?
Heath – Acho que sim. Quando montamos nosso currículo, a tendência é resumir em um nível abstrato nossas qualidades. Isso não serve para motivar ninguém. Nem crível, porque todo mundo vai dizer a mesma coisa de si mesmo: que sabe chefiar equipes, que sabe tudo de programação, e por aí vai. Mas, se você contar uma história, mostrar ao entrevistador uma situação em que você usou suas qualidades para resolver um problema desafiador de um cliente, ele vai se lembrar de você depois. Mostre como você conseguiu resolver no prazo e dentro do orçamento que tinha. Ele vai se impressionar.


ÉPOCA – Por que é difícil usar essa abordagem emocional em problemas fora da vida afetiva?
Heath – A razão é, em parte, a cultura do mundo dos negócios. No trabalho, estamos acostumados a pensar em resolver problemas, muitas vezes sozinhos. E a análise, o lado racional, é ótima para isso. Mas, quando você tem de convencer alguém de que sua solução é a correta, só mostrar sua análise não vai funcionar. Sabemos criar soluções sozinhos, mas não sabemos envolver os outros nesse processo.


Campanhas de saúde pública, contra o fumo ou a obesidade, que apelam para a racionalidade costumam fracassar
 


ÉPOCA – E como se pode aprender a usar a abordagem emocional?
Heath – Nós nascemos assim – depois perdemos essa característica. A própria escola e a faculdade que frequentamos ajudam nessa perda. Nas aulas, somos acostumados a ver tudo por meio de números e análises. Mas podemos reencontrar essa característica de conversar com emoção, que é inata. Uma boa apresentação de uma ideia é capaz de fazer uma criança de 7 ou 8 anos dizer: “Uau!”


ÉPOCA – Mas emoções são difíceis de controlar e nem sempre são duradouras. Como garantir que o convencimento de alguém com base em emoções vai durar?
Heath – Há paixões que duram o suficiente para impulsionar uma longa jornada, como no caso do cientista obstinado em encontrar uma resposta para um fenômeno. Mas, normalmente, a emoção apenas dá o ponto de partida em uma jornada. É o gatilho. O importante é que ela nos coloque no caminho certo. Com a rotina estabelecida depois da mudança, vamos seguir por esse caminho mesmo quando estivermos cansados. A fórmula é usar a emoção para despertar paixão por uma ideologia, mudar, estabelecer uma rotina e seguir pelo novo caminho.


ÉPOCA – No livro, o senhor cita o “senso de identidade” como bom motor para a mudança. Como isso funciona?
Heath – Uma atitude tomada pelo senso de identidade exige que você pense: “Quem sou eu? Se sou esse tipo de pessoa, como agir nessa determinada situação?”. É o que fazemos na criação dos filhos. Quando nos sacrificamos por eles ou abrimos mão de certas coisas, estamos pensando: “O que um bom pai ou uma boa mãe faria nessa situação por sua família?”. Tradicionalmente, tenta-se convencer as pessoas no trabalho sem usar o senso de identidade, apenas mostrando as consequências objetivas de seus atos: “Se você fizer isso, vai receber tanto; se for bem-sucedido nessa tarefa, vai ganhar aquela promoção”. Mas boas empresas conseguem instigar o senso de identidade em seus funcionários. Costumo citar o exemplo de uma fábrica de latas em que os funcionários começaram a se ver como inventores. Quando pensavam: “Quem sou eu?”, a resposta era: “Um inventor”. E um inventor pensa todo dia como pode melhorar as coisas. Hoje, eles recebem, em média, 245 ideias por ano por funcionário, desde sugestões sobre como melhorar a eficiência até a forma de descartar o lixo.


ÉPOCA – Qual ideia o senhor apontaria como exemplo, pelo poder de motivar as pessoas?
Heath – Cresci em Houston, no Texas. Era o momento da corrida espacial. Naquela época, meu pai trabalhava para a IBM, mas ele não via a si mesmo como alguém que trabalhava para uma empresa. Como ele começou a trabalhar com cálculos para os foguetes das primeiras missões lunares, se via como alguém que ia ajudar a levar o homem à Lua. Ele realmente via a si mesmo como alguém que participava dessa grande empreitada. Essa mesma ideia motivou milhares de pessoas em muitas empresas. Só acho uma pena que tenhamos de voltar 40 anos no tempo para encontrar uma ideia tão inspiradora.


ÉPOCA – Muitas organizações querem mudar e tentam imitar outras, como a Apple ou o Google. Isso funciona?
Heath – Em geral, acho meio tolo fazer isso. Muitas empresas querem ser a Apple, mas elas e seus funcionários precisam saber que o melhor caminho é tentar ser uma versão melhor deles mesmos.

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