Promessa do Palácio do Planalto para pôr fim à greve dos caminhoneiros, a definição de preços mínimos para o frete rodoviário gerou ontem uma guerra de versões no governo e uma avalanche de críticas por parte do setor produtivo. Nesse cenário, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) adiou a publicação de uma tabela com valores atualizados, que estava prevista para hoje e ficou para amanhã.
Por volta de meio-dia, o ministro da Agricultura, Blairo Maggi, garantiu que os preços já vigentes seriam ajustados para baixo. "Os valores publicados pela ANTT praticamente dobraram os preços dos fretes e saíram do contexto dos custos do setor. Mas a agência vai buscar uma readequação", afirmou, durante anúncio do Plano Safra 2018/2019. Naquele momento, técnicos e diretores da agência reguladora já estavam debruçados nos detalhes da nova tabela. O objetivo é balancear nos novos cálculos os diferentes interesses dos transportadores e dos donos de carga.
No meio da tarde, entretanto, o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, declarou que a tabela não seria alterada, o que desencadeou uma grande confusão. "É o governo batendo cabeça", disse um participante da reunião da ANTT. A agência, então, decidiu adiar a decisão para hoje, em reunião de diretoria. A expectativa, agora, é de que a nova tabela seja divulgada na edição de amanhã do "Diário Oficial" da União.
Horas depois, o ministro dos Transportes, Valter Casimiro, confirmou que uma nova tabela está mesmo no forno. Segundo ele, há grandes chances de que os novos valores sejam menores do que os divulgados inicialmente, já que entrarão na conta modelos de caminhões que não haviam sido contemplados.
"O preço vai ser modificado. Quando você coloca todo custo fixo baseado em poucos eixos, você vai diluir este custo numa quantidade de eixos muito menor, vai onerar mais o frete. Quando você dilui este custo em um número maior de mais eixos, diminui o preço por eixo", explicou o ministro, que passou a tarde reunido com caminhoneiros.
Representante da categoria na reunião, o presidente da Associação Brasileira dos Caminhoneiros (Abcam), José da Fonseca Lopes, afirmou que o governo irá cumprir todas as suas promessas e que as mudanças na tabela do frete serão restritas a "ajustes". Independentemente dos valores que serão anunciados, a única certeza é de muita polêmica.
Ontem, as duas principais entidades representativas da indústria fizeram críticas pesadas ao tabelamento do frete e indicaram que vão recorrer à Justiça contra a medida, que segundo elas resultará em um aumento "insustentável" nos custos do transporte. A Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) anunciou que ingressará com um mandado de segurança contra o tabelamento.
O novo presidente da entidade, José Ricardo Roriz Coelho, defendeu que os preços do frete sejam definidos naturalmente pelo mercado. De acordo com o dirigente, a tabela de preços mínimos proposta pelo governo eleva de 30% a 150% o preço final dos produtos, variação que acabará saindo do bolso do consumidor final. Na mesma linha, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) divulgou nota alertando para os riscos de o tabelamento do frete resultar em crescimento da inflação e do desemprego.
A entidade também analisa a adoção de medidas judiciais e administrativas para barrar os preços mínimos. A CNI divulgou cálculos que demonstraram um forte efeito do tabelamento sobre os custos de alguns setores da indústria. No segmento de aves e suínos, por exemplo, a alta no transporte passa de 63%, enquanto que na cadeia da celulose o reajuste fica em cerca de 30%.
O frete do arroz, segundo a confederação, aumentará até 50% para o mercado interno e 100% para exportação. "O aumento do frete nesses e nos demais setores, certamente, deixará as mercadorias mais caras, penalizando ainda mais a população", informou a entidade, que classificou o tabelamento do frete como uma medida insustentável para a indústria. O descontentamento também é grande entre os grandes produtores rurais.
Tanto empresários quanto parlamentares da bancada ruralista demonstraram grande preocupação com o impacto da tabela nos custos logísticos da produção de carne e de grãos. Deputados ruralistas já prometem protocolar emendas à Medida Provisória 832/2018, que foi editada pelo governo para encerrar a greve dos caminhoneiros, mas que já era alvo de forte resistência entre os produtores. A ideia dos parlamentares é propor uma tabela própria, com preços que contemplem os interesses dos produtores, frigoríficos e agroindústrias com as grandes multinacionais que atuam na importação e exportação dos produtos. "Se a ANTT não der uma resposta rápida, o Congresso terá que agir", disse uma fonte do primeiro escalão do governo.