Cresce o uso de navios especiais para transportar cargas gigantes

Publicado em
15 de Outubro de 2010
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Com obras de infraestrutura e industriais de grande porte , o Brasil entrou na rota mundial do transporte marítimo das cargas superdimensionadas, aquelas que não cabem em contêineres. Por exemplo, equipamentos para exploração de óleo e gás, pás eólicas, e até parques fabris inteiros. Nos últimos dois anos, os maiores armadores do mundo donos de embarcações especializadas nesse tipo de movimentação ampliaram suas escalas nos portos brasileiros, inauguraram escritórios próprios por aqui e viram o tráfego com o Brasil abocanhar significativo espaço nos seus negócios. Esse movimento vislumbra principalmente as obras previstas na exploração do petróleo da camada do pré-sal, as do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), criado pelo governo federal, as da Copa do Mundo de 2014 e as da Olimpíada de 2016.

"Os bons ventos devem se intensificar neste exercício, com as obras de energia e infraestrutura demandando cada vez mais grandes volumes. Nossas expectativas vão ao encontro das previsões de crescimento do Brasil em vários setores, como óleo e gás; construção; indústria naval; expansões de termoelétricas e de hidrelétricas", afirma o presidente no Brasil do armador alemão BBC Chartering, Washington de Barros Jr.

A empresa é líder de mercado e tem uma frota mundial aproximada de 140 navios com capacidade nominal para içar até 500 toneladas. Até o fim de 2012 serão incorporadas mais 62 embarcações, algumas delas com potencial para levantar até 900 toneladas - o suficiente para içar linhas de produção inteiras de uma indústria, por exemplo. No Brasil, a BBC encabeça o topo da lista em número de escalas. De acordo com a consultoria marítima Datamar, entre janeiro e setembro foram 202, ante 172 no mesmo intervalo de 2009 e 130 no exercício anterior. "Acreditamos em um crescimento de ao menos 25% em comparação ao ano de 2009", estima Barros Jr.

Como o transporte das chamadas cargas de projeto depende de obras de infraestrutura de médio e longo prazos de maturação, o setor passou quase incólume pela crise internacional, iniciada em setembro de 2008. É o contrário do que se verificou na movimentação de contêineres, em que os armadores viram os navios se esvaziarem em decorrência da queda do consumo mundial.

A dinamarquesa Thorco Shipping foi criada há sete anos e desembarcou no Brasil com escritório próprio em dezembro passado. Até então, operava por meio de agentes. A empresa, cuja frota mundial é de 40 embarcações, posiciona quatro navios por mês escalando portos do Brasil, sendo um da linha regular entre o Extremo Oriente e a Costa Leste da América do Sul.

"Estão chegando muitas cargas de importação destinadas a grandes projetos em andamento no país. Com o escritório aqui podemos otimizar as exportações na volta do navio e criar identidade com o cliente brasileiro", afirma o executivo de novos negócios, Wallace de Barros. Mesmo se tratando de uma operação nova, o escritório do Brasil já responde por 20% do faturamento mundial da companhia - o resto se divide entre as bases na Dinamarca e em Cingapura.

Antes de contar com a unidade no Rio de Janeiro, o número de atracações por ano da Thorco no Brasil chegava a 20. Em menos de 12 meses de atuação da base própria, já foram feitas 50 paradas em portos nacionais, com uma geração de frete que soma US$ 8 milhões.

Na madrugada de ontem, o navio Thor Glory atracou no porto de Santos, depois de ter deixado a Coreia do Sul no dia 28 de agosto. Trazia uma prensa de aproximadamente 1 mil metros cúbicos para a General Motors. Uma vez que a carga estiver em terra, terá início uma outra jornada especial: o transporte rodoviário até a fábrica da montadora em São Caetano do Sul, na região do ABC paulista.

De acordo com o diretor executivo do Centro Nacional de Navegação (Centronave), Elias Gedeon, apesar de a maioria dos associados ser armadores de contêineres com linhas regulares, a perspectiva é que o número de companhias marítimas do setor de projetos continue crescendo. "Existe um movimento grande que deve aumentar ainda mais em razão de questões como a liberação das importações, a desvalorização do dólar e, principalmente, as obras de infraestrutura", afirma.

Outro grupo gigante que recentemente montou base no Brasil é a Beluga Shipping. Em julho de 2009 instalou escritório em São Paulo, o principal da América do Sul, onde depois inaugurou unidades na Colômbia e Chile.

Segundo o gerente-geral do armador no Brasil, Gilberto Lima, o país sempre foi um mercado interessante, mas nos últimos dois anos se firmou como um dos mais estratégicos em razão de obras no setor de mineração, óleo e gás e, particularmente, na indústria eólica.

Antes de ter escritório no Brasil, o número de escalas da Beluga não ultrapassava 30 ao ano. De janeiro a junho (últimos registros de números fechados), já foram 30 atracações, o que aponta para um crescimento de pelo menos 100% em 2010.

Em termos de geração de frete, a perspectiva é que o volume fique entre US$ 15 milhões e US$ 20 milhões neste ano, estima o executivo. Confirmado o resultado mais conservador, será quase o dobro do frete verificado em 2009 e quatro vezes o de 2008, quando o número chegou a cerca de US$ 4 milhões. "Hoje, o Brasil é o nosso terceiro principal mercado, atrás da Ásia e da Europa", informa Lima.

O armador tem aproximadamente 70 navios cujas capacidades combinadas de seus guindastes podem içar até 1.400 toneladas. Recentemente, uma embarcação do tipo, o Beluga Houston, atracou no porto de Aratu (BA), onde descarregou uma peça de 574 toneladas para uma empresa localizada no polo petroquímico de Camaçari.

Operador logístico cria estrutura para atender segmento 

Empresas apostam em departamentos específicos para operação nas chamadas cargas de projeto

Além dos armadores, outro elo importante da cadeia do transporte marítimo está atento para o crescimento da movimentação das chamadas cargas de projeto: os operadores logísticos, responsáveis por cuidar do transporte e providências fiscais depois que a carga é desembarcada (no caso da importação) ou quando segue para o navio (na exportação).

Empresas que tradicionalmente davam prioridade aos serviços regulares de contêineres estão agora apostando em departamentos específicos para esse tipo de operação.

É o caso da Damco - braço logístico do grupo multinacional A.P. Moller-Maersk -, cuja divisão dedicada a projetos foi criada em abril e já representa quase 12% do faturamento da empresa.

"Antes do departamento tínhamos uma carga de projeto a cada três meses. Hoje, temos a todo momento, numa média de duas por mês", diz o diretor comercial da Damco no Brasil, Marcelo Vitorino.

No fim de setembro, teve início o embarque na Itália de nove iates com previsão de chegar ao Brasil no dia 22. Serão descarregados no complexo portuário de Itajaí (SC). É o primeiro agenciamento que a Damco faz desse tipo de carga para recreio. "É interessante porque de certa forma indica que o brasileiro está conseguindo comprar esse tipo de bem."

Outro operador logístico que está apostando no setor é a divisão brasileira da MAC Logistic, que criou a MAC Project também neste ano. Até então, o setor representava cerca de 10% dos negócios da empresa especializada no serviço porta a porta. Depois da criação do braço exclusivo, o percentual saltará para 40% - sendo 60% desse universo relativo à área de óleo e gás, estima o diretor Rodrigo Carreiro.

O principal desafio para quem atua nesse segmento continua sendo a infraestrutura dos portos. Há falta de espaço físico nos portos brasileiros para esse tipo de atividade, poucas janelas de atração para navios de porte tão grande e não existem embarcações de bandeira nacional capazes de realizar a cabotagem (navegação entre portos do mesmo pais).

Muitas vezes, nesse caso, os clientes recorrem aos navios estrangeiros, que recebem autorização especial da Antaq, para fazer a cabotagem. É o caso da alemã Beluga, que recentemente levou parte de um lote de nove pás eólicas (cada pá mede 39 metros) do porto de Santos para o Nordeste por falta de navios de cabotagem nacionais.

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