Como obter uma base cartográfica precisa e de qualidade, em um tempo viável, Por Eduardo Freitas*

Publicado em
17 de Junho de 2010
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Os mapas online e imagens de satélites, que há alguns anos estavam circunscritos a grupos de especialistas em geotecnologias, passaram a fazer parte do dia-a-dia do usuário leigo a partir do lançamento do Google Earth, em 2005. Hoje, tanto uma criança como um tomador de decisão de uma grande empresa podem acessar um aplicativo online e produzir um mapa básico, com dados atuais e ferramentas de simples utilização.

Porém, quando usamos um mapa online ou utilizamos um navegador veicular, poucas vezes nos perguntamos: Qual a precisão desta base? Há quanto tempo este mapa não é atualizado? Posso utilizar este dado ou é preciso pagar direitos autorais?

Muitas vezes, só nos damos conta de que uma base cartográfica é de "má qualidade" quando nos deparamos com um erro grosseiro, como uma rodovia que não existe no mapa ou um sentido da rua que foi modificado. Porém, existem vários outros aspectos ligados com a qualidade de dados, que vão muito além de uma mão dupla que virou mão simples.

Primeiramente, é preciso estar ciente de que existe uma diferença entre a qualidade do dado e a qualidade da informação. Dados geoespaciais são as medidas feitas em campo ou por sensores remotos - satélites, aviões, etc -, enquanto as informações são os resultados obtidos a partir dos dados originais. Um exemplo de dado é uma imagem de satélite, enquanto um modelo de geoinformação é um mapa temático com o tipo de vegetação presente na imagem.

Com isso, já é fácil prever que, se o dado não é de boa qualidade, é impossível obter uma informação confiável, por mais que as técnicas de manipulação, análise e apresentação sejam as mais avançadas.

Já existem vários padrões de qualidade de dados voltados para a área de geotecnologias. Dentre eles destacam-se o USA-SDTS, ISO e FGDC. Tais padronizações auxiliam os profissionais envolvidos na coleta de dados a registrar os dados de forma correta e, além disso, quem usa os dados pode verificar se eles estão de acordo com a aplicação a que se destinam.

Dentre os aspectos matemáticos da qualidade de dados estão os métodos estatísticos de análise e as incertezas na modelagem de dados. As imprecisões de conjuntos de dados raster (imagens) e vetoriais (pontos, linhas e polígonos) também devem ser verificadas de forma diferente. Além disso, existem contextos legais, sociais e econômicos que envolvem dados geoespaciais, como por exemplo direitos autorais, legislação que rege a produção e disponibilização de dados, contexto social, valor e preço/gratuidade de dados. Também influenciam na qualidade da dados as ontologias (nomes das "coisas"), a realidade física do local, as propriedades dos objetos, as formas das entidades, a imprecisão nos dados socioeconômicos, entre vários outros fatores.

Precisão versus rapidez

Precisão e agilidade podem ser complementares, mas geralmente estão em lados opostos quando o assunto são bases de dados geoespaciais. Bases cartográficas para plicações que necessitam de altíssima precisão, como cadastro de redes elétricas, geralmente levam muito tempo para serem obtidas. Por outro lado, mapas que precisam ser disponibilizados para aplicações urgentes, como a resposta a desastres naturais, muitas vezes podem ter a precisão deixada de lado em favor de uma entrega rápida das informações.

Um exemplo de aplicação de alta precisão é a construção de túneis de metrô, que necessitam de uma base cartográfica muito confiável para que duas frentes de trabalho se encontrem no meio do caminho com o menor erro possível (geralmente na casa do centímetro ou milímetro). Já um caso de aplicação que não necessitava de muita precisão foi o mapeamento da cidade de Porto Príncipe, no Haiti, que foi completamente mapeada por cidadãos e usuários de todo o mundo após o terremoto, a partir de imagens de satélites, sendo que a precisão era menos importante do que o acesso imediato à localização e aos nomes das ruas.

Interoperabilidade

A Norma ISO define a interoperabilidade como a "habilidade de dois ou mais sistemas (computadores, meios de comunicação, redes, software e outros componentes de tecnologia da informação) de interagir e de intercambiar dados de acordo com um método definido, de forma a obter os resultados esperados".

No setor de geotecnologias, a interoperabilidade deve estar presente para que os vários sistemas que interagem com os dados possam acessá-los e disponibilizá-los de forma correta. Para isso, existem diferentes tecnologias e ferramentas para a validação, padronização e integração de dados, visando a interoperabilidade entre as diversas plataformas disponíveis hoje no mercado.

Modelagem, integração e disponibilização

Depois de coletados, validados e padronizados, é hora de modelar e integrar os dados de diferentes fontes para criar a base cartográfica. Dados de GPS, imagens de satélites, fotos aéreas, tabelas socioeconômicas e geodemográficas, etc., devem ser corretamente modelados e integrados para gerar um produto de qualidade.

Depois de pronta e organizada, é hora de disponibilizar a base para o usuário. Isso pode ser feito de diferentes formas, desde a venda de arquivos digitais até a assinatura de serviços de mapas online. Os dados podem ser gratuitos ou ter um preço e, além disso, os direitos autorais dos mapas devem ser observados.

Uma tendência que vem sendo usada, principalmente em aplicações baseadas na internet, são os mapas colaborativos, nos quais tanto a produção, validação e atualização da base é feita pelo próprio usuário. Um bom exemplo é o Wikimapa, um projeto de mapeamento colaborativo nas comunidades carentes do Rio de Janeiro, que está colocando no mapa ruas e estabelecimentos que não apareciam em nenhuma cartografia anterior.

Existem vários aspectos relativos à qualidade de bases de dados geoespaciais, como conceitos de precisão e acurácia, padrões, metadados, integração, modelagem, compartilhamento e atualização, além de contextos legais, sociais e econômicos. Estes temas serão amplamente debatidos no dia 8 de julho, em São Paulo, no seminário "Qualidade de Dados Geoespaciais": www.mundogeo.com/seminarios/qualidade.

* Eduardo Freitas é engenheiro cartógrafo, técnico em edificações e mestrando em ciência da informação geográfica. Editor do Portal MundoGEO e autor do blog GeoDrops www.mundogeo.com/blogs/geodrops.

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