A onda é forte, e atinge principalmente os agregados: as transportadoras querem que eles abram empresas individuais. Assim, elas economizam impostos e acreditam que driblam o risco de, um dia, o motorista cobrar direitos de empregado. Lideranças dos autônomos preferem que eles mantenham essa condição, mas é difícil segurar a "onda". Esta reportagem dá um panorama da situação e procura responder o que é mais vantajoso em relação aos impostos - continuar autônomo ou se transformar em pessoa jurídica?
Em relação a impostos, você sabe, existem dois tipos de "pessoas": a pessoa física, que é quem tem CPF - um empregado ou um autônomo prestador de serviços, por exemplo - e a pessoa jurídica, que tem CNPJ e é sinônimo de empresa, mesmo que seja uma empresa bem pequena, sem empregados, tocada pelo dono. Num caso e no outro, as obrigações em relação ao pagamento de impostos são diferentes.
No Brasil, caminhoneiro que tem seu próprio caminhão e anda por aí prestando serviços a terceiros sempre foi sinônimo de autônomo. No resto do mundo, em geral, também é assim. Mas, entre nós, essa realidade tem sofrido mudanças, em parte por causa de uma situação econômica em que todos, na cadeia do transporte, andam com as margens de lucro cada vez mais apertadas, em parte por causa do arrocho dos impostos, do qual todos querem se livrar.
O fato é este: muitos autônomos andam abrindo firmas - ou seja, virando pessoa jurídica - pela conveniência de atender, assim, ao desejo das transportadoras para as quais trabalham. De imediato, pode-se dizer que existe algo a ganhar com isso: como pessoa jurídica, o autônomo pode oferecer seus serviços diretamente ao embarcador - ele, afinal, é uma transportadora, com nota fiscal e tudo. Mas existem outras reflexões a fazer. Em relação aos impostos, por exemplo, se o faturamento for baixo, sai mais caro do que para o autônomo.
As transportadoras preferem contratar quem tem firma. De cara, não precisam recolher a contribuição patronal ao INSS, como recolhem para o autônomo. Num frete de R$ 4 mil, isso representa uma economia de R$ 160. Além disso, evitam o risco de serem alvos de ações trabalhistas movidas por ex-agregados.
A Rota 90 apresenta outras razões. Com sede em Ibiporã (PR), a empresa conta com 500 terceirizados, dos quais 85% são pessoas jurídicas. "A negociação de apólices de seguro é mais difícil e mais cara com pessoas físicas", diz o gestor de Frota, Fernando Delfino.
A empresa quer trabalhar apenas com pessoas jurídicas no futuro. "Os 15% que faltam são o pessoal mais antigo, mas estamos orientando a todos sobre o processo de abertura de empresas."
De acordo com Delfino, a Rota 90 investe em carretas e rastreadores para os terceirizados utilizarem em regime de comodato, "mas para isso eles têm de ter um CNPJ e caminhão com no máximo cinco anos de uso".
A Rodonaves, de Ribeirão Preto (SP), que tem 50% da frota de distribuição nas mãos de agregados, também quer todo o mundo com CNPJ. "É importante que o terceiro trabalhe dentro da mesma cultura que a gente. Então, nós treinamos todos. E estamos vendo melhores resultados com os microempresários", conta o gerente de tráfego da empresa, Mário Sérgio Assumpção.
Segundo ele, o microempresário é mais estável que o autônomo e "retorna mais rápido" o investimento feito pela transportadora. "O vínculo com a pessoa jurídica se mostra mais duradouro", afirma.
Assumpção admite que a contratação de pessoas jurídicas é uma forma de a empresa se resguardar da lei trabalhista. "Muito motorista trabalha aqui seis meses, recebe treinamento e depois sai pedindo hora extra, por exemplo."
A terceirização, segundo ele, é uma tendência no setor de transporte e 80% dos terceiros da Rodonaves caminham para a constituição de empresas. "Eles receberão o nosso apoio inclusive na hora da renovação da frota", afirma.