Em debate no Fórum Estadão, para representantes do setor, simplificar a cobrança de impostos e ampliar o combate a irregularidades são caminhos para driblar a sonegação, que chega a R$ 4,8 bilhões por ano
Das refinarias e usinas às bombas, os combustíveis percorrem um caminho oneroso. Metade do preço da gasolina, por exemplo, vai só para o pagamento de impostos – prato cheio para incentivar os mais diversos tipos de fraudes, além da sonegação de cifras bilionárias ano a ano. Para especialistas, a saída, além do reforço nas frentes de fiscalização, é atuar na raiz do problema: desembaraçar a complexa carga tributária que impera no País.
O tema foi discutido no Fórum Estadão Combate a Fraude e Sonegação, que aconteceu na última quinta-feira em São Paulo, em parceria com o Movimento Combustível Legal. Representantes do setor reforçaram a importância de identificar e combater as irregularidades e de melhorar as práticas concorrenciais.
“O setor de combustível é extremamente vulnerável, porque a tributação chega a ser três vezes a margem de toda a cadeia”, afirmou Hélvio Rebeschini, diretor de Planejamento Estratégico da Plural (Associação Nacional das Distribuidoras de Combustíveis). “Qualquer sopro tira você do jogo – e, muitas vezes, deixa o competidor correto fora do jogo”, afirmou, referindo-se a empresas que quebram por causa da concorrência desleal.
Segundo pesquisa da Fundação Getúlio Vargas (FGV) realizada no ano passado, R$ 4,8 bilhões são sonegados anualmente no setor de combustíveis – valor que poderia ser usado, por exemplo, para construir 400 creches ou manter 800 mil alunos na escola anualmente. O impacto é expressivo nos cofres públicos pelo fato de o setor ser fonte número um de arrecadação em todos os Estados brasileiros – o montante gira em torno de R$ 134 bilhões por ano.
“O impacto mais óbvio é na arrecadação, pois esse valor poderia ser investido em projetos de infraestrutura”, observou o delegado federal Victor Hugo Ferreira, que participou da Operação Rosa dos Ventos. Deflagrada em agosto, a operação desarticulou uma organização criminosa em Campinas (SP) que deixou de pagar R$ 5,1 bilhões em impostos com empresas de fachada para comercializar combustíveis, por meio de práticas de lavagem de dinheiro. “Ocorre que organizações como essas, que sonegam na casa de bilhões, além das questões tributárias, geram problemas de ordem econômica, porque as empresas que pagam seus tributos em dia têm grande dificuldade de operar diante dessa concorrência predatória.”
Reforma. Ele também endossa o coro da necessidade de uma reforma tributária no País. Os principais tributos que incidem sobre os combustíveis são os federais (Cide e PIS/Cofins) e o estadual ICMS – que varia de acordo com o tipo de combustível e o Estado.
O setor pleiteia a monofasia tributária, ou seja, a cobrança de um valor unificado em todo o País, concentrado no primeiro elo da cadeia: produção e importação. Isso porque há uma enorme variação de alíquotas de ICMS entre os Estados. No etanol, por exemplo, elas variam entre 12% e 17%; já na gasolina, de 25% a 34%.
“A carga tributária elevada é um convite ao sonegador. Há uma perda dupla: para a sociedade, que depende dos recursos dos impostos para política pública, e do próprio setor, que tem de competir com os sonegadores”, afirmou Luiz Cláudio Carvalho, coordenador da administração tributária da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo (Sefaz-SP).
Os participantes também apontaram, no entanto, o desafio de combater a chamada “percepção de impunidade”. O delegado Ferreira destacou que há entraves para se chegar à punição de sonegadores, como o baixo efetivo de órgãos de fiscalização, o excesso de recursos administrativos e a sobrecarga no judiciário.
Na bomba. Além da sonegação, o setor tem o desafio de vencer as fraudes, sobretudo nas revendas – postos de combustível. Um dos tipos de infrações é a chamada bomba baixa, ou bomba fraudada – quando a quantidade de combustível que vai para o tanque do consumidor é menor do que a que aparece discriminada na bomba.
Segundo cálculos de Rebeschini, da Plural, se uma bomba estiver fraudada em 5% – ou seja, se o consumidor recebe no tanque uma quantia 5% menor da que aparece na bomba, terá um prejuízo ao abastecer 40 litros, em média de R$ 8. Ao longo de um ano, o prejuízo fica expressivo: são mais de R$ 400 perdidos. “A bomba fraudada gera prejuízo diretamente ao consumidor e ao bolso dele”, disse o diretor.