Burocracia no Brasil estimula propina para liberação de documentos

Publicado em
11 de Novembro de 2013
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O JN exibe uma série especial sobre o excesso de burocracia no Brasil. É um problema que e atrasa a vida de empresas e de cidadãos, que, muitas vezes, se veem obrigados a pagar pra fugir do mar de papeis.

O Jornal Nacional exibe essa semana uma série especial de reportagens sobre o excesso de burocracia no Brasil. É um problema que e atrasa a vida de empresas e de cidadãos, que, muitas vezes, se veem obrigados a pagar pra fugir do mar de papeis.

A reta é o caminho mais curto entre dois pontos. E a burocracia não é uma reta. Está mais para ziguezague.

“Mandou para cá. E daqui mandou para lá. E assim vai”, comenta uma mulher

A burocracia passa pelos órgãos públicos municipais. “Eu achei que ia facilitar, quando entrei: ‘Ah, você tira pela internet o alvará. Mas aí tem que vir aqui. Tem que vir aqui e liberar a senha”, explica outra.

Percorre as repartições estaduais. “Rinha que renovar o documento do carro. Demorou dez dias para sair isso daqui. Diz que está liberado o carro para poder fazer o licenciamento do carro”, aponta um homem.

E vai até o serviço público federal.

“Um mês e meio para chegar. E chegou incompleto. É comum eles errarem, mandarem o processo errado”, afirma um jovem.

A burocracia cria uma espécie de economia paralela. Se os serviços são demorados e complicados, tem quem ofereça rapidez e facilidade - se a gente pagar. Aí, o cidadão se torna freguês.

O entorno de algumas repartições vira uma feira, onde se vendem insumos da burocracia.  Ao lado do Detran, em São Paulo, um grupo faz o decalque do motor e do chassi. É um papel riscado com o relevo da numeração. E exigido no registro e na transferência. O preço: R$ 40.

“Nós negociamos também. Fala: "30"? Está bom, senhor. "Só tenho 20". Pego também. A gente trabalha pro pobre, pro rico, pro milionário”, conta um ambulante.

No centro da cidade, um grupo tenta tirar proveito das pessoas que estão endividadas. Eles ficam na porta do SCPC, o Serviço de Proteção ao Crédito. Tanto o SCPC quanto a Serasa são empresas privadas. Nas duas, o cidadão consulta - de graça - se está com o nome sujo.

Mas o pessoal na rua cobra. Na verdade, eles cobram a taxa e tentam empurrar supostas facilidades para quem está endividado. Não são funcionários da Serasa.

“Lá, jovem, é uma assessoria particular. Nós vamos parcelar, baixar os juros, se tiver cheque, nós vamos estar baixando os cheques”, diz uma mulher

E, além da facilidade, a rapidez também vira mercadoria.

Entrevistado: Geralmente, o contador demora 30 dias para abrir uma empresa, de prestação de serviço.
Jornal Nacional: O senhor consegue em cinco?
Entrevistado: Quatro, cinco dias mais ou menos.

E é mercadoria valiosa. “Dá para fazer R$ 5 mil. E me traz em dinheiro. Só em dinheiro. Eu não aceito cheque. Não tem nada ilegal. Não vai te dar problema nenhum. A única coisa que tem é facilidade”, afirma o despachante.

Um contador cobraria R$ 1 mil, segundo o Conselho Regional de Contabilidade. Mas levaria o dobro do tempo: dez dias.

Em um levantamento da Confederação Nacional da Indústria, metade dos entrevistados que já precisaram encerrar uma empresa para despachantes ou assessorias. No caso de inventário, 48% contrataram alguém para cuidar de tudo. E, para licenciar o veículo, 41% das pessoas procuraram um despachante.

Só que o atalho na burocracia, muitas vezes, é pela via da corrupção. Um contador pediu a isenção de um imposto para uma empresa cliente dele. Era um direito, mas o fiscal insinuou.

“Quando é que você vai trazer aquele agrado para nós? Eu coloquei num envelope, chega lá, entrega para ele. Pega o envelope. E até logo, está resolvido o problema. R$ 12 mil. Cobra para o processo andar da maneira mais rápida. Isso não tenha dúvida”, conta.

Nem com advogada foi fácil para Dona Maria. Ela deu entrada na aposentadoria em setembro do ano passado. Mas o INSS pediu que ela conseguisse uma declaração da repartição estadual onde trabalhou na década de 70.

A professora pediu a declaração à SPPREV - o órgão responsável pela previdência estadual. Mas, um mês depois, a declaração ainda não tinha saído e, por isso, o INSS negou a aposentadoria.

“Uma coisa que não dependia de nós, dependia de um outro órgão deferir esse documento”, conta a advogada Marta Gueller.

Em dezembro, a advogada foi recorrer junto à Previdência. Mas, primeiro, teve que agendar uma data. E só dois meses depois pôde apresentar o recurso. A declaração do estado ficou pronta seis meses após o pedido. Em maio, a junta de recursos do INSS disse que Dona Maria tinha, sim, direito à aposentadoria integral.

“Eu imaginei que dali para a frente estaria tudo resolvido”, lembra a professora.

Só que ainda demorou mais de cinco meses para que ela recebesse o primeiro pagamento. Para Dona Maria, esperar um ano e um mês para se aposentar foi demais.

“É uma coisa que não precisava passar por isso após trabalhar por tanto tempo, contribuir por 30 anos”, comenta.

O presidente do INSS, Lindolfo Sales, esclarece que o prazo, em média, é de 40 dias. Para o INSS, é uma forma de evitar fraudes. O caso da Dona Maria Amélia demorou ainda mais porque envolveu a junta de recursos do próprio INSS e também a SPPREV. Sobre a demora de seis meses para entregar a declaração, a SPPREV alega que o caso exigiu um processo cuidadoso pra levantar os dados da década de 1970.

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