Ministro suspendeu ações que versam sobre vínculo entre autônomos e transportadoras
“A terceirização é muito mais do que uma forma de reduzir custos trabalhistas por meio de uma suposta precarização do trabalho. Na verdade, a terceirização pode constituir uma estratégia sofisticada e imprescindível para aumentar a eficiência econômica, promover a competitividade das empresas brasileiras e ampliar postos de trabalho”. A afirmação é do ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), ao decidir suspender todos os processos que versam sobre o vínculo de emprego entre os motoristas autônomos e as transportadores contratantes.
A ação chegou ao STF por meio de uma ação declaratória de constitucionalidade (ADC 48) da Confederação Nacional do Transporte (CNT), que discute a Lei 11.442/2007. A norma dispõe sobre o transporte rodoviário de cargas por conta de terceiros e mediante remuneração.
A Lei nº 11.442/07 regulamentou a contratação de transportadores autônomos de carga por proprietários de carga e por empresas transportadoras de carga, autorizou a terceirização da atividade-fim pelas empresas transportadoras e afastou a configuração de vínculo de emprego nessa hipótese.
Como apontou a CNT, a Justiça do Trabalho vêm afastando a aplicação da regra, “em verdadeira declaração transversa de inconstitucionalidade”, por entender que seu regime jurídico de contratação conflitaria com o previsto na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
“Ostentando o pressuposto de que o Transportador Autônomo de Cargas (TAC), pessoa física, e a Empresa de Transporte Rodoviário de Cargas (ETC) configurariam terceirização ilícita de atividade fim, os juízes do trabalho deixaram de aplicar a lei. Contudo, a Lei nº 11.442/07 exige uma filtragem constitucional e não uma filtragem pela CLT”, alega a Confederação.
Sobre este ponto, Barroso afirmou que no caso do transporte de carga, a possibilidade de terceirização da atividade-fim é “inequívoca” porque está expressamente disciplinada na Lei nº 11.442/2007.
“Não há que se falar na inconstitucionalidade da norma, uma vez que a Constituição também não impõe a proteção de toda e qualquer prestação remunerada de serviços mediante a configuração de relação de emprego. Por fim, é de se notar que nem mesmo pelos critérios da Consolidação das Leis do Trabalho seria possível configurar a contratação do transporte autônomo de carga como relação de emprego, diante da ausência dos requisitos da pessoalidade, da subordinação e/ou da não-eventualidade”, ressaltou.
A CNT ainda afirmou que o regime jurídico da Lei nº 11.442/07 encontra fundamento na livre iniciativa, na liberdade do exercício profissional e não afasta as garantias próprias dos trabalhadores, argumento que foi acatado pelo ministro.
Segundo Barroso, a Constituição Federal “consagra” a livre iniciativa e a livre concorrência como valores fundantes da ordem econômica. De acordo com tais princípios, afirmou, compete aos particulares a decisão sobre o objeto de suas empresas, sobre a forma de estruturá-las e sobre a estratégia para torná-las mais competitivas, desde que não se violem direitos de terceiros.
“Não há na Constituição norma que imponha a adoção de um único modelo de produção e que obrigue os agentes econômicos a concentrar todas as atividades necessárias à consecução de seu negócio ou a executá-las diretamente por seus empregados”, disse.
Barroso ainda citou a reforma trabalhista (Lei nº13.467/2017), que autorizou a terceirização da atividade principal da empresa, na mesma linha do que já havia feito a Lei 11.442/2007. “Desse modo, tudo indica que a norma em exame é não apenas constitucional, mas compatível com o sentido em que o ordenamento infraconstitucional parece avançar”, afirmou.
Por entender que várias decisões da Justiça do Trabalho têm reconhecido a relação empregatícia, pela Lei 11.442/2007, que admite a possibilidade de terceirização da atividade-fim no setor do transporte de carga, Barroso decidiu, em decisão cautelar, suspender os casos que tratem sobre a matéria no país, já que tais decisões demonstram haver insegurança jurídica sobre o tema.
“O perigo na demora é inequívoco. Como demonstrado pela requerente, diversas decisões da Justiça do Trabalho têm reconhecido o vínculo de emprego entre os transportadores autônomos e as empresas que os contratam, a despeito do que dispõe a Lei nº 11.442/2007. Muito embora se trate de norma de 2007, as decisões apresentadas pela requerente demonstram que a insegurança sobre a constitucionalidade da lei persiste no tempo. Nessas condições, há lesão ou risco de lesão de difícil reparação para todos aqueles que figuram como partes na relação contratual em questão. A insegurança jurídica, passados tantos anos do início de vigência da norma, torna ainda mais grave o perigo na demora”, afirmou.
Leia a decisão.