Artigo: Multa NIC: quando deve ser aplicada?*

Publicado em
07 de Agosto de 2015
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A multa por não ter identificação do condutor infrator está prevista no artigo 257, §§7° e 8° do CTB e na Resolução 151 do CONTRAN.

O que poucos sabem é que o legislador, antes da promulgação do CTB, fez uma correção no projeto de lei, alterando os §§7° e 8º do citado artigo, para substituir o vocáculo condutor (na redação primitiva) por infrator (na redação final).

A alteração era de fato necessária. Na justificativa da Emenda 141, o seu autor explicou que “nos parece sensata, pois há situações em que o infrator não é o condutor...” (gn). Dessa forma, a indicação do condutor era insuficiente para estabelecer uma relação segura de responsabilidade pelo cometimento da infração.

A lei deveria ser incisiva de modo que apenas o infrator poderia ser indicado.
Aprovada a Emenda 141, a nova redação do art. 257, §§ 7° e 8°, do CTB, entregou aos órgãos do sistema nacional de trânsito um instrumento legal eficaz para combater a impunidade: a indicação do infrator e não mais do condutor.

Todavia, no município de São Paulo, o citado dispositivo legal vem sendo mal aplicado notadamente nas hipóteses de infração administrativa de responsabilidade exclusiva dos proprietários de veículos comerciais de carga ou passageiros.

São os casos de infração por desatendimento às exigências documentais de natureza administrativa, dirigidas ao proprietário a fim de que seus veículos circulem nas Zona de Máxima Restrição de Circulação – ZMRC e Zona de Máxima Restrição de Fretamento – ZMRF.

Na prática, aqui em São Paulo, a irregularidade documental é apurada com auxílio de instrumentos eletrônicos instalados nas vias, por meio dos quais o DSV confere o cadastro do veiculo e, se for o caso, eletronicamente, expede o auto de infração, que irá gerar a multa ao proprietário.

Até aqui tudo bem, por que o proprietário deve realmente responder pela insuficiência cadastral de sua empresa e seu veículo. Mas o DSV vai além, entendendo que o proprietário deve indicar o motorista, hipótese em que este seria o infrator para todos os efeitos legais. É nesse ponto que ocorre a cisão, o divórcio entre a lei (vide Emenda 141) e o entendimento do DSV.

Sustentamos que o proprietário deve assumir integralmente a responsabilidade pela infração decorrente da insuficiência cadastral. Isto porque, a circulação (ato de direção) não sofrerá qualquer óbice se o cadastro do veículo (gestão administrativa) estiver completo e arquivado eletronicamente no DSV. Em termos técnicos, há um nexo causal apenas entre a insuficiência cadastral e a lavratura do auto de infração, de modo que o ato de direção está fora do campo punitivo.

O presidente da 10ª Câmara de Direito Público do TJSP assim se manifestou em processo que questiona a multa NIC: “... se do ponto de vista da justiça em si, não faz sentido punir o condutor por ter ingressado em local e/ou horário não permitidos, não por vontade própria, mas em razão da falta de licença que seu empregador deveria e poderia ter obtido, o formalismo da lei deve comportar exegese capaz de impedir a iniquidade.”
E prossegue: “Para isto, impõe-se distinguir “condutor” e “infrator”. Não foi o condutor quem cometeu a infração, mas quem deveria providenciar o cadastro e licença e não o fez.”

Entendemos que essa distorção poderia ter sido evitada em seu nascedouro pelo Conselho Estadual de Trânsito – CETRAN. Entretanto, podemos afirmar que não há notícia de que esse órgão normativo e consultivo do Estado de São Paulo tenha aprofundado o estudo sobre esse relevante tema de interesse dos usuários que transportam cargas e passageiros nas ZMRC e ZMRF.

*Moacyr Francisco Ramos é Advogado Especializado em Direito de Trânsito e Transporte
Consultor jurídico de entidades do transporte de cargas e passageiros
Ex-membro titular do Conselho Estadual de Trânsito

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