Conseguir mão de obra para voltar a expandir as operações é um dos desafios que as empresas de transporte rodoviário de carga poderão encontrar na hora da retomada econômica. Após demissões massivas nos últimos três anos - na tentativa de reequilibrar a oferta de capacidade à demanda -, o setor deverá se esforçar para encontrar profissionais.
"O mercado retraiu. Empresas sucumbiram à crise e outras ficaram com caminhões parados e tiveram que demitir. A crise é longa, e os motoristas não ficaram parados nos últimos dois anos. Com certeza eles estão fazendo outra coisa, e quantos vão voltar?", questiona o assessor técnico da Associação Nacional do Transporte de Cargas e Logística (NTC&Logística), Lauro Valdívia.
Segundo o Anuário CNT do Transporte de 2017, o número de empresas transportadoras de carga regularmente inscritas passou de 156.765 no ano passado para 111.743 atualmente. "Em 2014 eram cerca de 170 mil", diz Valdívia. Para o especialista, se por um lado essa diminuição do mercado tem ajudado ao reequilíbrio da oferta de capacidade e demanda de carga, por outro o contingente de demissões provocou no setor uma grande perda de mão de obra qualificada.
"As empresas estão descapitalizadas e não conseguem renovar a frota, quanto menos aumentar, mas isso pode ser resolvido depois da retomada, porque é fácil encontrar caminhão. Agora mão de obra qualificada não se consegue da noite para o dia", diz. De acordo com Valdívia, mesmo que a retomada a níveis anteriores à crise pareça algo distante, algumas empresas do ramo já se mostram preocupadas com a situação. "Uma transportadora comentou que não sabia se conseguiria aproveitar todo o potencial [de demanda] do segundo semestre, porque apesar de ter caminhões parados, não sabe se conseguirá motorista para o tipo de veículo", exemplifica.
No caso de uma possível retomada, ele destaca que as chances de faltar mão de obra para o setor são grandes e isso ainda pode piorar. "Muitas empresas estão endividadas e nem os autônomos estão sendo uma opção fácil", acrescenta. Valdívia ressalta que a dificuldade financeira dos transportadores - provocada pela queda da movimentação de carga no País, defasagem do frete e aumento dos níveis de recebimentos em atraso -, não se resume a médias e grandes empresas. "Para você contratar alguém, ele tem que ser aprovado pela seguradora, mas se o autônomo tiver dívidas não é aprovado pela seguradora, ou seja, os autônomos estão com dificuldade de conseguir serviço [em meio à crise] e as transportadoras não têm motoristas e não acham autônomos."
De acordo com Valdívia, a perspectiva de que a mão de obra pode ser um gargalo na hora da retomada preocupa, já que as empresas do setor finalmente estão com perspectivas de uma possível melhora do cenário. "As empresas já estão achando que o segundo semestre será melhor que o mesmo período de 2016", destaca.
Segundo estudo recém divulgado pela NTC&Logística, realizada com 2,29 mil empresas, o percentual de transportadoras com veículos parados tem diminuído. Enquanto na enquete mais recente 38,7% apontaram estar com veículos parados, em janeiro deste ano o volume chegava a 52,8%. O número vem em declínio se comparado às pesquisas realizadas em 2016 que apontavam 75,7% na divulgação de janeiro e 65,4% no mês de agosto.
Gargalos
A curva de tendência está apontando para momentos melhores, mas o resultado do primeiro semestre ainda se mostrou difícil. Ainda segundo a pesquisa, 70,5% apontaram ter sentido uma queda do faturamento. Para os respondentes, as receitas diminuíram 10,32% e o valor do frete caiu cerca de 2,98%. Com isso, 91% apontou ter precisado diminuir o seu tamanho.
Somado a todo o desafio da queda da demanda, as transportadoras entrevistadas apontaram que o impacto da crise econômica em todo o setor produtivo provocou um grande nível de inadimplência. De acordo com a NTC&Logística, 54,7% das transportadoras estão com fretes a receber em atraso, o que representa 14,3% do faturamento. "Muitas empresas colocaram o pagamento para 120 dias, porque já é feito em outros países, mas no Brasil os juros são muito altos. Além disso, muitas não querem que os encargos financeiros sejam incluídos", destaca.
Para completar a tempestade perfeita, a pesquisa ainda apontou para uma defasagem do frete de 20,89% no transporte de carga lotação e 7,72% na fracionada. Agora, cabe ver o reflexo do aumento do PIS/Cofins no combustível e o impacto nas empresas de transporte de carga. Na semana passada, diversas manifestações de caminhoneiros espalhadas pelo País ocorreram simultaneamente com o intuito de chamar a atenção para o impacto. O cálculo é que chegue a gerar alta de até 4% no valor do frete, com um impacto maior para o transporte de produtos de baixo valor agregado e rotas mais longas.