Artigo escrito por Paulo Roberto Guedes | Consultor Associado da Sociedade Faria de Oliveira Advogados
São diversos os estudos, projetos e planos desenvolvidos, não só pelo Governo Federal brasileiro, mas também pela iniciativa privada, no sentido de se alcançar, nas atividades logísticas, maior produtividade e eficiência operacional, tanto para as movimentações internas de mercadorias como aquelas voltadas à exportação e à importação.
Exatamente com esses objetivos, ainda no final do ano passado, o Ministério da Infraestrutura (MInfra) e a Empresa de Planejamento Logístico (EPL) lançaram o Plano Nacional de Logística 2035 (PNL2035) e, reconheça-se, com uma significativa vantagem quando comparado com outros planos, por dois fatores que considero fundamentais:
1º) Ao invés de “partir do zero”, o MInfra/EPL optou por analisar os diversos diagnósticos e estudos já existentes, fossem eles relativos às obras em andamento, à viabilidade de cada uma delas, aos contratos de concessões ou às desestatizações previstas. Aproveitando-se daquelas experiências e de mais de dois mil projetos conhecidos, muitos dos quais ainda no papel e outros já com obras iniciadas, foi possível construir uma proposta que, além da visão de futuro e considerando as oportunidades que se apresentavam, buscou atender as principais necessidades nacionais.
2º) Reconhecimento, diante dos baixíssimos níveis de investimentos em infraestrutura logística e de transportes realizados, notadamente nos últimos anos, insuficiência até para a reposição da “infraestrutura gasta” o que, sem dúvida, vem resultando na significativa redução do “estoque” de infraestrutura nacional, com consequências imediatas no aumento de custos e na diminuição da qualidade dos serviços prestados. Desse reconhecimento e considerando as dificuldades financeiras do governo, a exigência de uma crescente participação do investimento privado foi uma conclusão lógica e essencial.
Para elaboração do Plano, considerando as diversas hipóteses de demanda futura, variação regulatória e inovação tecnológica, foram desenvolvidos nove cenários distintos. Isso, evidentemente, criou reais possibilidade para que se escolhessem os projetos que mais causassem “impactos positivos transformadores”, tanto sob o ponto de vista econômico como operacional. E na avaliação de cada um desses cenários foram considerados diversos indicadores, tais como acessibilidade, eficiência, confiabilidade, segurança, racionalidade da matriz, modal de transporte, integração internacional, impactos no desenvolvimento socioeconômico regional e econômico nacional, sustentabilidades econômica e ambiental, atendimento às demandas de defesa e segurança nacionais.
Conforme diagnóstico de há muito conhecido por todos aqueles que militam na logística, quatro pontos foram correta e justamente destacados: 1) necessidade de se desenvolver projetos específicos para modernização das frotas (ferroviário, portuário e rodoviário, principalmente); 2) elaboração de um conjunto de melhorias que diminuam os tempos de transferência das cargas, nos diversos modais; 3) ampliação das capacidades operacionais, notadamente no modal ferroviário e nas operações portuários; 4) investimentos para a prevenção de acidentes, em especial no modal rodoviário.
Considerando o cenário 9 (de maior oferta de infraestrutura logística) e todos os recursos previstos, públicos e privados, direcionados aos investimentos e à manutenção, preveem um total de desembolso, até 2035, igual a R$ 1,172 trilhão (cerca de US$ 235 bilhões), entre recursos públicos e privados.
Evidente, portanto, que em face desses extraordinários valores, cujos retornos financeiros correspondentes somente acontecem a partir do médio-prazo, será imprescindível que o País se mantenha, política, econômica e juridicamente, em situação extremamente estável, de tal forma que as condições regulatórias e contratuais sejam satisfatórias para todos. Com relação a isso a observação feita no bojo do PNL2035 é perfeita: “nessa perspectiva, é essencial que os empreendimentos analisados de forma mais detalhada nos planos setoriais busquem soluções aderentes às necessidades econômicas e sociais do país, mas também que sejam atrativas para o mercado”.
Os estudos desenvolvidos tem algumas projeções importantes – espera-se que revisões sejam feitas periodicamente -, tais como: (a) aumento na extensão da malha ferroviária em 61%; (b) via pavimentações, duplicações e demais intervenções em estudos já previstos nos contratos de concessões atuais, aumento na capacidade do transporte rodoviário equivalente a 61%; (c) aumento no número de aeroportos com voos regulares em 53%; (d) aumento nas operações portuárias entre 42% e 104%. Nos portos do Arco Norte esse aumento deverá ficar entre 73% e 125%; (e) crescimento médio acumulado nos 15 anos do Plano, para os diversos modais: rodoviário, 5%; ferroviário, 193%; cabotagem, 57%; hidroviário, 44%; dutoviário, 58%; e aeroviário, 60%.
Quase que simultaneamente (dia 14/12/2021), também foi aprovado pelo Comitê Interministerial de Planejamento da Infraestrutura, o Plano Integrado de Longo Prazo de Infraestrutura 2021.2050 (PILPI-2021/50), no qual estão previstos os investimentos necessários a esse mister, ao longo dos próximos 30 anos. Evidente que estão contempladas aqui as iniciativas previstas pelo PNL2035, mas é importante ressaltar a importância do PILPI, pois além de oferecer base consistente para avaliações, cria-se um espaço para a realização de discussões e novas atualizações. É a partir desta visão, sistêmica e integrada, que contempla planos de Governo e de Estado, Gerais (infraestrutura como um todo) e Específicos (transportes), que se tem reais possibilidades de se compreender quais são os investimentos necessários para que o País elimine seus principais problemas de infraestrutura.
Interessante também, aliás como explicitado no próprio PILPI-2021/50, observar que seus principais objetivos tem total aderência do que busca o PNL2035, bem como os diversos estudos e pesquisas que, ao longo do tempo, vem defendendo um esforço de expansão e modernizador da infraestrutura brasileira: (a) enfatizar as qualidades ambientais, sociais e de governança desses projetos; (b) desde que mantida a autonomia de cada ministério e suas respectivas prioridades, promover a compatibilidade entre os diversos planos setoriais que compõem a infraestrutura do Governo Federal e, se possível, destes com aqueles desenvolvidos pelos governos estaduais e municipais; (c) aumentar a participação do setor privado nos investimentos previstos (incluem-se, aqui, a consolidação das reformas regulatórias); (d) melhorar a qualidade e a eficiência do gasto público nessas atividades; e (e) aumentar a qualidade e o estoque de infraestrutura no País.
Está claro, portanto, que será fundamental combater alguns dos principais entraves à modernidade, tais como a fragmentação dos núcleos de gerenciamento e decisão, a desconexão das políticas públicas em suas diversas esferas e destas com as demais áreas envolvidas, a politização dos cargos nas agências, ministérios e departamentos técnicos, as indefinições com respeito aos marcos legais e regulatórios, e a falta de políticas claras de investimentos e suas correspondentes garantias. Esperamos que o PNL venha resolver, pelo menos em parte, alguns desses óbices.
Depois de décadas de paralisia, o Brasil já passou pela fase de discussão e conhece as principais causas que mantêm o chamado “custo logístico” como um dos entraves do crescimento e desenvolvimento econômicos. Tratado como prioridade, a efetiva e eficiente execução do PNL2035, bem como os ajustes futuros, não só contribuirá para a melhoria da logística brasileira como estimulará a realização de novos investimentos. Urge, portanto, transformar o PNL2035, assim como outros que se seguirão, em realidade.