* Editorial do O Estado de São Paulo
Investimentos em infraestrutura são cruciais para desenvolver a economia e garantir direitos fundamentais à população
Os investimentos federais em transporte vêm caindo desde 2012 e a previsão é de que em 2020 recuarão ao patamar de 2001. O dado levantado pela Confederação Nacional da Indústria expõe os efeitos deletérios das más políticas públicas no setor de infraestrutura e a urgência de fomentar condições para atrair o capital privado.
Investimentos em infraestrutura são cruciais para desenvolver a economia e garantir direitos fundamentais à população. Cerca de 100 milhões de brasileiros não têm acesso a esgoto, o que os expõe a toda sorte de moléstias que põem em risco o mais fundamental dos direitos: o direito à vida. Ao mesmo tempo, a precária estrutura de transportes mina a competitividade do agronegócio e da indústria, inviabilizando qualquer perspectiva de desenvolvimento nacional. Do norte ao sul do País, dez em dez empresários podem confirmar o ônus da má logística nacional para a produção e comercialização de seus produtos.
Os custos logísticos no Brasil correspondem a 12,3% do PIB, bem mais do que, por exemplo, nos Estados Unidos (7,8%). De acordo com o Fórum Econômico Mundial, num grupo de 137 países, o Brasil ocupa a 65.ª posição quanto à infraestrutura de transportes. O Banco Mundial estima que o Brasil poderia exportar cerca de 30% mais somente com melhorias logísticas. Os custos do transporte na exportação são maiores que as tarifas do protecionismo, e a rentabilidade dos produtos exportados tem caído consistentemente.
Segundo a InterB, consultoria especializada em infraestrutura, na década de 1980 o estoque de investimentos em infraestrutura representava cerca de 60% do PIB. Hoje corresponde a pouco mais que 35%. Em países desenvolvidos, este estoque responde por algo entre 65% a 85% do PIB. Entre 2001 e 2017, o investimento anual médio em saneamento básico ficou em 0,18% do PIB, quando o ideal seria 0,45%, e o investimento em transporte ficou em 0,67%, bem abaixo do ideal de 2%. Hoje os investimentos públicos e privados em infraestrutura totalizam cerca de 1,8% do PIB, muito aquém dos 4,15% estimados para elevar, em duas décadas, o estoque de infraestrutura ao nível dos anos 80 – o mínimo necessário para garantir a competitividade do setor produtivo e a oferta de serviços básicos à população.
Mas este crescimento quantitativo não virá do setor público, que, na melhor das hipóteses, pode qualificar os seus investimentos. Há anos os investimentos públicos são devorados pela Previdência e o custeio do funcionalismo. Quase 60% dos gastos da União se destinam a pensões e aposentadorias, quando o padrão mundial gira entre 20% e 25%. E os gastos não param de crescer, e os investimentos de encolher – tendência acelerada com a recessão. Em 2012, a União chegou a investir R$ 35,6 bilhões em transporte. Em 2020, serão apenas R$ 7,9 bilhões.
Além de cada vez menores, os investimentos do Estado são cronicamente ruins, como testemunha o festival de obras paradas no País. Segundo o TCU, das 38 mil obras federais, cerca de 14 mil (38%), totalizando R$ 144 bilhões em contratos, estão paralisadas, mormente por deficiências na elaboração e avaliação dos projetos. Isso sem falar do volume de recursos drenados pelos propinodutos dos quais se tem uma pálida ideia por operações como a Lava Jato.
Tudo isso escancara a necessidade de avançar a agenda contra a corrupção e pressionar o governo e o Parlamento por reformas que viabilizem as contas públicas. Além disso, eles precisam robustecer e acelerar os planos de concessões e privatizações, com regras equilibradas que garantam a um tempo rentabilidade e segurança aos investidores, e qualidade a custos razoáveis aos usuários. O maior fluxo de capital privado dará algum respiro ao poder público para eleger melhor suas prioridades e investir justamente nas áreas mais vulneráveis – isto é, cujo retorno é menos palpável e vem a longo prazo –, mas essenciais, como saúde e educação.