Ele diz que o setor privado não resolverá todos os problemas, que o governo deve pensar em formas de estimular o investimento público e que a proteção ambiental é fundamental para dar acesso ao “mercado verde”
Há uma política de austeridade em vigor que atinge em cheio o investimento público. Há pressões para que o governo flexibilize o ajuste no lado do investimento?
Há pressão para aumentar o estoque de investimento, não o gasto. Por um lado, há um esforço para a recuperação fiscal, diminuição de gastos, aprovação de reformas. Por outro, temos conseguido manter a inflação abaixo do centro da meta e reduzir os juros. Para aumentar o estoque de investimento, há duas formas: ou quebro o teto ou arrebento o piso. Não mexeremos no teto, e sim no piso. Isso significa desvincular determinadas receitas e mudar algumas despesas obrigatórias, e para isso está sendo feito um estudo. Essa ação gerará espaço fiscal para aumentar o estoque de investimento sem mexer no limite do teto. Se criamos alternativas para aumentar o estoque de investimento sem mexer no teto, ok, isso é algo que comunica bem com o Congresso. O Congresso tem uma constituição muito pró-business, assim como o presidente da Câmara.
É possível empreender reformas, fazer ajustes e preservar o investimento público?
Sem sombra de dúvida. Devemos ter um 2020, em termos de investimento público, melhor do que foi 2019. Alternativas já estão sendo criadas mexendo nas ineficiências. Tenho R$ 30 bilhões parados no Ministério ( da Infraestrutura ) em fundos que estão vinculados a determinados setores que estão empoçados. Se quebrar essa barreira, libertar essa amarra, libero um estoque de recursos muito grande para investimento sem aumentar a despesa. Não se vai cortar e tampouco flexibilizar a questão fiscal, no sentido de haver uma permissividade para aumentar investimento. Só vamos pegar o dinheiro que está parado e usá-lo onde tem de ser usado.
Quão fundamental é o investimento público para a retomada da economia do país?
Temos de atacar por todas as frentes. Não adianta achar que só o esforço de transferência de ativos à iniciativa privada resolverá todos os problemas. Precisamos também de uma quantidade de investimento público. Essas duas pernas, privada e pública, têm de andar juntas. O governo tem veia liberal. Um de seus pilares é a transferência de investimento para a iniciativa privada, mas a iniciativa privada não responderá por tudo. Há a necessidade de manter o investimento público. Discutimos muito isso com a equipe econômica, e alternativas estão sendo criadas para aumentar esse nível de investimento. Eles já estão percebendo onde estão as ineficiências, onde o dinheiro está, que paredes teremos de quebrar para desempoçá-lo, a fim de trazer recursos para que o investimento público também aconteça.
Como convencer investidores preocupados com o meio ambiente de que o Brasil está fazendo sua parte?
Não adianta retórica. Precisamos de gestos. É interessante conhecer onde estão os vários exemplos que temos a dar. Conhecermos a Bacia Petrolífera de Urucu, em Coari, no Amazonas: é um espetáculo de empreendimento. Há exploração de óleo e gás, petróleo, clareiras bem pequeninas, onde há poço de petróleo, transporte dutoviário, e tudo isso circundado por floresta. Tudo muito preservado. Tive o privilégio de trabalhar lá dentro. É um espetáculo, um primor, o que a Petrobras faz. A Estrada de Ferro Carajás serpenteia a Floresta Nacional de Carajás, área extremamente preservada no Pará, com dispositivos de travessia de fauna. Boa parte da ferrovia é elevada, há túneis, então ela harmonizou com o meio ambiente. A Rodovia dos Imigrantes e a Serra do Cafezal, na Régis Bittencourt ( são outros exemplos ). Nós sabemos fazer. Nosso projetos têm sempre a preocupação de substituir carbono, de ser eficiente do ponto de vista energético. Temos a preocupação com dispositivos de travessia de fauna, com plantio compensatório. Assinamos um memorando de entendimento com a Climate Bond Initiative para trazer o selo verde a nossos projetos. Queremos ter acesso ao mercado verde, a green bonds ( títulos usados para financiar projetos sustentáveis ), green loans ( empréstimos dados para investir na redução de emissão de CO2 ), e sabemos que isso será um tema cada vez mais presente nas discussões dos tomadores de decisão.
A Valec poderá ser, por fim, extinta, considerando que as ferrovias serão todas construídas pelo setor privado?
Há oportunidades na prestação de serviços ferroviários com a vinda do regime de autorização para consultoria, como a exploração de determinados ativos. Exemplo: a Valec vai começar a vender os pátios que estão ao longo da Ferrovia Norte-Sul e gerar receita. Ela está assinando um contrato de prestação de serviço com o governo do Paraná, para fazer projetos para o estado. Não ( será extinta ). Dentro desse cenário, contribuirá muito com o aumento da provisão da infraestrutura ferroviária.
Quais são os planos para as relicitações problemáticas, como a terceira rodada de rodovias e o aeroporto de Viracopos?
Estamos trabalhando nas metodologias de indenização de investimentos não amortizados para dar clareza de regras. Já temos sinalizações positivas. A Via 040, por exemplo, já sinalizou que realmente quer devolver. Acho que esse será o caminho que todas as outras tomarão. Estamos acompanhando as negociações em torno de Viracopos. A concessionária pediu mais tempo, para ter uma assembleia de credores, justamente para ver a regra de indenização e tomar o caminho da devolução. Se não for a devolução, será a declaração de caducidade, que é muito pior. Acho que, em breve, veremos esse ativos serem devolvidos sistematicamente. Já vamos iniciar as estruturações dos projetos e também fazer as novas licitações desses ativos, que são bons. Houve uma conjugação de fatores — com diversas responsabilidades do poder público, mas várias também do setor privado, dos bancos financiadores — que concorreram para o fracasso dessa rodada. Agora vamos receber os ativos de volta e fazer as relicitações.
O senhor já disse que o governo espera que o Brasil receba, até 2020, R$ 50 bilhões em investimentos. Como medir esse interesse, na prática?
Nos Estados Unidos, há o interesse financeiro, com vários fundos de investimento. No Canadá, há vários fundos de pensão, que pensam a longo prazo. Infraestrutura é muito própria para quem enxerga a longo prazo. É um bom produto para um fundo de pensão e para o investidor de equity e de dívida. Na Espanha, há importantes operadores de infraestrutura, vários que já conhecem o Brasil e estão posicionados. E obviamente temos interesse de fundos soberanos asiáticos, árabes, empresas chinesas. Em cada lugar do mundo, encontramos um interesse diferente, mas todos convergem para o que fazemos.