Apesar das perspectivas para este e os próximos anos, de que haverá uma leve recuperação da economia europeia e de um crescimento suavemente acelerado dos EUA, os países emergentes crescerão menos, inclusive a própria China, que tem sido na última década, o “carro chefe” do crescimento econômico mundial. O FMI e o Banco Mundial prevêm, para este ano, um crescimento mundial médio de apenas 3,5%. A incógnita chinesa, cada vez maior, configura-se um perigo para todo o mundo, notadamente para o Brasil, que tem naquele país, seu grande parceiro comericial.
No Brasil, agora com o governo Temer, os problemas continuarão existindo. E, sabe-se lá o que ainda poderá ser encontrado quando auditorias e outros levantamentos, mais aprofundados e transparentes, forem realizados junto ao BNDES, aos Fundos de Pensão e a tantas outras instituições que, ao longo dos últimos 13 anos, foram usadas de forma populista e sem os devidos e necessários critérios técnicos, para dizer o mínimo. Portanto, não é difícil crer que, antes de melhorar, ainda iremos piorar um pouco mais, infelizmente!
Desemprego (cerca de 11 milhões de brasileiros estão desempregados atualmente e é possível que se chegue aos 12 milhões ainda este ano), rombo nas contas públicas (pode ser maior do que os R$ 96 bilhões informados pelo governo de Dilma), elevadíssimo nível da dívida pública (R$ 3,9 trilhões até o final deste ano?), convivência com a inflação (felizmente com tendência de queda) e juros (a taxa Selic, hoje em 14,25% aa, poderá chegar a 12,5% aa até o final de 2016) e dolar (agora, no mínimo, menos volátil) ainda altos, serão companheiros do novo governo, e por algum tempo. As exportações seguirão com desempenho difícil; as empresas, de uma forma geral, terão que lidar com suas altíssimas dívidas (estudos da Economática indicam que as dívidas das empresas de capital aberto, em 2015, aumentaram 31% quando comparadas com 2014) e uma demanda ainda insuficiente; e o setor industrial, com alta ociosidade operacional (na média, acima dos 20%), ainda terá que se ocupar da baixa produtividade da mão de obra.
Não há milagres e a tarefa do novo governo é extremamente grande e difícil de ser realizada. Como escrevi em outro texo (‘Uma agenda e tanto para um eventual novo governo’), “a crise brasileira atual é muito maior do que se imagina e teremos um longo e difícil caminho pela frente, independentemente de quem esteja exercendo a Presidência da República. O estrago foi grande demais e não estamos falando de uma simples recessão. Os números são incontestáveis”. Conforme os dados apresentados naquele texto, o PIB brasileiro acumulado ao final de três anos (2014, 2015 e 2016), será 8% menor do que aquele obtido em 2013. No final de 2016, conclui no texto citado “considerando que nossa população continuou crescendo, nossa renda per capita, inevitavelmente, será menor do que aquela de 2013. Estamos mais pobres. Andamos para trás.”
Como se vê, as necessidades são imensas e as mais diversas possíveis. Porém, será obrigatório que se estabeleçam prioridades e se recomponha a moralidade no trato da ‘coisa pública’, através da manutenção da operação Lava Jato e da instalação de auditorias específicas.
No primeiro momento, segundo meu entendimento, o novo governo terá que legitimar suas propostas e atividades iniciais em dois pilares fundamentais: a) resgate da confiança e da credibilidade junto à população e à todos os agentes econômicos e, b) estabilidade nas relações com o Congresso, pois a governabilidade e a melhoria nas articulações políticas serão imprescindíveis neste momento. Além disso, através de dialogo honesto, franco, aberto e transparente, o novo Presidente da República deverá ‘falar’ com a população brasileira para explicar a grave situação atual, pois é necessário que se tenha o apoio da opinião pública, já que os sacrifícios serão muitos e ainda por um bom tempo! Um governo com estrutura mais enxuta – menos ministérios e menos cargos de confiança – é um bom sinal, mas muito pouco considerando a imensidão de problemas administrativos de nosso governo.
Imediatamente, um conjunto de providências, que tenha como objetivo a retomada do crescimento econômico, a geração de empregos e o ajuste fiscal, precisa ser apresentado para a sociedade, principalmente para o setor produtivo que, sem dúvida, poderá ajudar de forma significativa na retomada dos investimentos exigidos e necessários.
Embora se saiba que é impossível dar ‘cabo’ a todas as providências que se fazem necessárias, é preciso que elas sejam colocadas à mesa de discussões e, no mínimo, equacionadas para tratamento ou implantação futura.
Algumas das providências que reputo como prioritárias: (i) austeridade fiscal, contingenciamento, maior libertade na gestão orçamentária e solução para as crises financeiras dos Estados e Municípios, como componentes de uma agenda que busque o ajuste fiscal; (ii) discussão das reformas da previdência, tributária, trabalhista e política, pois a preparação do País, para o futuro, é objetivo indiscutível; (iii) estímulo ao comércio exterior, com base na abertura da economia e através de políticas de fomento; (iv) estabelecimento de regras claras, que gerem credibilidade, segurança jurídica e previsibilidade, são necessárias para que incentivos às privatizações, às PPP’s e às concessões, produzam resultados concretos. Isto, por sua vez, estimulará os investimentos em todos os setores, notadamente aqueles voltados à infraestrutura.
Em 2005, ao escrever um artigo para a Folha de Alphaville (“Brasil: Política Monetária ou Política Econômica?”), conclui: “A falta de investimentos por um período tão grande pelo qual está passando o Brasil, somente agravará sua situação no futuro, pois já terá comprometido toda uma geração de pessoas, visto que não poderão, em face das carências passadas e atuais, exercerem seus papéis como cidadãos, em seu conceito mais amplo: educado, politizado, solidário, com saúde, moradia, trabalho e consciente de seus direitos e deveres. Além do que, a falta de investimentos em infraestrutura contribuirá para o altíssimo custo e pela baixa produtividade da produção e da economia como um todo”.
Infelizmente, de lá para cá, muito pouco se fez e as consequências são percebidas por todos. São concretos os dados da baixa produtividade do produto brasileiro (exceto no setor agrícola), da precariedade da infraestrutura existente e de falta de mão-de-obra qualificada. As taxas de investimento (FBCF), por exemplo, e segundo dados do IBGE, tem diminuído a cada ano (20,7% do PIB em 2012, 18,4% em 2013 e 18,2% em 2015) e o PIB, como uma das consequências, tem experimentado taxas cada vez menores desde 2007 (há 9 anos portanto!). O PIB foi de apenas 0,5% do PIB, em 2014, foi negativa em 3,8% em 2015 e, para este ano, também conta com previsão negativa em 3,6%, no mínimo.
Embora a ‘conta consumo’ tenha contribuido muito, sempre que houve crescimento na economia brasileira, o item investimento desempenhou o papel principal, pelo menos entre 2003 e 2010. Entretanto, como indicam os números do IBGE, já a partir de 2011, o item investimento foi menor que o item consumo. O Brasil poderia (ou deveria) ter poupado e investido muito mais!
Ora, se os investimentos, de uma forma geral, estiveram em queda nos últimos anos, também é de se esperar que os investimentos em infraestrutura estivessem em declínio. É o que nos mostram diversos estudos realizados a respeito. Armando Castelar e Claudio Frischtak, no livro “Gargalos e Soluções na Infraestrutura de Transportes”, editado pela FGV, em 2014, quando analisam os quatro dos principais itens que compõem a infraestrutura de um país (eletricidade, telecomunicações, transporte e saneamento), mostram isso de forma clara e definitiva. O Brasil, nos últimos 20 anos, tem deixado de investir de forma substancial!
É o que também atestam os estudos apresentados pela CNT (Confederação Nacional do Transporte). Com base nas informações geradas pelo Orçamento Fiscal da União e Orçamento de Investimentos das Empresas Estatais, os investimentos federais, especificamente em infraestrutura de transporte, não têm ocorrido como se exige. Mesmo considerando apenas valores nominais, há uma queda substancial nos últimos anos. O Plano CNT de Transporte e Logística, consolidando 2.045 projetos em todos os modais de transporte, calcula em quase R$ 1 trilhão os recursos necessários. Algo em torno dos 20% do PIB brasileiro!
O mercado logístico, por sua vez, vem se expandindo e procura se profissionalizar, uma vez que é significativo o crescimento do processo de terceirização das atividades logísticas, principalmente neste momento no qual as empresas precisam melhorar suas cadeias de suprimentos, seus processos, o atendimento aos clientes e reduzir seus estoques e custos. Objetivos, como pode ser observado, coerentes com todas as demais medidas adotadas pelas empresas neste cenário de baixo crescimento.
No entanto, como pano de fundo deste teatro, a infraestrutura precária do Brasil continuará impactando, para cima, os custos logísticos. E, como comentado, e apesar dos PAC’s da vida, investimentos em logística, no Brasil, têm sido muitíssimo menores do que suas reais necessidades.
Um dos problemas, sem dúvida, e como já comentado por mim em outros artigos, é a falta de uma liderança (que somente pode ser governamental) que coordene, com competência gerencial, todos esses projetos e faça deles uma malha integrada. Por mais que a iniciativa privada se mostre interessada em investir em infraestrutura, é preciso que a autoridade pública lidere o esforço de conjugar todos os planos, de modo que o mercado possa aproveitar as vantagens de uma logística mais eficiente e de cada modal. Do contrário, os investimentos, que já estão com décadas de atraso, continuarão destinados apenas a iniciativas isoladas, em modais sem conexão entre si e sem contribuição efetiva na dimininuição do “Custo Brasil”.
É evidente a necessidade que a sociedade tem de se preparar para as dificuldades que se apresentam, principalmente agora com o início de um novo governo (tampão, diga-se de passagem, posto que isto dificulta ainda mais as coisas), mas é preciso, para o bem da economia brasileira, que os investimentos em infraestrutura, inclusive de transportes, retornem o mais rapidamente possível.
Importa ressaltar que investir em infraestrutura logística e de transporte não implica em abrir mão de outros ‘bens’ conquistados pela República, tais como a meta fiscal, o combate à inflação, a diminuição do desemprego e a melhoria do processo de distribuição de renda. Mas é preciso “inovar” e sair das armadilhas, incorretamente colocadas por alguns, de que a governabilidade só pode ser obtida através do lema “atender a todos e a tudo”. Priorizar é papel de qualquer governo. Nos momentos em que faltam recursos, priorizar é ainda mais importante. E, temos certeza, aumentar os níveis de investimento em infraestrutura logística também faz parte do receituário para que o Brasil saia da grave crise na qual se encontra. Um rigoroso processo de controle, sobre esses investimentos, também faz parte de uma programação econômica consistente.
Num prazo mais longo, o crescimento econômico somente poderá ser mantido e sustentado quando as condições econômicas e sociais estimularem investimentos significativos em todos os setores cujas carências mais se apresentam. E, como já salientado, se é preciso priorizar, além dos itens como ajuste fiscal, educação, saúde e segurança, há que se colocar o investimento em infraestrutura logística como condição igualmente necessária.
Mas, de forma diferente como até agora se fez, é preciso concentrar esses investimentos e aplicá-los de forma coordenada, integrada, concreta e que respeite as regionalidades de um País como o Brasil.
A sociedade como um todo, mas em particular as associações e sindicatos que representam os operadores logísticos e as transportadoras de carga, precisam insistir e trabalhar nesse sentido, principalmente agora com um novo governo, pois a falta de investimentos neste setor, ou com investimentos realizados para a consecução de objetivos duvidosos ou sem visão de futuro, continuarão gerando graves problemas para nossa economia, para nossas empresas e mantendo nosso País no atraso.